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Uruguai se prepara para a despedida do presidente José Mujica

Cristina Kirchner não irá à posse de Tabaré Vázquez, mas Dilma Rousseff é esperada

José Mujica em frente a sua casa em Montevidéu, com sua cadela Manuela, no último dia 25.
José Mujica em frente a sua casa em Montevidéu, com sua cadela Manuela, no último dia 25.ANDRES STAPFF (REUTERS)

São dias muito agitados e solenes no Uruguai, com a iminente despedida de José Mujica e a posse do presidente eleito Tabaré Vázquez, no próximo domingo (1), vencedor da eleição de novembro. O primeiro a chegar a Montevidéu foi o presidente boliviano Evo Morales, que nas últimas horas do mandato de Mujica finaliza a assinatura de um acordo sobre a participação da Bolívia na construção de um megaporto uruguaio no Atlântico. Esse acordo tem acima de tudo um valor simbólico, porque o projeto é uma das grandes utopias cultivadas por Mujica durante seu mandato, uma obra em suspenso devido à falta de sintonia no Mercosul.

Nas primeiras horas de sua estada em Montevidéu, Morales visitou a sede da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi), onde seu país tem uma disputa aberta com o Chile em relação à livre circulação de caminhões em direção ao Pacífico. O líder boliviano não se encontrará no domingo com a presidenta do Chile, Michelle Bachelet, na cerimônia de mudança de comando, à qual irá seu vice-presidente. Mas Montevidéu não deixará por isso de ser receber um enxame diplomático, com a presença de delegações de alto nível, incluindo a da presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, amiga pessoal de Mujica, do vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e a do presidente de Cuba, Raúl Castro. Para ambos é momento de grandes mudanças em suas relações, e o atual ministro das Relações Exteriores do Uruguai, Luis Almagro, é favorito para assumir a secretaria geral da Organização dos Estados Americanos (OEA). Almagro declarou que seu principal objetivo será levar Cuba de volta à organização.

Apesar de seu estilo bonachão, 'Pepe Mujica' se manteve dentro de uma tradição da diplomacia uruguaia que combina neutralidade, afirmação dos interesses nacionais frente às grandes potências e defesa da integração americana

Em meio a medidas de segurança não usuais para o plácido país platino, os uruguaios sentem por estes dias o aumento de seu prestígio internacional.

“Está claro que há uma mensagem implícita desses presidentes de que aprovam o modelo uruguaio. O Uruguai se destaca pela estabilidade e pela racionalidade de sua política, quando a instabilidade da América Latina é o que mais preocupa o mundo. Mujica acrescentou seu toque pessoal a toda uma doutrina histórica, e nesse sentido fez uma grande contribuição”, diz Ramiro Podetti, historiador e professor de relações internacionais da Universidade de Montevidéu.

Apesar de seu estilo bonachão e de suas declarações polêmicas, o ex-guerrilheiro tupamaro se manteve dentro de uma tradição da diplomacia uruguaia que combina neutralidade, afirmação dos interesses nacionais frente às grandes potências e defesa da integração americana. Essa doutrina, que exige altas doses de pragmatismo, chegou a causar surpresa dentro da própria esquerda uruguaia, porque as relações de Mujica com os Estados Unidos e com a administração de Barack Obama foram irrepreensíveis, com gestos como o acordo para retirar presos de Guantánamo.

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Mas, até o fim, a política exterior terá sido terreno escorregadio para o presidente, que esta semana, frente à chegada iminente de Nicolás Maduro, enfrentou duras críticas da oposição por sua decisão de não condenar a prisão do prefeito de Caracas, Antonio Ledezma.

A partir da próxima segunda-feira, com Tabaré Vázquéz virá outro estilo, a continuidade em muitos temas e as mesmas dificuldades enfrentadas por Mujica, especialmente com a Argentina. A nota dissonante da passagem de poder no Uruguai foi dada pela ausência de Cristina Fernández de Kirchner. Segundo a imprensa local, o Governo uruguaio ficou descontente que a Argentina seja representada pelo vice-presidente Amado Boudou, processado por corrupção.

Mujica criticou nos últimos dias a falta de visão regional da Argentina, em clara alusão às medidas protecionistas de seu vizinho, que levaram o intercâmbio econômico ao seu nível mais baixo em décadas. Com Tabaré Vázquez essa situação não tem perspectivas de melhora, já que em seu primeiro mandato manteve um duro confronto com Buenos Aires em relação à instalação de uma fábrica num rio de ambos países.

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