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“As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim”

Presa e torturada por três anos, Dilma é uma sobrevivente dos anos de chumbo no país

Marina Rossi
Foto de Dilma ao ser presa.
Foto de Dilma ao ser presa./ arquivo público de São Paulo ((AFP))

Os três últimos presidentes do Brasil foram, de alguma maneira, perseguidos pelo regime militar. De todos, Dilma Rousseff, a atual presidenta, foi a única torturada. Lula foi preso e Fernando Henrique Cardoso exilado. Já Dilma carrega as marcas dos anos de repressão no rosto até hoje. “Uma das coisas que me aconteceu naquela época é que meu dente começou a cair e só foi derrubado posteriormente pela Oban (Operação Bandeirante, centro de investigações montado pelo Exército no final da década de 60)”, contou a presidenta em 2001, para a Comissão Estadual de Indenização às Vítimas de Tortura (CEIVT). “Minha arcada girou para outro lado, me causando problemas até hoje, problemas no osso do suporte do dente”.

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Para a dor nos dentes, Dilma Vana Rousseff contou que tomava Novalgina em gotas. Para a cicatriz, não houve remédio. Em maio de 2008, quando ainda era ministra da Casa Civil, Dilma talvez tenha falado pela primeira vez em público sobre a sua dor. Respondeu a uma provocação do senador José Agripino Maia (DEM), que perguntou, na comissão de Infraestrutura do Senado: “a senhora mentiu na ditadura, mentirá aqui?”. “Qualquer comparação entre a ditadura militar e a democracia brasileira só pode partir de quem não dá valor à democracia brasileira”, disse. “Eu tinha 19 anos, fiquei três anos na cadeia e fui barbaramente torturada, senador. E qualquer pessoa que ousar dizer a verdade para interrogadores compromete a vida dos seus iguais”.

Ao empossar os integrantes da Comissão Nacional da Verdade, em maio de 2012, a presidenta se emocionou no final de seu discurso de mais de 20 minutos. “As novas gerações merecem a verdade. E, sobretudo, merecem a verdade factual aqueles que perderam amigos e parentes e que continuam sofrendo como se eles morressem de novo e sempre a cada dia”, disse, com a voz embargada.

A barbárie sofrida por Dilma Rousseff ao longo dos três anos de prisão foi sendo narrada assim, em conta-gotas. Ano após ano da democracia brasileira. O depoimento dado à CEIVT em 2001 só foi revelado em 2012. Os detalhes expunham a dor em cada palavra. “Quando eu tinha hemorragia, na primeira vez foi na Oban. Foi uma hemorragia de útero. Me deram uma injeção e disseram para não me bater naquele dia”, relatou. “A pior coisa que tem na tortura é esperar. Esperar para apanhar. Eu senti ali que a barra era pesada. E foi”.

Como um filme de terror, Dilma seguiu: “Também estou lembrando muito bem do chão do banheiro, do azulejo branco. Porque vai formando crosta de sangue, sujeira, você fica com um cheiro [...]”.

Dilma hoje tem fama de durona. Linha dura. Faz cara de poucos amigos. Tem seus motivos. “Acho que nenhum de nós consegue explicar a sequela. A gente sempre vai ser diferente”, relatou. ““As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim”.

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