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Em primeira pessoa
Opinião
Texto em que o autor defende ideias e chega a conclusões basadas na sua interpretação dos fatos e dados ao seu dispor

Netos, a prolongação da alegria

Rejuvenesci sendo avô, pois todos os dias alguma surpresa me espera

Juan Cruz
Um avô brinca com seu neto.
Um avô brinca com seu neto.Getty

Você se faz avô e a primeira coisa que você quer saber é quando ri. Você repara no peso, descobre a alegria cansada na cara da sua filha, aceita com resignação as comparações entre a cara da criança e os rostos de toda a família, e depois pergunta: “E quando ri?” Depois de um tempo, você pergunta se já presta atenção, e quando sorri pela primeira vez e você sabe que presta atenção (em todos, menos em você, talvez), faz uma pergunta inevitável: “E quando fala?” Em geral, todas essas perguntas já foram respondidas pela ciência e pela experiência. Mas no dia dos avós você insiste, como se a criança que nasceu há um mês fosse uma criatura excepcional que vai revolucionar a linha argumentativa de todos os recém-nascidos.

Não, a criança falará mais tarde. Mas, como você se cansa de esperar, qualquer som que emitir já lhe parecerá o preâmbulo de suas palavras. Quando que lhe dizem que o garoto simplesmente arrotou, você seguirá esperando resignado que finalmente ele emita o primeiro som que seja uma palavra. Meu neto, em particular, disse a primeira palavra numa tarde que tinha começado de forma dramática para mim mesmo: haviam lhe detectado uma certa tendência à asma e, como sou asmático, ativei imediatamente o complexo de culpa. Será que o menino herdará esta pertinaz seca de meus pulmões? Quando saiu da consulta, a hipótese havia sido descartada: terá outras heranças, mas não essa. Meu neto saiu da consulta rumo à porta grande do centro médico, e logo encontrou um de seus brinquedos favoritos: um elevador. E disse, ante a surpresa geral, a primeira palavra que articulou em sua vida: “Elevador!” Com todas as sílabas, com todas as letras.

Agora estamos esperando (estou esperando, no dia dos avós!) que ele saiba ler com desenvoltura, mas ainda falta um tempo. Quando for capaz de ler, imagino, vou querer vê-lo escrevendo romances, e finalmente ganhando prêmios... Porque nós, avós, somos insaciáveis; os netos prolongam nossa alegria, e num momento determinado são a prolongação de nossa vida. Meu neto me rejuvenesceu, pois todos os dias me reserva alguma surpresa – no que diz, no que faz. E no que me desperta vê-lo crescer até ser uma árvore, sob a qual algum dia me sentarei buscando sua sombra.

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