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“Os protestos estão fazendo o jogo do Governo”

O dirigente opositor mostra-se muito crítico contra o presidente Nicolás Maduro, embora também seja contra os protestos de barricadas

Francisco Peregil
O líder opositor Henrique Capriles.
O líder opositor Henrique Capriles.JUAN BARRETO (AFP)

Henrique Capriles Radonski, governador do Estado de Miranda, é o homem que já esteve mais perto de vencer ao chavismo em eleições. Segue sendo o opositor com maior apoio eleitoral, embora nas eleições municipais de dezembro o Governo lhe tenha infligido uma derrota contundente ao conquistar 70% das prefeituras. Agora, outro nome começou a lhe fazer sombra nos meios de comunicação: Leopoldo López, o dirigente encarcerado cinco dias depois sob a acusação de promover os distúrbios de 12 de fevereiro. Capriles se mostra muito crítico em relação ao Governo, embora também quanto aos protestos com barricadas, chamados coloquialmente guarimbas, defendidas por Leopoldo López.

Pergunta. O que o sr. acredita que vai acontecer nos próximos dias?

Resposta. Há uma situação de conflito que vai se manter porque nenhum dos problemas que estamos vivendo no país teve resposta por parte do Governo. A inflação de março foi de 4,1%. Só em março. É parecida com a que podem ter durante todo o ano países como o Chile, Colômbia, Equador… Se consideramos o total anual, foi de mais de 60% no último ano. Isso destrói o salário, há uma situação de escassez terrível. Há zonas onde não se consegue farinha, azeite, manteiga, sabão, papel higiênico, pasta de dente.

P. A que atribui isso?

R. Acabaram-se os dólares. Se você tem uma economia que depende das importações e gasta todos os dólares… O Banco Central já não publica os dados da escassez. Mas em dezembro de 2013 publicaram e, com o óleo de milho, a escassez ficou em 84%, a de farinha de trigo chegou a 79,1%. Em dezembro o leite integral líquido tinha 97,8% de escassez. As baterias para veículos, 88,2%. Este modelo econômico não funciona. Como não vai haver uma situação de conflito?

P. O sr. disse que, se a oposição quiser governar algum dia, terá de atender às reivindicações dos mais pobres. Acredita que os protestos atendem a essas necessidades?

R. Eu vi uma classe média muito mobilizada. Mas essa classe média, golpeada e maltratada, não é a maioria do país. Às vezes pisa na bola, ou seja, entra no jogo do Governo, e não se dá conta de que colocar as barricadas não ajuda a quem é preciso ajudar. Escuto alguns setores dizerem: “Quando os morros baixarem…” [quando se unirem aos protestos os mais pobres, que vivem nos morros que rodeiam Caracas]. Os morros não vão baixar. É preciso subir até eles e falar com os pobres. Se você ficar insistindo no lema “fora Maduro”, isso não tem apelo para as pessoas que vivem no barrio (zona de pobreza). E ao Governo interessa a polarização, essa briga entre a classe média e os setores pobres.

P. Por que muita gente que faz fila nos supermercados critica tanto o Governo como as guarimbas?

R. É que se você está em uma fila e ainda por cima tem de lutar com uma barricada para comprar os mantimentos... Eu acredito que o Governo está infiltrado nas barricadas, não tenho nenhuma dúvida. Vi caminhões que baixam escombros, bloqueiam a via e vão embora em seguida. O Governo também joga e está jogando com as guarimbas. Interessa-lhe que não falemos de inflação e sim de guarimbas.

P. O sr. foi vaiado recentemente durante um protesto de opositores?

R. Não. Isso é uma coisa fabricada pelos laboratórios do Governo. Agora: se alguém me vaiasse porque eu digo que é preciso construir uma força para unir o país… Olhe, nunca fui representante dos extremos. Você imagina o impacto que sofri ao ver que despiram [na quinta-feira] um jovem na universidade [um grupo de chavistas] e o puseram para correr encapuzado? Assim fizeram com os judeus. Eu sou católico, mas meus bisavôs morreram em um campo de concentração, venho de uma família sobrevivente do gueto de Varsóvia. Não acredito na violência. Isto é uma espiral de violência na qual ninguém ganha. O país não pode ser dirigido pelos extremistas.

P. Os protestos debilitaram a oposição?

R. Temos um Governo que se está extinguindo. Seu nível de aceitação não supera o 40%. Temos um Maduro cada dia mais impopular, mas isso não significa que a oposição esteja capitalizando esse descontentamento. O desafio é capitalizá-lo. Com barricadas? Não, oferecendo um projeto de país. Há um problema de escassez? Diga como vai resolvê-lo. Há um país muito mais profundo que aquele que às vezes você vê na imprensa.

P. A que se refere?

R. Bom, a que as notícias políticas dominam as manchetes. Tudo tem a ver com a violência. E não há notícias relacionadas com a economia.

P. Mas os protestos debilitaram a oposição?

R. Debilitam o Governo, porque o Governo atuou de uma forma criminosa. Mas, de acordo com as pesquisas, não significa que esses protestos estejam sendo capitalizados pela oposição. É preciso protestar contra a situação da economia. E de forma pacífica.

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