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De Obama a Trump: os Estados Unidos contemplam o impensável

A possibilidade de que o magnata ganhe as eleições ainda é remota, mas deixou de ser inverossímil

Marc Bassets
O presidente Obama deixará o cargo em janeiro de 2017.
O presidente Obama deixará o cargo em janeiro de 2017.Kevin Lamarque (REUTERS)
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Oito anos atrás, os Estados Unidos estavam prestes a escolher seu primeiro presidente negro. O democrata Barack Obama prometia pôr fim a décadas de divisões. Era um político incomum: moderado, paciente, capaz de analisar todos os aspectos de um problema antes de tomar uma decisão, consciente dos limites de seu poder e de seu país, pragmático e, ao mesmo tempo, visionário.

Hoje, Donald Trump, um homem de negócios desbocado e fanfarrão, com uma tendência irrefreável ao insulto e uma mensagem xenófoba que retoma as tradições mais sombrias da política norte-americana, tem claras possibilidades de conseguir a nomeação do Partido Republicano para as eleições presidenciais de novembro.

A vitória de Trump na terça-feira em Nevada, o quatro estado a votar no processo de primárias e caucus (assembleias eleitorais), não significa que ele será nomeado, muito menos que ganhará as presidenciais. Esta é uma corrida de resistência.

Os obstáculos são enormes: em um país diversificado e, caricaturas à parte, politicamente centrado, o Partido Republicano corre o risco de se transformar em uma força marginal se apresentar Trump. Mas, até agora, desmentiu todos os prognósticos sobre sua iminente queda. Até poucas semanas atrás a possibilidade de Trump suceder Obama era absurda; hoje continua sendo remota, mas não é mais inverossímil.

Como se chegou até aqui? Alguns apontam a inação dos dirigentes do Partido Republicano ou de seus líderes de opinião: ou ainda, como a maioria dos observadores, nunca acreditaram que Trump chegaria tão longe, ou não o levaram a sério. A ascensão do heterodoxo Trump — um candidato sem ideologia definida, com retórica ultradireitista em matéria de imigração e quase de esquerda quanto ao comércio internacional ou ao poder dos laboratórios farmacêuticos — representa uma OPA hostil ao Partido Republicano. Ao mesmo tempo, Trump é um espelho deformado e hiperbólico da visceralidade dos republicanos durante os mandatos de Obama.

Trump encontrou na imprensa um aliado valioso, que difunde cada uma de suas fanfarronadas e lhe dá de presente horas e horas na televisão. Nenhum candidato, de nenhum partido, contou com tanta cobertura televisiva como Trump, um showman capaz de prender a atenção do público durante um comício de 45 minutos. Sua personalidade — um vencedor, um multimilionário — é seu atrativo.

Obama devia unir os Estados Unidos, mas, quando sair da Casa Branca em janeiro, deixará um país política e racialmente polarizado. Como demonstra o bloqueio do Supremo Tribunal depois da morte do juiz Antonin Scalia, a paralisia em Washington continua. Os anos de Obama terão sido, também, os das tensões causadas pelo tratamento policial aos negros, do medo de setores da maioria branca de perder seu status em um país mais multicultural e da erosão contínua da classe média.

Trump — o anti-Obama: não só por suas ideias políticas, mas também por sua personalidade — é a expressão última do mal-estar.

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