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Coluna
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O que virá depois?

Tantas aberrações só podem ter sido cometidas por pirraça, para realçar a necessidade de uma urgente e radical reforma política

As previsões podem ser sombrias, mas o fim de ano tem o prodigioso dom de dar-lhes um upgrade. O tal “pensamento positivo”, ou wishfull thinking, é uma proteína metabolizável pelos humanoides em circunstâncias especiais – especialmente quando calendários e ampulhetas indicam um recomeço.

Na véspera da champanhota do réveillon, abertas as lembrancinhas natalinas, eis que nosso horizonte teima em manter-se fechado, mortiço, infenso à obrigação festeira. Com narradores desanimados, sem inspiração, impera o enfado.

Perdemos o Mundial de futebol, mas ganhamos a copa da hospitalidade. A coligação partidária no poder há 12 anos, recebeu um cheque em branco para mais um mandato e, no entanto, inexplicável fadiga impõe-se às risonhas perspectivas de novo governo, novo elenco, estalos, viradas, surpresas, mudanças.

Derrotada duas vezes no último pleito, Marina Silva fez há dias uma afiada avaliação: “melhor perder, ganhando, do que ganhar, perdendo”. O terremoto-tsunami na empresa-símbolo do país pode ser o responsável pela surpreendente transformação do triunfo eleitoral em derrota política, mas sua irrupção é anterior. Visivelmente constrangidos e desnorteados, os timoneiros passam a impressão de que não conseguiram entender a extensão do fenômeno, nem leram o manual de instruções para emergências.

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Ao sugerir à Procuradoria Geral da República uma triagem preliminar dos ministeriáveis para evitar vexames depois da posse, a Presidência da República cometeu um homérico vacilo: assumiu sua total ignorância em matéria institucional-republicana, comprometeu sua autoridade e, como se não bastasse, revelou a uma sociedade estarrecida que não tem a menor noção do que vai (ou pode) acontecer.

Soltou as rédeas, curvou-se aos fados, entregou seu arbítrio ao arbítrio dos delatores, escancarou a sua insegurança e seus temores e ainda teve que engolir um portentoso e humilhante “não” do PGR, Rodrigo Janot.

Espremida pela voracidade dos aliados e a mediocridade da situação, a Presidência da República compôs o primeiro escalão do Governo federal com inaceitável descaso – beira a desdém. Desleixo.

Garantida a troika da economia, o resto é o resto. Os treze novos ministros anunciados na véspera do Natal, com raríssimas exceções (notadamente Jacques Wagner, Patrus Ananias, Aldo Rebelo, Nilma Lino), configuram um escárnio. O ex-governador Cid Gomes, indicado para assumir a pasta da Educação – considerada vital para o futuro do país – celebrizou-se ao enfrentar uma greve dos professores cearenses com esta pérola: "Quem quer dar aula faz isso por gosto, e não pelo salário. Se quer ganhar melhor, pede demissão e vai para o ensino privado".

Gilberto Kassab, novo ministro de Cidades é uma unanimidade: amigos e inimigos o consideram um dos piores prefeitos paulistanos, pior do que Paulo Maluf, em pé de igualdade com o sucessor, Celso Pitta. George Hilton, pastor, teólogo e animador de TV (como se apresenta) será o anfitrião da primeira Olimpíada sediada na América do Sul. Ao lado da presidente Dilma Rousseff.

Tantas e tamanhas aberrações só podem ter sido cometidas por pirraça, como provocação, para realçar a necessidade de uma urgente e radical reforma política. Balão de ensaio coletivo. Em outras palavras: é possível que grande parte deste ministério de fancaria sequer esquente suas cadeiras.

Resta uma preocupação maior: o que virá depois?    

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