Juiz libera protestos nas instalações da Rio 2016, mas Comitê recorre
Haverá multa se atos, incluindo 'Fora Temer', forem censurados
O juiz federal substituto João Augusto Carneiro Araújo determinou nesta segunda-feira que o Comitê Rio 2016 libere as manifestações políticas, incluindo as que pedem o "Fora Temer", dentro das instalações olímpicas. Caso a determinação não seja acatada e os organizadores dos Jogos Olímpicos do Rio continuem censurando a livre manifestação durante as competições, terão que pagar uma multa de 10.000 reais "por cada ato que viole a decisão" do magistrado. A liminar cabe recurso, e o Comitê recorreu da decisão nesta terça.
A decisão liminar (de cumprimento imediato, mas provisória) ocorre apenas dois depois das primeiras noticias sobre torcedores que foram retirados de seus lugares quando gritavam “Fora Temer” ou mostravam cartazes e camisetas contra o presidente interino. Para censurar estes atos, o Comitê Rio 2016 se baseia na lei 13.284, sancionada pela presidenta afastada Dilma Rousseff em 10 maio para a realização dos Jogos. A legislação proíbe bandeiras “que não sejam para fins festivos ou amigáveis”, além de manifestações de caráter “ofensivo, xenófobo, racista ou que estimulem outras formas de discriminação”. A legislação não faz referência a protestos políticos.
O juiz, que pertence a 12ª Vara Federal do RJ, entendeu que a lei assinada por Rousseff trata apenas de manifestações racistas ou xenófobas. Pode haver recursos em instâncias superiores e, eventualmente, a palavra final pode ser dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O Comitê Rio 2016 vem proibindo “qualquer tipo de manifestação política ou religiosa, não apenas as contrárias ao Governo Temer”, dizendo aplicar o conceito de "Arena Limpa", segundo confirmou sua assessoria de comunicação ao EL PAÍS. “Respeitamos a democracia, mas acreditamos que dentro da instalação não é o momento”. Entretanto, além de que os protestos políticos não se enquadram em questões racistas, xenófobas ou “não amigáveis”, o mesmo documento faz uma ressalva em um parágrafo (que tem prevalência sobre os incisos anteriores) e garante “o direito constitucional ao livre exercício de manifestação e à plena liberdade de expressão em defesa da dignidade da pessoa humana”. Esta ressalva não é levada em conta pela organização dos Jogos em casos de protestos políticos porque eles "podem gerar violência e ferir o direito dos demais", segundo o Comitê.
A ação contra a censura foi movida pelo Ministério Público Federal contra a União, o Estado do Rio de Janeiro e o Comitê Rio 2016. Nela, pedia para que os responsáveis pela organização dos jogos se "abstenham de impedir a manifestação pacífica de cunho político através da exibição de cartazes, uso de camisetas ou de outros meios lícitos nos locais dos Jogos Olímpicos Rio 2016".
A promotoria se referia a casos como a de um torcedor no sambódromo do Rio que assistia a uma prova de tiro neste sábado. Acompanhado de sua esposa e seus filhos, foi primeiro impedido por um agente da Força Nacional de levantar o seu cartaz. Momentos depois, quatro agentes se dirigiram até ele por supostamente ter gritado “Fora Temer”. "O próprio rapaz que gritou admitiu que havia sido ele. Outras pessoas disseram o mesmo, mas não adiantou, então deu no que deu. Começamos a discutir", explicou a esposa do torcedor ao EL PAÍS. "Um agente chegou a dar voz de prisão, mas questionamos qual era a alegação. Dois deles tentaram levar meu marido a força, pegando pelos braços e pelas pernas. Então ele decidiu acompanhar os agentes numa boa".
A discussão foi gravada e o vídeo viralizou nas redes sociais. Outro caso gravado foi o de um grupo de 12 torcedores que estava no estádio Mineirão, para ver a partida de futebol feminino entre EUA e França neste sábado. Tampouco puderam permanecer em seus lugares, já que nove deles vestiam camisas com letras estampadas que, posicionadas na ordem corretas, formavam a frase “Fora Temer”.
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