_
_
_
_
_

“Uma sociedade corrupta fede”, diz Papa

Em Nápoles, Bergoglio critica a política que não oferece trabalho digno

O papa Francisco em uma missa neste sábado, em Nápoles.
O papa Francisco em uma missa neste sábado, em Nápoles.A. DI MEO (EFE)

Entre as pessoas que sofrem, Jorge Mario Bergoglio se mostra incapaz de ler seus discursos preparados friamente. Aconteceu em Lampedusa, diante do drama da imigração — “quem chorou pelas mães que perderam seus filhos no mar? Caímos na globalização da indiferença” —; na Sardenha, em meio às graves sequelas do desemprego — “o sistema econômico atual está nos levando à tragédia e roubando a dignidade” —; e na Calábria, frente aos crimes brutais da Ndrangheta: “A máfia é a adoração do mal, o desprezo do bem comum. Estão excomungados”. Também neste sábado, em Nápoles, no bairro de Scampia, atingido há décadas pela incapacidade dos governantes e pela violência da Camorra, o Papa deixou os papéis de lado e afirmou: “A corrupção é suja e a sociedade corrupta fede. Um cidadão que deixa que a corrupção o invada não é cristão, fede!”.

Bergoglio quis entrar em Nápoles por Scampia, a periferia das periferias, uma terra de ninguém onde as diversas famílias mafiosas ligadas à Camorra se aproveitam há décadas dos jovens sem futuro para fortalecer seu poder no negócio do tráfico de drogas e do crime organizado. Scampia, ainda sob o estigma de Gomorra, continua representando o fracasso absoluto da política — a taxa de desemprego é superior a 57% — e por isso o Papa Francisco quis chamar a atenção dos governantes: “A falta de emprego para os jovens é um sinal de que existe uma falha grave no sistema. E quando não se ganha para poder levar o pão para casa, perde-se a dignidade. A falta de trabalho nos rouba a dignidade. Nesses casos, a pessoa corre o risco de cair na escravidão, na exploração. Conheço uma pessoa que ganha 600 euros (2.000 reais) por mês, informalmente, trabalhando 11 horas por dia. Isso não é trabalho, é exploração, escravidão! Temos que recuperar a luta pela dignidade!”.

O papa Francisco acrescentou que fechar a porta aos imigrantes ou não lhes oferecer um trabalho digno é corrupção: “Quanta corrupção há no mundo!”. Mais tarde, durante a homilia na Praça do Plebiscito, pediu de forma clara que os napolitanos enfrentem a Camorra: “Não deixem que roubem sua esperança, não cedam à tentação do dinheiro fácil e da renda desonesta. Não é nada mais do que pão para hoje e fome para amanhã. Não traz nada de bom. É preciso reagir com força”. Depois, e embora sem usar os duros termos empregados na Calábria quando excomungou a Ndrangheta, Bergoglio se dirigiu aos mafiosos: “Peço aos criminosos e a todos seus cúmplices, hoje, com humildade e como irmão: se convertam, permitam ser invadidos pelo amor e pela justiça (...). É possível voltar a ter uma vida honesta. Também é um pedido das lágrimas das mães de Nápoles. Que o crime não desfigure o rosto desta bela cidade!”.

Mais informações
A ‘Ndrangheta se rebela contra o papa Francisco pela excomunhão
Corrupção: túmulo da democracia
O ‘caso Petrobras’ respinga em obras feitas na América Latina
Após protestos, Governo anunciará ações de combate à corrupção

Além da visita à Scampia, o Papa também quis deixar claro novamente seu compromisso com as periferias almoçando com os presos do presídio de Poggioreale — entre os quais se encontrava um grupo de transexuais — assegurando que conhecia sua “situação dolorosa” através das cartas que chegam das prisões em todo o mundo: “Muito frequentemente, os presos se encontram em condições que não são dignas para o ser humano, e depois não conseguem ser reintegrar na sociedade”. Justamente na sexta-feira, o Papa voltou a mostrar sua total rejeição à prisão perpétua.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_