Tensão dispara em Odessa após centenas de pró-russos invadirem uma delegacia
Os invasores liberaram cerca de trinta ativistas que eram reféns. "Os russos abandonaram um dos seus" gritavam
Um ambiente tenso e volátil, carregado de raiva e frustração, reinava neste domingo em Odessa, a cosmopolita cidade portuária do mar Negro, depois da trágica morte de mais de 40 pessoas no dia 2 de maio, em consequência dos confrontos entre ucranianos e pró-russos e do incêndio do prédio onde tinham se refugiado estes últimos.
Numerosos cidadãos continuavam depositando flores em memória dos mortos diante da sede provincial dos sindicatos, situada em uma área zona verde nem tão distante da estação central. As janelas do edifício estavam rompidas; as fachadas chamuscadas e no carbonizado interior um perceptível cheiro de matéria orgânica em decomposição dava conta do horror vivido pelos que buscaram refúgio ali na sexta-feira passada.
Ao arder, inflamada pelos coquetéis molotov, a sede dos sindicatos virou um forno. As fotos dos corpos queimados que circulam pelas redes sociais documentam o dantesco panorama que os habitantes de Odessa, famosos por seu peculiar senso de humor, custam aceitar.
Na atribuição das culpas, os relatos do acontecido diferem. No entanto, em termos gerais, tudo começou quando no centro de Odessa se manifestaram grupos de torcedores do jogo de futebol programado para aquela tarde entre a equipe local, o Chernomoretz, e o visitante, o clube Metalist, de Kharkiv. Tudo estourou quando no centro da cidade se manifestaram as torcidas duas equipes de futebol
As torcidas organizadas são toda uma instituição na Ucrânia, podem prestar apoio político a diferentes causas e podem ser também instrumentalizadas para as mesmas, assinala um cientista político local.
O número de mortos oscila entre 42 e 46, segundo as diversas contagens
Em virtude de um acordo elaborado ao calor do Euromaidán (os protestos pro-europeias que acabaram convertendo na revolução que defenestrou o presidente Víctor Yanukóvich), as torcidas organizadas apoiam a unidade do Estado à margem de suas rivalidades esportivas. Em Odessa, essas torcidas promovem precisamente uma dessas marchas de unidade que fora abortada, segundo umas versões, porque contra os manifestantes, portadores de bandeiras ucraninas, dispararam provocadores pró-russos e, segundo outras versões, porque os pró-ucranianos perderam o controle, ao ver grupos de pró-russos que usavam fitas de San Jorge (laços com faixas negras e laranja em memória dos mortos durante a II Guerra Mundial).
O resultado da violência foram quatro mortos (aparentemente por arma de fogo) e uma enlouquecida perseguição dos pró-russos por parte dos pró-ucranianos.
A corrida levou todos ao acampamento que os pró-russos tinham montado há tempos no chamado campo de Kulikovo, um parque situado em frente à sede dos sindicatos. As tendas de campana foram incendiadas e os perseguidos refugiaram-se na sede dos sindicatos. O pânico apoderou-se de todos.
A jornalista Yelena Rikovtsa, que esteve ali, contava assim: “Quando os partidários do Maidán chegaram ao campo de Kulikovo com a firme intenção de desmantelar o acampamento, seus ocupantes se lançaram à sede dos sindicatos e se entrincheiraram ali. Os partidários do Maidán começaram a queimar as tendas”. A jornalista assegura que, uma vez na sede sindical, os coquetéis molotov foram lançados no interior e no exterior do edifício.
O número de mortos oscila entre os 42 e os 46, segundo as diversas contagens. Há também dezenas de feridos hospitalizados. A polícia não passou a relação completa, mas nas listas que se vão aumentando há pelo menos 14 pessoas identificadas, todas de Odessa, das quais quatro pereceram por ferida de armas de fogo e quatro por cair do prédio. Uma vítima do fogo foi o poeta Vadim Negatúrov, de 55 anos, muito conhecido na cidade e cujo enterro acontece na segunda-feira.
Ontem, a polícia se viu obrigada a libertar as 67 pessoas que tinham sido detidas na sexta-feira, depois que a promotoria cedesse às pressões de mil manifestantes excitados e violentos que utilizaram paus e até um caminhão para conseguir seus fins e que estavam dispostos a tomar por assalto a delegacia central da cidade.
Em Odessa declararam-se três dias de luto e a cidade foi visitada por Piotr Poroshenko, o candidato presidencial que encabeça a lista dos favoritos, e também o atual chefe do Governo, Arseni Yatseniuk, que acusou a polícia de debilidade e de não ter feito nada para evitar a tragédia. A cúpula da polícia local foi destituída e Yatseniuk prometeu uma investigação a fundo.
“Não pode ter sido gente de Odessa, aqui a população é pacífica, tem senso de humor e sentido prático e comercial”, afirmava o jornalista Dmitri Spinariov. Pese às manifestações do Maidán e do Antimaidán, que se dão na localidade periodicamente, a cidade tem estado bem mais tranquila.
Os incidentes produzem-se quando Odessa se prepara para o verão, os restaurantes botam suas mesas às esplanadas e os cruzeiros voltam a chegar cheios de turistas desde o dia 2 de maio, segundo Spinariov.
O medo a possíveis provocações da parte russa, já seja desde a Rússia ou desde a região do Transdniéster, é patente. No aeroporto os guardas de fronteiras apartavam aos homens de cidadania russa que chegavam no voo de Moscou “para manter uma conversa com eles e saber se sua entrada está justificada ou não”, segundo explicava um alfandegário. Meios relacionados com serviços de segurança russos manifestaram a esta correspondente que em Odessa trabalham veteranos destes serviços com experiência na URSS e também no Transdniéster, onde há um importante contingente militar russo.
Segundo o primeiro-ministro Yatseniuk, os confrontos são parte de um plano “impulsionado pela Rússia para destruir a Ucrânia” com o fim de repetir em Odessa o que acontece em outras regiões do país.
Por sua vez, o ex-prefeito da cidade Eduard Gurbish manifestou em uma entrevista a Eco de Moscou que em Odessa, de cada 100 pessoas, só 2 querem a união a Rússia.
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