_
_
_
_
_

Oksana Chusovitina, um milagre da ginástica aos 41 anos

24 anos após a sua estreia em Barcelona, a atleta fez seu último salto oficial neste domingo

Oksana Chusovitina cumprimenta o público.
Oksana Chusovitina cumprimenta o público.DYLAN MARTINEZ (REUTERS)
Mais informações
Na Vila dos Atletas, as derrotas e as vitórias se digerem com hambúrguer
Brasil vence a Colômbia por 2 a 0 e se classifica para a semifinal da Olimpíada

A sua é uma imortalidade diferente da de Nadia Comaneci. A ginasta romena obteve sete notas dez em Montreal 1976, uma nota antes impensável na modalidade de ginástica artística. Sete são os Jogos Olímpicos que esse esquilo-voador, também forjado do outro lado da Cortina de Ferro, leva nas costas. “Como alguém na sua idade pode se atrever a fazer isso com seu corpo?”, disse sobre ela a própria Comaneci. Com 41 anos, Oksana Chusovitina se transformou na ginasta feminina mais longeva da história. Vestida com um collant branco e rosa, ela se classificou em quinto na categoria do salto feminino representando o Uzbequistão — terminou na sétima colocação.

Com seu um metro e cinquenta de estatura, Chusovitina não se destaca muito entre as ginastas que disputam o pódio na Rio 2016. O contraste pode ser visto quando se observa mais de perto. O rosto de uma mulher que poderia muito bem ser a mãe das outras participantes. Um milagre do esporte se levarmos em consideração que a média de vida de competição de uma ginasta costuma ser de um ou dois Jogos Olímpicos. Três no máximo. Ela começou em Barcelona 1992, e ainda continua entre suor e pó de magnésio 24 anos depois.

Oksana Chusovitina, em sua participação no salto na Rio 2016
Oksana Chusovitina, em sua participação no salto na Rio 2016Cordon (Getty)

Em sua estreia na Ciudad Condal não levou somente sua primeira medalha de ouro. Conquistou também uma amiga que hoje em dia é sua treinadora. Sua colega da equipe de ginástica naqueles Jogos Olímpicos, Svetlana Boginskaya, apelidada de “o cisne bielorrusso”, já era um grande nome da modalidade que havia conquistado dois ouros e uma prata em Seul 1988. Como sua treinadora, Boginskaya precisa dizer a Chusovitina que desacelere um pouco: “Às vezes preciso dizer a ela: Já não tem 14, 15 anos. Não deveria fazer tantas repetições”. Não precisa delas. Tem memória muscular desde 1992”, em entrevista com as duas atletas para a revista Elle USA. Um dado que devemos levar em consideração: sua memória muscular é maior do que a idade de muitas ginastas que enfrenta no Rio: “Hoje, não preciso de muito treinamento físico”, explicou Oksana à ESPN dias atrás.

Ao invés do físico, graças precisamente à memória muscular que desenvolveu ao longo desses anos, exercita a mente: “Visualizo exatamente como é preciso executar os movimentos. Faço isso em minha cabeça e quando vou ao ginásio — onde passa entre duas e duas horas e meia diárias — toda a preparação mental que fiz após o café da manhã e caminhando se transfere ao ginásio. Se estou saltando, sei exatamente o que preciso fazer para uma execução melhor, uma altura melhor e uma aterrissagem melhor”. É o que a permite não ter numerosas lesões, como o tendão de Aquiles, um dos ligamentos cruciais segundo o The Telegraph.

Na foto à esquerda, Chusovitina ao ganhar a prata em Pequim 2008. Na imagem à direita, no Mundial de Tóquio em 2011.
Na foto à esquerda, Chusovitina ao ganhar a prata em Pequim 2008. Na imagem à direita, no Mundial de Tóquio em 2011.Cordon Press

A trajetória de Chusovitina, nascida em Bucara (Uzbequistão) em 1975, esteve ligada em boa parte às circunstâncias geopolíticas do momento. O EL PAÍS apurou como os observadores da equipe soviética prestaram atenção nela antes de completar 10 anos e a levaram a um torneio internacional dois anos depois. Em 1991 representou a União Soviética no Campeonato Mundial e um ano depois a Comunidade dos Estados Independentes nos Jogos Olímpicos de Barcelona com a ‘Equipe Unificada’. Com a desintegração do bloco soviético e a independência de seu país natal, passou a representar o Uzbequistão nos anos seguintes. Um período sem pódios olímpicos, mas com conquistas mundiais, até ganhar uma medalha de prata na modalidade de salto nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008. Tinha 33 anos à época e nenhuma menção de se aposentar.

A uzbeque não se destacava somente por preferir as cores mais escuras, o cabelo curto e a ausência de maquiagem entre um mar de rabos de cavalo, rímel e purpurina. Enquanto a polêmica rondava a ginástica naquele ano pelas atletas menores de idade, ela utilizava o dinheiro que ganhava na competição para custar um tratamento contra a leucemia diagnosticada em seu filho Alisher. Com ele e seu marido, o lutador Bakhodir Kurpanov, se mudou para a cidade de Colônia para poder tratar melhor a doença, que o garoto superou em 2008. É por esse motivo que tanto nos Jogos de Pequim como nos de Londres competiu sob outra bandeira, a alemã. Anunciou que a competição da capital inglesa seria seus últimos Jogos, depois se aposentaria definitivamente. Mas a decisão não durou muito: “De noite disse a todos que iria me aposentar, e na manhã seguinte acordei e mudei de ideia”, declarou à ESPN. Desde então, continuou competindo por seu país, o Uzbequistão.

Mesmo que os olhares estejam voltados à equipe norte-americana de ginástica, devemos lembrar que quando Simone Biles nasceu em 1997, Oksana já havia conquistado cinco medalhas em mundiais e um ouro olímpico. Perdeu precisão e seu ponto forte está em uma modalidade, o salto, mas hoje em dia poucas ginastas podem se gabar de continuarem sendo competitivas sete Jogos Olímpicos depois. Sobre Chusovitina, parece que ela ainda tem fôlego para mais, mas disse que provavelmente fez seu último salto oficial neste domingo — a conferir se muda de ideia amanhã.

Com seu filho, Alisher, em uma foto de 2006.
Com seu filho, Alisher, em uma foto de 2006.Getty

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_