Juiz dos EUA permite que Argentina pague dívida emitida em Buenos Aires
Bloqueio judicial persiste sobre o passivo do país sul-americano sob jurisdição dos EUA e Reino Unido
O bloqueio judicial dos EUA ao pagamento de dívida da Argentina que tenha sido emitida com base na legislação de Nova York e Londres não se estende aos títulos sob jurisdição de Buenos Aires. Já em julho, quando o juiz Thomas Griesa, de Nova York, impediu que o Governo da peronista Cristina Fernández de Kirchner pagasse o vencimento de juros de bônus emitidos no exterior, esse funcionário do Judiciário norte-americano permitiu “por uma única vez” que fossem pagos os da lei argentina. Nesta sexta-feira, Griesa voltou a autorizar “por uma única vez” o pagamento de juros de outros títulos sob legislação de Buenos Aires que vencem na terça-feira.
Uma sentença de Griesa, ratificada pelo Supremo Tribunal em junho, havia determinado que a Argentina não poderia pagar os credores da dívida reestruturada em 2005 e 2010 se antes não pagasse os fundos abutres e os demais investidores que rejeitaram esse refinanciamento, e que mantêm em seu poder títulos públicos não quitados desde a moratória do país sul-americano em 2001. Cristina Kirchner se negou a cumprir essa sentença porque argumenta ser injusto entregar mais aos abutres e outros credores que têm 7,6% da dívida de 2001 do que o valor que o país se comprometeu a pagar aos que trocaram 92,4% daquele passivo. Outro de seus argumentos se baseia em que uma cláusula da dívida reestruturada que vence em 31 de dezembro estabelece que se a Argentina oferecer melhor pagamento aos que rejeitaram a reestruturação, os que a aceitaram poderão reivindicar tratamento igual.
O juiz de Nova York decidirá na próxima segunda-feira se declara a Argentina em desacato por descumprir a sentença de pagar aos abutres
Por isso, em 30 de julho se desatou a crise da dívida da Argentina. Nesse dia, o país teria de pagar 539 milhões de dólares (1,3 bilhão de reais) de títulos chamados Discount (desconto) sob as leis dos EUA e Reino Unido, mas Griesa impediu. The Bank of New York Mellon, que era o banco contratado pela Argentina para a transferência desses fundos, acatou a ordem do juiz e foi punido pelo Governo de Cristina Kirchner com a expulsão do país. Claro que essa instituição norte-americana só operava como banco de atacado na Argentina. Já o Citigroup, encarregado de pagar o Discount emitido em Buenos Aires, foi autorizado naquela ocasião a distribuir o pagamento.
Na terça-feira haverá novo vencimento da dívida, o segundo depois da crise de julho. Vencem juros do título chamado Par, tanto nos EUA e Reino Unido como na Argentina. O pagamento dos títulos em Nova York e Londres permanece bloqueado, mas o Congresso argentino aprovou uma lei pela qual o Governo de Cristina Kirchner depositará em território argentino os 166 milhões de dólares que deve aos credores desses títulos. O dinheiro será colocado em contas da sociedade estatal Nación Fideicomisos, em lugar do The Bank of New York Mellon. Se os credores não aceitarem essa mudança de agente fiduciário, deverão propor outro lugar de pagamento que esteja resguardado da sentença dos EUA. Será preciso ver quantos investidores aceitam receber na Argentina, um país com controles de saída de capital e que, com essa medida, busca se esquivar da sentença norte-americana. E também será preciso observar se as classificadoras de risco creditício consideram que os Pars sob a lei dos EUA e do Reino Unido se somam ao que elas definem como “o default restrito” da Argentina, até agora circunscrito aos Discount.
Na terça-feira também vencem 16 milhões de dólares em juros do Par sob legislação da Argentina. Como Griesa tinha dito em julho que “por uma única vez” admitia o pagamento do Discount da lei portenha, existia a incerteza sobre se desta vez ele bloquearia a transferência desses 16 milhões. Mas não o fez. Desse modo, a Argentina evitou que a crise da dívida se estendesse a outros títulos. O Citigroup também respira com mais tranquilidade porque temia que se acatasse um bloqueio de Griesa lhe sucederia o mesmo que ao The Bank of New York Mellon, com a diferença de que é o nono banco da Argentina em patrimônio líquido, com 71 agências e 2.787 empregados.
A disputa judicial continuará na segunda-feira. O juiz Griesa convocou para esse dia os advogados da Argentina para que apresentem seus argumentos para o país não ser declarado em desacato por descumprir sua sentença. Os fundos abutres pedem que a Argentina pague uma multa de 50.000 dólares para cada dia em que o cumprimento da sentença for atrasado.
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