Lembremos que tudo se move e que a escuridão um dia também vai embora
Os talibãs de todos os lugares um dia irão embora, como também foram os Senhores que roubavam o tempo no belo livro ‘Momo’, de Michael Ende. A resistência e a arte que transgride são eternas
Penso que todas as religiões em sua essência são belas. A relação dos humanos com o sagrado é tão antiga quanto somos sobre a Terra. Mas tão logo escapam da sua bela essência para controlar a vida privada de cada um, de um Estado inteiro, um país inteiro, esperemos domínio e matanças. Talvez ainda seja cedo para entendermos a onda monumental de extrema direita que assola tantos países hoje, com sua truculência, seu desejo destruidor de poder e pen...
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Penso que todas as religiões em sua essência são belas. A relação dos humanos com o sagrado é tão antiga quanto somos sobre a Terra. Mas tão logo escapam da sua bela essência para controlar a vida privada de cada um, de um Estado inteiro, um país inteiro, esperemos domínio e matanças. Talvez ainda seja cedo para entendermos a onda monumental de extrema direita que assola tantos países hoje, com sua truculência, seu desejo destruidor de poder e pensamento único, o aniquilamento do que não é igual.
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Sempre fomos um país cruel, com abismos sociais inadmissíveis. Não sei se chegamos ao ponto máximo, mas a situação que vivemos hoje é insuportável para milhões de brasileiros que já não podem comprar o básico. O lado sombrio da história da humanidade é estarrecedor. Guerras, conquistas, genocídios, escravidão, sangue. Este lado tenebroso parece um continuum.
Mas homens e mulheres fazem arte. Poesia, pinturas, música, dança. Essa luz é imensa. Também é um continuum. Transgridem. Resistem. Já que somos impotentes diante desta onda, que abrigamos dentro de nós, a dor das mulheres afegãs, o horror de todos os Talibãs de qualquer lugar, a dor dos que passam fome e vivem tão abaixo da linha da dignidade no Brasil, sob slogans mortíferos, precisamos, cada um em sua vida, acreditar que tudo se move e também eles um dia irão embora, como no belo livro Momo de Michael Ende, foram embora os Senhores que roubavam o tempo.
Precisamos colocar as horas para secar ao sol, porque são muitas as lágrimas. E não desistir de buscar cada dia o melhor que existe em nós. O melhor que existe em nós é simples. Saber que todos os que vivem neste planeta, bicho, planta, gente, são variações de uma mesma matéria, que por sua vez é constituída com a mesma matéria das estrelas. Que essa vida, em suas variações magníficas, é diversa e constitui a mais esplêndida sinfonia.
Que tudo o que é vivo sente. Gente, planta, bichos. A partir daí, por fazermos parte desta teia, podemos sentir em nós o que o outro sente. E todo ser humano, como disse nosso poeta maior, Carlos Drummond de Andrade, é um “estranho ímpar”. Acolheremos o outro na sua singularidade. Não destruiremos o outro.
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