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Protestos na Venezuela

Vargas Llosa: “As lutas dos estudantes são nossas também”

“Ninguém quer avançar na direção dos patéticos anacronismos de Cuba ou da Coreia do Norte”, adverte na Venezuela o Prêmio Nobel de Literatura

Vargas Llosa, no fórum da oposição venezuelana.
Vargas Llosa, no fórum da oposição venezuelana.Jorge Silva (REUTERS)

Mario Vargas Llosa é bem mais que o guru da oposição da Venezuela. Lá, ele se sente como um venezuelano a mais, e não só pelos grandes amigos que fez em quase 40 anos de relação. Foi lá que sua carreira internacional como romancista recebeu o primeiro grande respaldo —ganhou em 1967 o prêmio Rómulo Gallegos com A casa verde—; é lá que ele trata de desenvolver um processo na contramão de suas ideias liberais —essa moeda lançada ao ar chamada socialismo do século XXI— que lhe permitiu exercer o papel que mais gosta: o do intelectual que não conserta fronteiras geográficas e se sente no dever de opinar sobre o que quer que seja e onde seja.

“Não vim provocar a ninguém, mas sim criticar coisas equivocadas”, esclareceu o escritor em sua primeira coletiva de imprensa no país. Ocorreu ao final de sua primeira intervenção no fórum pelo 30 aniversário de Cedice —um reputado centro de divulgação das ideias liberais—, que motivou antecipados pedidos de entrevista da imprensa local e de correspondentes estrangeiros. Com paciência e um pouco de atraso, tratou de atender a todos, suportou com bom humor, embora visivelmente desconfortável pelo calor que fazia na sala de imprensa —em Caracas sopra um vento úmido nestes dias de finais de abril—, a infinita repetição de respostas às mesmas perguntas. À jornalista Shirley Varnagy, da cadeia venezuelana de notícias Globovisión, ele lançou inclusive um galanteio que honrou a fama de sedutor que ele leva. Quando o diretor da transmissão lhe informou que ele deveria olhar para a câmara durante a entrevista, o Nobel disse que preferia se concentrar nos profundos olhos azuis da seu entrevistadora.

É um Vargas Llosa relaxado que, no entanto, é consciente da importância que as suas palavras têm para este país, que vive, segundo sua leitura, uma luta cujo resultado influenciará no futuro da América Latina. Hospedado em um hotel próximo, o Nobel só precisava cruzar a rua para chegar até o teatro Chacao, onde ocorreram as suas duas apresentações públicas —o restante da agenda está sendo feito em segredo— e assistiu como mais um ao resto das mesas-redondas. Sempre andava rodeado de guarda-costas que o acompanhavam até a porta do teatro. Entrava, às vezes escutava algumas ideias e depois saía de novo. Era impossível que pudesse prestar toda a atenção que quisesse, porque lá fora muitos o esperavam.

Os estudantes da oposição foram os grandes beneficiados da visita do escritor. No meio de uma das tantas entrevistas que concedeu na quinta-feira, o Nobel confirmou a este jornal que tinha se reunido em duas ocasiões com os líderes universitários. Mais que uma deferência para a luta que eles levam adiante, o autor de A festa do bode está convencido de que os jovens são a vanguarda que enfrenta o regime do presidente Nicolás Maduro. É o que indica a história da Venezuela —os jovens estudantes que em 1928 se opuseram à tirania de Juan Vicente Gómez (1908-1935) se converteram depois nos pais fundadores da democracia venezuelana— e outras experiências similares na América Latina que mencionou de passagem em uma entrevista concedida ao jornalista César Miguel Rondón em seu programa de rádio: “Os estudantes venezuelanos comprovaram o fracasso da utopia coletivista no mundo e ninguém quer avançar na direção dos patéticos anacronismos de Cuba ou da Coreia do Norte”.

Essa razão apontada por Vargas Llosa permite entender como dentro de um fórum, que discute ideias liberais, participaram nesta sexta-feira em uma conferência as autoridades eleitas dos estudantes universitários, representantes de todas as alas que convivem dentro da oposição: Juan Requesens, presidente da Federação de Centros Universitários da Universidade Central da Venezuela, tido por moderado; Ana Karina García, dirigente juvenil da Junta Patriótica Estudantil e Vilca Fernández, estudante da Universidade dos Andes, ambos classificados como radicais.

Se em um passado recente os estudantes eram refratários a essas ideias conservadoras e mais inclinados ao pensamento de esquerda, a presença de Vargas Llosa em Caracas e o empurrão moral que isso representa para sua luta derrubou os preconceitos das ideologias. “Seus mortos, seus torturados e suas lutas, são também nossas; expressamos nossa gratidão”, disse o Nobel aos estudantes venezuelanos durante uma coletiva de imprensa na quinta-feira. No meio dia venezuelano desta sexta-feira voltaram a se reunir. A oposição vê nesta visita a possibilidade de que sua luta se legitime no exterior.

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