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Quem se decepcionou com a pesquisa de SP sobre os rolezinhos?

Ninguém esperava que 82% dos cidadãos adultos da capital paulista se mostrassem contra os rolezinhos

Juan Arias

Ninguém esperava que 82% dos cidadãos adultos da capital paulista se mostrassem contra os rolezinhos, e que entre os jovens maiores de 24 anos só 11% se declarassem a favor dos mesmos, conforme revela a pesquisa Datafolha desta quinta-feira.

E o resultado desse levantamento muito provavelmente se repetiria de forma quase igual em todas as outras cidades importantes do país.

Decepção entre os que já haviam sacralizado esse tipo de brincadeira ou de protesto, que vem sendo estudado até no Palácio do Planalto? Decepção entre certa esquerda ideologizada, que tinha visto nos inocentes rolezinhos em busca de distração uma espécie de “moscas-varejeiras” dentro dos shoppings de luxo, um renascer das velhas vanguardas de jovens anticapitalistas?

Decepção dos que preferiam que as motivações dos protestos de junho passado fossem substituídas pela luta racial contra a discriminação de negros e brancos, uma causa que o poder pode sempre abraçar como bandeira progressista sem maiores consequências desestabilizadoras?

Serão melhores os rolezinhos de negros e mestiços que exigem tão somente se divertir dançando entre as lojas dos objetos de luxo, como desejos reprimidos, do que os outros jovens que, em vez do esbanjamento da Copa, preferem melhores hospitais, melhores escolas e uma polícia mais bem preparada, mais moderna e a serviço da democracia?

A pesquisa de São Paulo foi uma ducha de água fria para quem começava a se divertir pensando que, defendendo essas brincadeiras de adolescentes, poderia conquistar seus votos, por vê-los como a esperança de uma nova esquerda, enquanto eles mesmos se definem como pós-políticos, decepcionados com todos os partidos, sem ideologia, mas ao mesmo tempo bem “informados” pela internet. Como disse um deles, David Santana: “Nós sabemos muito bem que os políticos querem nossos votos”.

A quem decepcionou a pesquisa de São Paulo sobre os rolezinhos? A decepção de muitos é que esses rapazes não são os novos lutadores contra o consumo, de cujo festim, pelo contrário, desejam também desfrutar. Não são de esquerda porque não têm uma ideologia que os motive quando tentam se divertir criando caos nos shoppings.

E a decepção maior foi a dos que já faziam seus cálculos políticos com esse novo fenômeno, que desta vez não fez o poder perder o sono, como em junho passado, quando, em vez de invadirem os shoppings tentaram invadir o Congresso, com uma clara ação de protesto contra os abusos da classe política.

E uma decepção maior ainda é que justamente a Zona Leste de São Paulo, de onde provém a maioria dos rolezinhos, seja a que apresenta um índice mais baixo de aprovação a eles: apenas 8%.

Trata-se então de uma sociedade, a paulistana, que é conservadora, reacionária, incapaz de se sensibilizar com as inquietações sociais dos jovens e que não se importa com o fato de os pobres serem discriminados nos templos do consumo, sobretudo se forem negros ou mestiços e vindos da periferia dos excluídos?

Não. O resultado da sondagem revelaria acima de tudo uma sociedade amadurecida, com grande senso comum, que já demonstrou durante as manifestações de junho que está disposta a sair à rua para defender melhores serviços públicos, uma democracia mais real, com liberdade para todos, sem distinção econômica ou de cor da pele, mas que tem medo de que se brinque com a democracia.

Não por acaso, fica claro na pesquisa que os paulistanos são contra que os shoppings realizem uma discriminação entre brancos e não brancos, entre ricos e pobres. Mais ainda, contrariamente àquilo que quiseram defender alguns políticos considerados progressistas, a maioria constata que nunca aconteceu tal discriminação, desde que esses jovens entrem nesses templos como outros mortais, seja para comprar ou para desfrutar do ar-condicionado, mas não para criar medo e irritação.

E uma última decepção para os que já tinham santificado os rolezinhos como os novos profetas do combate ao luxo da sociedade de consumo, do luxo e do esbanjamento: a parte da sociedade que mais defende a ação dos rolezinhos na pesquisa, 16%, encontra-se entre os mais ricos.

A sociedade menos favorecida, a das famílias com dificuldades para chegar ao fim do mês, prefere que seus filhos estudem, se especializem e trabalhem para que possam gozar de uma vida melhor do que a de seus pais. Por isso, não aplaudem os rolezinhos. Prefeririam, possivelmente, vê-los de novo na rua protestando contra as injustiças sociais, a corrupção política e empresarial e a favor de que todos, sem distinção, possam ter as mesmas possibilidades de triunfar na vida.

Uma sociedade que pensa assim pode ser tachada de conservadora e direitista? Acredito que seria injusto.

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