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Governo Bolsonaro
Editoriais
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Com as urnas não se mexe

Bolsonaro solapa a democracia brasileira ao criar desconfiança sobre o sistema de votação

Urna eletrônica em seção de votação em Igarapé-Miri, no Pará, em novembro de 2020.
Urna eletrônica em seção de votação em Igarapé-Miri, no Pará, em novembro de 2020.TARSO SARRAF (AFP)

A menos de um ano e meio para as eleições presidenciais, Jair Bolsonaro embarcou em uma lesiva campanha de descrédito do atual sistema de votação com urnas eletrônicas. Adotada há 25 anos, a urna eletrônica se destaca, segundo as autoridades eleitorais, por sua eficácia, segurança e transparência, sem ter dado lugar a nenhum incidente relevante em todo esse tempo. Com uma extensão de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e algumas das zonas habitadas mais inacessíveis do mundo, o Brasil utiliza um sistema que, com razão, é admirado em muitos outros lugares.

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Mas, seguindo o rastro de Donald Trump, Bolsonaro decidiu, antecipando-se à campanha pela reeleição, lançar a sombra da fraude, ao semear constantes dúvidas sobre a confiabilidade do sistema de votação. Não é a primeira vez que faz isso. Na campanha em que foi eleito, em 2018, insistiu repetidamente que só aceitaria o resultado se vencesse as eleições. E, numa repetição daquela estratégia, vem há meses alertando para “problemas piores que nos EUA” depois das eleições de 2022 no Brasil. Agora, uma comissão do Congresso pode debater uma reforma constitucional que permita a cada eleitor receber uma cópia impressa do seu voto, possibilidade que até agora era recusada.

A realidade é que, desde a implementação do atual sistema de voto por urna eletrônica, não houve prova alguma de fraude nas eleições feitas no Brasil. Além disso, seis meses antes de cada eleição a Justiça Eleitoral divulga o código-fonte do sistema para que seja auditado por diversos órgãos oficiais (como o Ministério Público) e privados (como a OAB). A partir daí, os controles são contínuos. Ao longo de todo o processo, a urna jamais é conectada à internet, e durante uma semana programadores, hackers, policiais e partidos políticos são convidados a atacar o sistema para detectar possíveis vulnerabilidades. O resultado é que o sistema brasileiro não foi posto em xeque nem dentro nem fora do país, salvo em redutos conspiracionistas, até agora marginais, mas em cujas teses Bolsonaro se baseia, principalmente quanto à possibilidade de auditar a votação. A frase “voto impresso e auditável” se tornou um dos mantras dos partidários do presidente.

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É legítimo ponderar formas de melhorar o sistema, mas não erodir a confiança no sistema. Bolsonaro solapa a democracia brasileira ao lançar suspeitas sobre o ato mais importante da cidadania. Seu objetivo não é a transparência, e sim o caos. Seria conveniente que um seguidor tão fervoroso de Trump recordasse o lamentável resultado da estratégia para o ex-presidente.

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