Talibã reforça seu rápido avanço com a tomada de Kandahar, segunda maior cidade do país

EUA enviarão milhares de soldados para retirar quase todo o seu pessoal da embaixada em Cabul

Família afegã deslocada pelo conflito em Cabul, nesta quinta-feira. Em vídeo, imagens de Ghazni e afegãos fugindo do conflito.Paula Bronstein (GETTY)

O avanço do Talibã no Afeganistão parece incontrolável, e ainda mais rápido do que se esperava no primeiro semestre, quando começou a retirada definitiva das tropas internacionais que durante 20 anos contiveram a milícia fundamentalista. Nas últimas horas, o grupo assumiu o controle de Kandahar, no sul do Afeganistão, informam fontes do governo local à Reuters. Esta cidade, a segunda maior do Afeganistão (614.000 habitantes), é o lar espiritual do Talibã e grande feudo da etnia pashtun.

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A queda de Kandahar nesta sexta-feira acrescenta uma nova vitória às colhidas na véspera, uma das jornadas de maiores avanços dos insurgentes desde o início da sua atual ofensiva, em maio: na quinta-feira o Talibã tomou Ghazni, cidade-chave no acesso rodoviário a Cabul (que fica a apenas 150 quilômetros), e Herat, a terceira maior cidade do país. A milícia integralista também passou a dominar Qala-i-Naw, no noroeste do país, antiga base de tropas espanholas, e Lashkar Gah, na província de Helmand, que passou semanas sitiada.

Os Estados Unidos, temerosos de que os insurgentes se plantem às portas de Cabul em menos de 90 dias, anunciou o envio de 3.000 soldados para garantir a segurança enquanto retira a maior parte do pessoal da sua Embaixada na capital, onde apenas permanecerá uma equipe mínima, segundo o Departamento de Estado.

O porta-voz Ned Price salientou que as tarefas diplomáticas e consulares serão mantidas com o pessoal remanescente. O Pentágono informou ainda que mantém seus planos para concluir a retirada militar até 31 de agosto, apesar de em menos de uma semana os fundamentalistas terem assumido o controle de 12 capitais provinciais.

Os insurgentes se deslocam rapidamente, conquistando território quase diariamente à sua passagem, e neste momento controlam quase um terço das capitais provinciais – a última a cair foi Firozkoh, na província de Ghor. Apenas quatro grandes cidades, incluindo Cabul, continuam sob controle do Governo, e duas delas estão sendo fortemente assediadas pelo Talibã.

Em alguns casos, as conquistas foram fáceis, pela pouca resistência apresentada por líderes locais que dão como inevitável a vitória do Talibã. Em outros lugares, porém, ocorreram intensos combates contra as forças do Governo, que já não contam com o potente apoio aéreo antes assegurado pelas tropas estrangeiras. Atualmente há combates em 9 das 34 províncias afegãs, onde nas últimas 24 horas 217 combatentes talibãs morreram e 108 ficaram feridos, segundo o balanço diário do Ministério da Defesa do Afeganistão.

A tomada de Ghazni, no sudoeste, é vital porque amplia as chances de chegar a Cabul. Essa localidade é decisiva porque dá acesso à rodovia que liga a capital a Kandahar, o que significa que os fundamentalistas controlam os principais acessos estratégicos do norte e o sul depois da queda da cidade de Pul-e Khumri, há dois dias. “Ghazni caiu nesta manhã [de quinta-feira], e as forças de segurança se retiraram da maior parte da cidade”, anunciou Amanullah Kamrani, subchefe do Conselho Provincial local. O Talibã entrou na cidade provenientes de várias direções e tomou a maioria dos edifícios governamentais, como a casa do governador e a sede da polícia.

A conquista de Herat não é menor. A cidade é um dos principais centros comerciais e eixos do Afeganistão, ao compartilhar fronteira com o Irã e o Turcomenistão. Tropas espanholas passaram 14 anos na base de Herat, até 2015, quando encerraram sua missão. Qala-i-Naw também caiu nesta quinta nas mãos do Talibã, e “a maioria das forças de segurança se retirou para a base provincial do Exército”, segundo um deputado da província de Badghis no Parlamento nacional, que pediu anonimato, informa a Efe.

Chefe do Exército

O presidente afegão, Ashraf Ghani, fez na quarta-feira uma visita-relâmpago a Mazar-i-Sharif, a grande cidade do norte sitiada pelo Talibã, para tentar coordenar uma resposta que freie o avanço da guerrilha. Na mesma noite, um novo chefe das Forças Armadas, o general Hibatullah Alizia, assumiu o comando das tropas governamentais.

Cabul ainda não sofre uma ameaça direta do avanço do Talibã, mas a inesperada velocidade da ofensiva, que se acelerou nas últimas duas semanas, gera dúvidas sobre a capacidade do Governo afegão para controlar a situação, e até quando. Washington não só calcula que o Talibã poderia tomar Cabul em menos de três meses como também que a cidade pode ficar isolada bem antes, num prazo de 30 a 60 dias.

Apesar disso, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, ressaltou que não reverterá a retirada das tropas. O porta-voz do Departamento de Defesa dos EUA, John Kirby, limitou-se a reconhecer nesta quinta a “deterioração da situação”. Por outro lado, reiterou o apelo de Biden às autoridades locais para que confrontem a ofensiva do grupo fundamentalista. “Nós nos empenhamos em melhorar a competência e a capacidade [das forças de segurança] afegãs no campo [de batalha], mas em algum momento a competência e a capacidade devem ser questão dos próprios afegãos”, afirmou.

Enquanto isso, o conflito já está provocando um êxodo de pessoas que fogem dos combates e dos talibãs. A ofensiva deixou pelo menos 250.000 desabrigados desde seu início, em maio, e cerca de 80 % deles são mulheres crianças, alertou nesta sexta o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Esse êxodo se soma a 150.000 pessoas que já tiveram que deixar seus lares entre janeiro e maio, elevando a 3,3 milhões o total de deslocados internos no país centro-asiático, segundo as cifras fornecidas nesta sexta-feira pela porta-voz do ACNUR, Shabia Mantoo.

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