Um ano do desastre de Mariana: o que foi e o que não foi feito para reparar os danos
Para representantes da ONU, esforços da Samarco para conter vazamentos de lama foram insuficientes
Passado um ano do rompimento da barragem da mineradora Samarco em Mariana, a ONU divulgou nesta sexta-feira um comunicado assinado por especialistas afirmando que as medidas tomadas pelas autoridades e as mineradoras envolvidas na tragédia "não correspondem à dimensão do desastre e às consequências socioambientais, econômicas e de saúde".
O documento critica também a falta de providências em relação à situação das comunidades indígenas e ribeirinhas ao longo da Bacia do Rio Doce, atingida na tragédia de Mariana, e diz que o Governo ainda não providenciou provas de que a qualidade da água dos rios da região é suficiente para o consumo humano depois que o tsunami de rejeitos de mineração avançaram sobre o Rio Doce até desaguar no litoral do Espírito Santo.
Para os representantes da ONU, os esforços das empresas Samarco e suas as acionistas Vale e BH Billiton para conter os vazamentos de lama foram insuficientes. Os especialistas lançaram um apelo para que as autoridades brasileiras tomem medidas imediatas para solucionar os impactos ainda persistentes da tragédia, ocorrida no dia 5 de novembro de 2015.
Veja o que foi e o que não foi feito para reparar os danos da tragédia:
Rejeitos continuam espalhados e obras estão atrasadas
Segundo o Ibama, a mineradora cumpriu apenas 5% das recomendações feitas
Os 40 milhões de m³ que vazaram após o colapso da barragem de Fundão ainda não foram removidos e continuam espalhados em um raio de 115 km na região. Com a chegada do período de chuva, o perigo de que essa massa de rejeitos de minério volte a se deslocar, poluindo ainda mais a bacia do Rio Doce, é grande. Segundo a presidente do Ibama, Suely Araújo, as obras para conter a lama estão atrasadas e a turbidez - presença de partículas em suspensão – da água próximo ao local do rompimento da barragem está acima do normal.
Desde a tragédia, o Ibama emitiu 69 notificações à Samarco, sendo algumas sobre determinações de como proceder em algumas situações e outras comunicando algumas irregularidades. Segundo o órgão ambiental, a mineradora cumpriu apenas 5% das recomendações feitas. O descumprimento da Samarco em adotar medidas de controle para acabar com a degradação ambiental fez o Ibama aumentar o número de multas aplicadas à mineradora, que agora possui 13 autos de infração, que já ultrapassam 300 milhões de reais. A última infração aplicada no dia primeiro de novembro prevê uma multa diária de 500 mil reais. A mineradora está recorrendo de todas elas.
Segundo a Samarco, há aspectos técnicos e jurídicos nas decisões que precisam ser reavaliados e, por isso, a empresa aguarda a decisão administrativa das defesas já apresentadas. A empresa defende, ainda, que está exercendo seu direito legítimo e reafirma que tem cumprido com suas obrigações e compromissos assumidos com a sociedade. “A Samarco reforça que já investiu até o momento aproximadamente 1 bilhão de reais para o pagamento de ações de remediação, compensação e de indenização”, disse em nota. A mineradora está construindo um novo dique, chamado S4, entre o distrito de Bento Rodrigues e o rio Gualaxo do Norte para tentar conter os rejeitos que sobraram na região. A mineradora também trabalha na recuperação da estrutura de três diques que foram impactados com o rompimento abrupto da barragem.
Instalação de sirenes
Após a tragédia de Mariana, a Samarco, decidiu instalar sirenes onde há população perto das barragens. Atualmente já são contabilizados 20 aparelhos em diferentes áreas. Na época do rompimento não havia nenhuma sirene. O sistema de monitoramento do complexo da mineradora também foi aprimorado com novos equipamentos.
Indenizações pela tragédia de Mariana ainda são discutidas
Em novembro do ano passado, a Promotoria de Mariana, visando assegurar recursos para o ressarcimento das vítimas da tragédia, entrou com uma ação na Justiça e conseguiu bloquear 300 milhões de reais das contas da Samarco. Atualmente, os atingidos pela tragédia que perderam sua fonte de renda recebem um salário mínimo mensal por família, mais 20% para cada dependente e uma cesta básica da empresa. Os desabrigados também estão morando em casas alugadas pela mineradora Samarco, em Mariana. As indenizações pelas propriedades e outros danos materiais e morais ainda não foram definidos. Um adiantamento de 20.000 reais de indenização foi dado pela mineradora às pessoas que perderam sua moradia, depois que o Ministério Público entrou com uma ação contra a empresa.
Ibama aplicou multas que já ultrapassam 300 milhões de reais
Os ex-moradores dos distritos de Bento Rodrigues, Paracatu de Baixo ,Gesteira e Barra Longa, fortemente impactados pelo rompimento da barragem, serão reassentados em novas comunidades até 2019. Os programas de reconstrução dos distritos serão executados pela Fundação Renova, uma instituição criada pela Samarco e suas acionistas Vale e BHP Billiton. A fundação, que de alguma forma tenta assumir o ônus da tragédia, desvinculando o nome das empresas ao processo, também conduzirá os 41 programas de recuperação ambiental e reparação socioeconômica previstos no acordo firmado da Samarco com o Governo Federal, em março.
No Espírito Santo, a fundação Renova começou nesta semana um programa de indenização em Colatina, cidade capixaba em que os moradores ficaram sem abastecimento de água por alguns dias após o rompimento da barragem. As famílias e empresas que tenha sofrido perdas materiais e em atividades econômicas poderão se cadastrar para serem ressarcidas.
Denúncia para cobrar punição
O Ministério Público Federal de Minas Gerais denunciou 21 pessoas da mineradora Samarco e integrantes das empresas Vale e BHP Billiton por homicídio qualificado com dolo eventual (quando se assume o risco de matar) pelo colapso da barragem. Entre os denunciados estão o ex-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi. Todos são suspeitos também dos crimes de inundação, desabamento e lesões corporais graves. Eles ainda foram denunciados por crimes ambientais, os mesmos que são imputados às empresas Samarco, Vale e BHP Billiton.
Após a tragédia, a Samarco decidiu instalar sirenes onde há população perto das barragens. Na época do rompimento não havia nenhuma
As três mineradoras vão responder por nove tipos de crimes contra o meio ambiente, que envolvem crimes contra a fauna, a flora, crime de poluição, contra o ordenamento urbano e patrimônio cultural. A Samarco e Vale ainda são acusadas de três crimes contra a administração ambiental.
Segundo o Ministério Público Federal, as investigações mostraram que os denunciados sabiam dos riscos de rompimento da barragem e, em vez de paralisar seu funcionamento, continuaram a operação de forma irresponsável. Um relatório que consta no inquérito policial também mostrou que a barragem de Fundão começou a receber rejeitos da Samarco seis meses antes do início oficial de sua operação. Caso as denúncias dos procuradores sejam aceitas pela Justiça, os acusados podem ir a júri popular e ser condenados a até 54 anos de prisão.
Tentativa de veto a barragens como a do acidente
O Ministério Público de Minas Gerais entrou, na sexta-feira, com ação para barrar todos os licenciamentos ambientais de novas barragens construídas com a tecnologia conhecida como alteamento à montante. Esse é o mesmo modelo utilizado na barragem de Fundão, em Mariana. Neste tipo de estrutura são erguidos vários degraus contra a parede que dá sustentação à barragem à medida que se aumenta a quantidade de rejeitos. Esse modelo requer critérios mais rígidos tanto para construir como para monitorar. Um decreto do Governo mineiro já tinha suspendido o licenciamento de novas barragens com alteamento à montante, mas permitia que os pedidos de licença que já estavam em curso continuassem tramitando. Agora, os procuradores mineiros querem que esses licenciamentos também sejam suspensos.
Atividades da empresa continuam embargadas
Desde o rompimento da Samarco, a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais informou que todas as atividades da Samarco Mineradora estavam suspensas e que a empresa não poderá operar até que repare os danos causados. Em outubro, Clovis Torresda, diretor-executivo da Vale, uma das empresas controladoras, disse acreditar no retorno das operações da Samarco até meados de 2017. O promotor de Justiça Mauro Ellovich, de Minas Gerais, afirma que não é contra a volta da empresa, mas afirma que a mineradora continua não cumprindo com as exigências para retornar a operação. “Não é possível que uma atividade seja ao mesmo tempo licenciada e danosa. Pelo menos ela tem conter o estrago”, disse em entrevista à rádio do MPMG.
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