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A mudança que não aconteceu na Venezuela

Há um ano a oposição conquistou maioria na Assembleia, prometendo uma revolução. Mas nada mudou

Venezuelanos fazem fila para sacar dinheiro em Caracas.
Venezuelanos fazem fila para sacar dinheiro em Caracas.UESLEI MARCELINO (REUTERS)

O Governo da Venezuela espera realizar uma nova reunião com a oposição nesta terça-feira, exatamente um ano depois de as forças antichavistas conquistarem nas urnas uma ampla maioria da Assembleia Nacional, encerrando 17 anos de domínio governista. Aquela vitória foi vendida como o início de uma profunda mudança política no país, que até agora, no entanto, não aconteceu. Ao invés disso, o bloqueio político se aprofunda a cada dia, apesar da presença de representantes do Vaticano e de três ex-dignitários ibero-americanos que buscam promover a convivência entre as partes. No mais recente capítulo das desavenças, a Mesa da Unidade Democrática (MUD), principal partido da oposição, ameaça boicotar o diálogo com o chavismo, acusando o Governo de “não cumprir os acordos”.

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Na sexta-feira, o líder da bancada parlamentar do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), Héctor Rodríguez, solicitou num escrito ao Tribunal Supremo de Justiça que “corrija a omissão legislativa” e designe dois dos conselheiros [chamados de reitores] do Conselho Nacional Eleitoral, cujos mandatos vencem em dezembro. O bloqueio político parece tão insolúvel que o chavismo dá como certo que a Assembleia Nacional não aceitará um acordo, e que portanto caberá aos magistrados da Sala Eleitoral assumir as tarefas que seriam dos deputados.

O acordo entre as forças, necessário para nomear os reitores, não é possível. Como parte dos consensos alcançados na mesa de diálogo, o chavismo exige que a direção da Assembleia inclua na ordem do dia a cassação de três deputados opositores do Estado do Amazonas (sul) diplomados em julho. Eles foram alvo de uma liminar do Supremo por supostas irregularidades eleitorais. A oposição cumpriu a ordem à sua maneira. A mesa da Assembleia leu uma carta enviada pelos três deputados à direção parlamentar na qual solicitavam seu afastamento. O chavismo não gostou.

Tudo começou em janeiro. A cúpula da Assembleia Nacional, presidida pelo deputado social-democrata Henry Ramos Allup, decidiu desmontar a iconografia chavista no Palácio Federal Legislativo, além de revogar normas impostas pelo regime que limitavam o acesso da imprensa às sessões. Com esse gesto, imortalizado em um vídeo que viralizou, Ramos Allup atraiu a ira do chavismo. Além disso, teve início uma batalha jurídica em que a oposição partiu em clara desvantagem. Todas as iniciativas legislativas da oposição que buscam tirar apoio popular do Governo são imediatamente bloqueadas pelo Executivo e, em última instância, pelo Supremo, que é controlado pelo regime.

A Constituição venezuelana, aprovada em 1999, transformou o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) em árbitro definitivo no caso de divergência entre poderes. Por isso, assim que a derrota foi consumada, a legislatura anterior procurou manter o controle do Poder Judiciário fazendo magistrados cujos mandatos estavam próximos de vencer ou já vencidos renunciarem para substituí-los por aliados incondicionais. Naquelas sessões do final de 2015, à base de procedimentos amplamente questionados, foram nomeados 12 integrantes dos 32 que compõem o tribunal, quase todos chavistas, o que garantia a tomada de decisões favoráveis ao regime no caso de controvérsias.

Várias leis que poderiam ter alterado o cenário político ficaram no limbo: a lei de anistia e reconciliação (que permitiria a soltura dos presos políticos); a lei da reforma do Banco Central da Venezuela; a de outorga de títulos de propriedade aos integrantes da Missión Vivienda (programa social criado em 2010 de construção de casas para desalojados); a reforma da lei do Tribunal Supremo de Justiça; e a lei do orçamento de 2017. A Assembleia Nacional permaneceu apenas como um foro de debate político. Os magistrados baixaram 35 sentenças que castram as suas atribuições constitucionais.

Quando, em 28 de julho passado, a oposição decidiu incorporar ao legislativo três deputados do Estado do Amazonas cuja posse havia sido vetada pelo Supremo em janeiro a partir de um recurso, o TSJ, em 1 de agosto, decidiu declarar formalmente o Parlamento em situação de desacato à Justiça. Essa medida acabou por eliminar todas as funções controladoras do legislativo, paralisando suas iniciativas. Parece, também, ter frustrado todas a expectativas de mudança que haviam surgido um ano atrás.

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