Ex-comandante do Exército chileno é preso pela morte de 15 pessoas em 1973
Juan Emilio Cheyre foi processado como cúmplice do assassinato de 15 pessoas no caso Caravana da morte
O general da reserva Juan Emilio Cheyre, que como Comandante do Exército (2002-2006) admitiu a responsabilidade de sua instituição na violação aos direitos humanos durante a ditadura militar, foi preso na tarde desta sexta-feira em Santiago Chile, após processo por 15 mortes ocorridas em outubro de 1973. Para o juiz Mario Carroza, que processou mais sete ex-oficiais de diversas patentes, Cheyre participou dos crimes como cúmplice no quadro da investigação sobre os assassinatos perpetrados na cidade de La Serena, no norte do Chile, onde, poucas semanas depois do Golpe de Estado, instalou-se a chamada Caravana da Morte, para matar opositores do novo regime.
A comitiva de militares que atravessou o país a bordo de um helicóptero Puma pôs fim à vida de 90 pessoas em diversas cidades chilenas –72 no norte e 18 no sul–, a maioria prisioneiros que aguardavam para ser submetidos a Conselhos de guerra ilegítimos. Liderada por Sergio Arellano Stark, que morreu em março deste ano, a Caravana da Morte foi uma iniciativa do próprio ditador Augusto Pinochet, como ficou provado ao longo do processo levado a cabo pelo juiz Juan Guzmán e que tornou possível a primeira ação fora de um foro privilegiado e o primeiro processo do ditador chileno, no começo da década de 2000.
Em outubro de 1973, quando ocorreram no regimento Arica de La Serena os fatos que lhe são imputados, Cheyre era um tenente com 25 anos de idade. Detido até agora no batalhão da polícia militar de Peñalolén à espera de uma notificação –no mesmo local utilizado antes pela chefe da polícia secreta de Pinochet, Manuel Contreras–, Cheyre é a mais alta autoridade das Forças Armadas a ser processada em uma investigação sobre violações aos direitos humanos. Desde a chegada da democracia, em 1990, nenhuma causa do gênero havia atingido um ex-comandante do Exército, com exceção do próprio Pinochet. O juiz Carroza –que está com o caso desde o final de 2015– acelerou a investigação sobre os assassinatos ocorridos há quase 42 anos. Em abril passado, com a participação do próprio Cheyre, foi reconstituído o cenário dos crimes de La Serena.
Cheyre é a mais alta autoridade das Forças Armadas a ser processada em uma investigação sobre violações aos direitos humanos
Nesta quinta-feira, o ministro Carroza explicou a sua decisão: “Sem prejuízo das circunstâncias que cercam a as suas ações, o elemento essencial é o conhecimento que ele tinha a respeito do que esteva acontecendo durante aquelas três horas em que a comitiva esteve em La Serena”.
Nomeado pelo ex-presidente Ricardo Lagos, em 2002, Cheyre levou adiante um projeto de uma modernização complexa do Exército chileno, com Pinochet ainda vivo e contra a resistência de toda uma geração de militares da reserva. Como Comandante do Exército, foi o primeiro a assumir a responsabilidade de sua instituição pelas violações dos direitos humanos cometidas durante os 17 anos de ditadura no país.
A comitiva de militares que atravessou o país a bordo de um helicóptero Puma pôs fim à vida de 90 pessoas em diversas cidades chilenas
Em 13 de junho de 2003, durante uma visita a Calama, outra cidade onde também aportou a Caravana da Morte, Cheyre afirmou: “...nunca mais para uma classe política que foi incapaz de controlar a crise que culminou com setembro de 1973. Nunca mais para os setores que nos incitaram e avalizaram a nossa atuação na crise por eles provocada. Nunca mais os excessos, os crimes, a violência e o terrorismo. Nunca mais a um setor ausente e mero espectador passivo. Enfim, nunca mais uma sociedade chilena dividida”. Nessa mesma linha, em 5 de novembro de 2004, Cheyre redigiu o texto Exército do Chile: o fim de uma visão, publicado no jornal La Tercera. “O Exército do Chile tomou a dura, porém irreversível, decisão de assumir a responsabilidade que lhe cabe como instituição em todas as ações cabíveis de punição e moralmente inaceitáveis do passado”, afirmou Cheyre.
Há três anos, quando o militar foi envolvido em um outro caso de violação a direitos humanos, o ex-presidente Lagos afirmou ao programa El Informante, da rede de televisão TVN: “Cheyre tem um lugar na história do Chile, e, portanto, acredito não ser justo julgá-lo por aquilo que fez quando era tenente, aos 25 anos de idade. O que mais poderia ter feito um tenente em pleno estado de guerra? Não estou justificando sua ação, mas me parece importante destacar o Cheyre Comandante que fala do ‘Nunca mais’ em nome do Exército, com todo o corpo de generais tendo aprovado essa declaração”.
Em 2002, Cheyre levou adiante um projeto de uma modernização complexa do Exército chileno, com Pinochet ainda vivo
Sobre as razões que o levaram a nomeá-lo chefe do Exército em 2002, Lagos disse: “Para a sua indicação, foram estudados os antecedentes, aqueles que se conheciam naquele momento. À certa altura, eu perguntei a Cheyre insistentemente sobre o que tinha acontecido naquele regimento, e ele me disse: ‘Presidente, por que o senhor não pergunta ao juiz Juan Guzmán –que era quem cuidava do caso?’. E o juiz Guzmán disse aquilo que todos nós sabemos: que Cheyre não estava envolvido”.
A prisão do ex-comandante em chefe do Exército causou um grande alvoroço no Chile, com autoridade políticas a favor e contra a sentença judicial. O advogado que atua em favor das vítimas no caso da caravana da Morte, Cristián Cruz, comemorou a decisão do juiz Carroza. “Aqueles que eu represento estão profundamente emocionados. Voltamos a acreditar na Justiça”.
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