Bem-vindos a Dismaland, o parque temático de Banksy
O grafiteiro inaugura sua mais recente e maior criação no oeste do Reino Unido
Os moradores contam que havia filas desde as 3h da madrugada. Como sempre acontece com Banksy, talvez realidade e lenda se misturem. Mas a verdade é que os 70.000 habitantes da pacata Weston-super-Mare, perdida na costa oeste britânica, vivem hoje um dia de glória: são os únicos convidados para a inauguração do parque temático que o grafiteiro mais famoso e ao mesmo tempo mais misterioso do planeta estava construindo em segredo na cidade. Uma espécie de versão distópica e provocadora da Disneyland, onde contos de fadas terminam em tragédia e predominam cores tão cinzentas como o céu inglês. O jornal local deixava bem claro na quinta-feira: comprovante de residência —um documento, uma fatura, contrato de aluguel— era o único passaporte válido no dia para entrar na Dismaland. A partir de sábado, no entanto, qualquer um poderá entrar.
"Fabuloso, estupendo, brilhante." O entusiasmo de Mike Reay, de 60 anos, um dos privilegiados que já visitaram a Dismaland, vai esgotando os adjetivos positivos. Acaba de sair com um amigo de um recinto que reúne o universo antissistema e de paródia de Banksy. No portão de entrada, onde há um enorme "Dismaland" escrito, contam que dentro reina uma atmosfera entre melancólica e deprimida, construída com certo talento pelos funcionários do parque. "Prazer em conhecê-lo. Bem, agora volto para a cama", disse a Reay o sujeito que fez uma checagem de controle de segurança fictícia na entrada.
Uma vez dentro, ambos os amigos descobriram que os meios de comunicação britânicos já haviam classificado o local como o maior trabalho do artista até o momento. Dismaland parece um pouco com os parques temáticos tradicionais: tem um mapa. No entanto, as coisas em comum acabam por aqui. As crianças não encontrarão bonecos risonhos ansiosos para abraçá-las, mas um agiota interessado em emprestar-lhes dinheiro a taxas de juros criminosas, relata com bom humor Gemma Astell, ao lado da filha Laila. Passeando por esse Banksyland, em vez de golfinhos brincalhões, há orcas assassinas e balsas com imigrantes que se afogam. O alívio de um parque tradicional abre espaço para a preocupação. Todos os sorrisos têm um sabor amargo.
A escolha do local não é mera coincidência. Afinal de contas, a sutileza de Banksy raramente deixa espaço para o acaso, seja pintando uma criança que escava o muro de Gaza ou um atleta lançando um míssil durante os Jogos Olímpicos de Londres de 2012. O criador disse que, desde menino, costumava visitar o parque temático de Tropicana, que eventualmente acabou fechando em 2000, devido à queda do movimento. Banksy entrou sorrateiramente na estrutura há alguns meses e deve ter ficado tão satisfeito que decidiu deixar sua nova marca no local.
"É um parque temático para a família, mas desconfortável para as crianças", definiu seu criador. O próprio Banksy contribuiu com 10 obras pessoais ao levantar esse monumento ao inconformismo, para o qual contou com uma ampla colaboração: na Dismaland estão expostas criações de até 56 artistas internacionais, incluindo pesos pesados como Damien Hirst, selecionados pelo grafiteiro e anfitrião.
"Entraram em contato comigo perto do Natal. Só disseram que estavam organizando uma exposição no Reino Unido com artistas internacionais, que estavam interessados no meu trabalho e que tudo tinha de ser confidencial", diz o artista espanhol Paco Pomet. Sete de suas pinturas foram selecionadas e são exibidas na galeria do parque. A organização se encarrega de tudo: transporte, seguro, alojamento e estadia. Em troca, pedem silêncio sobre todos os enigmas que cercam Dismaland e seu criador.
Silêncio violado
A confidencialidade exigida de Pomet é condição necessária e essencial para trabalhar com Banksy, cuja identidade permanece oculta e como um de seus maiores tesouros. O parque em si era um mistério até poucos dias atrás, quando a peça do artista foi revelada. Até então, apenas quatro pessoas de um conselho local sabiam o que ele estava construindo no terreno de Tropicana. Outros responsáveis acreditaram na versão oficial, que também foi ouvida pelos habitantes de Weston-super-Mare: o barulho era coisa de Hollywood, filmagens de um suposto thriller batizado de Grey Fox.
Mas as câmeras não chegavam, e o castelo que ocupa o coração do parque logo se tornou uma pergunta grande demais para não ter resposta. O mistério voou pelos ares na quarta-feira, quando a mídia britânica obteve as primeiras confirmações de que Banksy iria ressuscitar Tropicana. Os jornalistas foram aconselhados a manter silêncio, para evitar “spoilers e estragar a surpresa", disse o jornal The Guardian. Mas a história era muito suculenta não ser publicada imediatamente.
No sábado, Dismaland abre as portas para todos. Com o preço da entrada de apenas 3 libras (16 reais), não é difícil prever um fluxo de turismo nunca visto antes no local. Além disso, os interessados terão que se apressar: como nada de Banksy é para sempre, o parque permanecerá aberto por seis semanas. Em 27 de setembro será fechado até a próxima criação. Sabe-se lá quando. Sabe-se lá onde.
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