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As sanções à Rússia e a crise levam Putin a aumentar os impostos

Pela primeira vez desde que assumiu, o presidente propõe aumentar o IVA e o imposto de renda

Pilar Bonet
Putin, em 31 de julho no Kremlin.
Putin, em 31 de julho no Kremlin.Sasha Mordovets (Getty)

O impacto negativo das sanções ocidentais sobre a Rússia junta-se às consequências da crise econômica e ao preço das aventuras políticas do presidente Vladimir Putin. O terceiro pacote de medidas imposto pela União Europeia, em vigor desde 1° de agosto, fará efeito aos poucos, segundo os especialistas locais, que debatem as formas e o ritmo da destruição, fio por fio, de um trabalho de décadas, cujo objetivo era a integração da economia russa a um mundo global. Neste complexo processo de "separação", sofrem tanto os que sancionam quanto os sancionados, todos envolvidos em um espiral de ação e reação cujo fim é difícil de saber.

A UE tenta castigar a política russa de "desestabilização" da Ucrânia com sanções, contra as quais o Kremlim trata de ativar os reflexos que fazem parte do inconsciente coletivo russo, como a mobilização em torno de um líder ou a capacidade sobre-humana de crescer diante de situações críticas. A nova guerra econômica coloca à prova as posições ideológicas oficiais, no caso de Bruxelas, a perseverança no caminho escolhido, apesar do seu efeito bumerangue, e no caso de Moscou, a habilidade dos russos deste século (contagiados pelo vírus do consumo) e de seus líderes (propensos à retórica) de aproveitar o desafio de diversificar sua própria economia.

O fator político predomina. "Se as autoridades russas quiserem revisar hoje a sua política, seria difícil mudar de posição, porque já são reféns da opinião pública que trabalharam para conseguir um apoio de 80% a 85%. Como corrigir quando as pessoas gritam que a Crimeia nos pertence?", comentou o diretor do Instituto de Análise Estratégica, o economista Igor Nikoláyev, para esta reportagem. Esse especialista indica que o custo anual dos planos para integrar a Crimeia à Federação Russa (640 bilhões de rublos em três anos, 13,389 bilhões de euros) equivale à metade do orçamento federal para a saúde.

Moscou supera o déficit previsto e não consegue elaborar o orçamento para 2015

Muito provavelmente, a Rússia vai estourar o déficit orçamental previsto para 2014 (390 bilhões de rublos ou mais de 8,155 bilhões de euros). O governo tem enormes dificuldades para elaborar o orçamento de 2015 por causa dos gastos imprevistos (Crimeia e guerra na Ucrânia), combinados com a diminuição da receita, entre outras coisas por causa da crise econômica e da fuga de investidores, assim como a previsão negativa sobre os preços do petróleo. Pela primeira vez desde que chegou ao poder, em 2000, Putin deu luz verde para a sempre impopular medida de aumentar os impostos, que o Parlamento deve aprovar para entrar em vigor. As opções consideradas são o aumento do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) de 18% a 20%, a introdução de um imposto sobre as vendas (3%) ou o acréscimo de um ou dois pontos percentuais em escala progressiva sobre o imposto de renda, atualmente em 13% para todo mundo. O imposto sobre as vendas existiu no passado e tinha um caráter regional, mas foi abolido por ser pouco eficiente e os problemas de coleta que causava.

As últimas sanções europeias, somadas às dos Estados Unidos, afetam cinco bancos russos (Sberbank, VTV, Gazprombank, Vneshekonombank e Rosseljosbank), cujos acessos ao capital internacional foram restritos, já que os cidadãos e empresas europeias estão proibidos de comprar ou vender títulos, ações ou instrumentos financeiros dessas instituições com vencimentos superiores a 90 dias. Os bancos russos, no entanto, podem pedir empréstimos a sindicatos e suas filiais na UE, que estão à margem das sanções. Entre todos os bancos afetados, o Sberbank é o mais importante, já que praticamente todos os cidadãos russos maiores de 14 anos são clientes dessa instituição, da qual 24 milhões de aposentados recebem suas pensões. As sanções "destroem as bases de funcionamento do sistema financeiro global e não contribuem para resolver a crise europeia em relação à situação na Ucrânia", diz o comunicado do banco.

A Rússia tem uma reserva monetária (cerca de 478 bilhões de dólares, ou 355 bilhões de euros, ao fim de junho) e o Banco Central pode manter o poder do rublo, mas a fuga de capitais já causa o consumo dos fundos criados para momentos de crise. No primeiro semestre de 2014, a fuga de capitais cresceu para quase 75 bilhões de dólares (48,8 bilhões no primeiro trimestre, e 33,7 bilhões no mesmo período do ano passado).

O custo da anexação da Crimeia equivale à metade da despesa federal em previdência

A economia russa estagnou em junho, e o PIB pode cair este ano para 1% em relação a 2013, diz Nikoláyev, que prevê uma queda ainda maior, de 3% a 4% para 2015. A inflação, no entanto, ficará abaixo dos 10% neste ano, afirma. "Tudo vai de mal a pior", mas "no momento não há motivos para pânico" e, portanto, não há motivo para correr ao banco e sacar todos os depósitos, afirma o economista, que junto com outros especialistas passou conselhos aos seus cidadãos em um debate organizado pela agência Rosbalt, sob o slogan "Como proteger suas economias no apogeu dos choques econômicos?"

Enquanto isso, a Rússia abriu uma concorrência para a criação de um sistema nacional de bandeiras de crédito, alternativo ao Visa e ao Mastercard.

Adeus às maçãs polonesas

Alegando razões fitossanitárias, a Rússia proibiu a importação de frutas e verduras procedentes da Ucrânia e da Polônia, mas o país não está preparado para substituir essas importações com seus próprios produtos.

O enclave russo de Kaliningrado, situado entre a Polônia e a Lituânia, será gravemente afetado pelo veto aos produtos agrícolas poloneses, enquanto a Crimeia tem dificuldades para repor os produtos ucranianos. Os preços das frutas e das verduras cresceram entre 20% e 30%, afirma o economista Igor Nikoláyev, diretor do Instituto de Análise Estratégica.

As sanções revalorizaram uma fruta tão popular quanto a maçã, uma vez que a Rússia produz muito apenas em estações sazonais, e a importação corresponde a 45% desse mercado. Das 1,24 milhões de toneladas de maçãs importadas em 2013, 54% eram polonesas. "Não podemos substituir totalmente as importações e, se a demanda continuar e a oferta for baixa, os preços vão subir. Não podemos repor toda a carne espanhola, todas as maçãs polonesas", enfatiza Nikoláyev.

Se as sanções forem mantidas, a Rússia pode se ver em uma situação parecida à do Irã, "só que o Irã aguentou de 1982 até 2014, e a Rússia não pode aguentar tanto tempo", conclui o economista.

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