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Movimentos sociais protestam na Flip contra descaso com moradores da região

OcupaFlip acontece neste sábado e lembra assassinato de morador em disputa de terras no mês passado

Ato da comunidade de Trindade após a morte de Jason Sampaio, em 2 de junho.
Ato da comunidade de Trindade após a morte de Jason Sampaio, em 2 de junho.Reprodução

O grito pela saída do presidente interino Michel Temer passa dos palcos e bastidores da Festa Literária de Paraty às ruas das cidade neste sábado. Às 14 horas, vários movimentos sociais promovem um ato público com concentração na Praça da Matriz, que irá circular no centro histórico expondo suas reivindicações e buscando sensibilizar quem veio à Flip. Segundo os organizadores do movimento, que se autodenominou OcupaFlip, a manifestação está congregada na rejeição ao Governo atual, com seu “desprezo aos temas locais”, mas envolvem demandas específicas de Paraty, Angra e Ubatuba – região habitada por indígenas, caiçaras e quilombolas.

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“O mote do protesto é o questionamento ao Governo interino, que além de ser fruto de um golpe que atinge a todos, já realizou cortes em verbas e projetos de lei específicos para a nossa área. Em um mês e meio, por exemplo, as questões relacionadas aos quilombolas já mudaram de pasta três vezes, e as políticas estão paradas”, disse Vagner do Nascimento, coordenador do Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra, Paraty e Ubatuba, mais conhecido como Vaguinho. Após a reforma ministerial de Temer, a atribuição das demarcações de terras quilombolas é tarefa do novo Ministério da Educação – e não mais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

O Forúm de Comunidades Tradicionais, que defende os direitos territoriais de indígenas e caiçaras, além dos quilombolas, é um dos principais articuladores da ação, que envolve também outras militâncias políticas e abarca uma programação de "mesas de debates autogestionadas sobre temas variados", conforme lembra Nina Taterka, que trabalha com comunidades indígenas na cidade. Uma dessas militâncias organizadas é o grupo Trindade Vive, que em comum acordo com a organização da Flip organizou um espaço na Praça da Matriz para denunciar problemas que a vila, que é um dos destinos turísticos mais cobiçados de Paraty, sofre em decorrência da especulação imobiliária.

O mais urgente deles no momento, defende o grupo, é a morte de Jaison Caíque Sampaio, de 23 anos, atingido no mês passado por dois tiros de seguranças que atuavam em uma área de disputa territorial. A família de Jason vive em um terreno que a empresa Trindade Desenvolvimento Territorial (TDT) afirma pertencer a ela há cerca de 40 anos, quando começaram as disputas, mas que os moradores da região alegam ser deles. O caso está sendo investigado. A TDT é parte de um holding de 280 multinacionais chamada Adela, que atua em Trindade e Laranjeiras construindo condomínios de luxo. “Mas nessa área específica, que estava cercada até o mês passado, a empresa nunca pôde construir nada, provavelmente por conta de legislação ambiental. Jaison tinha a casinha lá e foi covardemente assassinado por policiais que fazem bico como seguranças”, relata Davi Paiva, que é jornalista e faz parte da Associação de Moradores de Trindade (Amot).

Após a morte do jovem, diz Davi, a comunidade chegou a destruir cercas e ocupou definitivamente a área – que é protegida e já havia sido declarada Zona de Uso Comunitário, Cultural, Educacional, Esportivo e de Lazer (ZUCEL), de acordo com o Plano de Manejo do Ministério do Meio Ambiente. As reivindicações agora, além de justiça em relação ao caso, é que ela a área se torne definitivamente pública, “fazendo valer, inclusive, a determinação da lei municipal 1828/2011” – outra que deveria proteger os interesses dos moradores, lembra o jornalista. No espaço da Trindade Vive, os visitantes de Paraty durante os dias de festa podem receber informações sobre o caso e também assinar um abaixo-assinado proposto pelos moradores. Enquanto isso, nas redes sociais, circula um documentário sobre o tema, Trindadeiros: 30 anos depois.

Esta não é a primeira vez que um protesto aproveita os holofotes postos sobre a Flip para acontecer. Em 2009, os representantes do Fórum de Comunidades Tradicionais tiveram um manifesto lido por Chico Buarque, um dos convidados naquele ano, na tenda dos autores. Nesta edição, os movimentos sociais afirmam estar em “diálogo amigável” com a Flip, mas não atuam “nem contra, nem a favor” do evento. "Queremos aproveitar esse momento de visibilidade da cidade para denunciar os problemas e chamar a população", diz Vaguinho.

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