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Petrobras tem maior queda em 34 anos e guerra do petróleo ameaça afetar até caixa do Governo Federal

Disputa entre Arábia Saudita e Rússia gera efeito dominó no Brasil e deve afetar negativamente receitas da Petrobras, pré-sal, produção do etanol e a arrecadação do Estado. Gasolina deve baratear nos postos

Bolsa de Nova York nesta segunda-feira, 9 de março de 2020.
Bolsa de Nova York nesta segunda-feira, 9 de março de 2020.Richard Drew (AP)

O maior tombo do preço do barril do petróleo em quase 30 anos gerou, nesta segunda-feira, um dia de pânico nos mercados financeiros, já abalados pela epidemia do coronavírus, e perdas relevantes para as principais petroleiras e empresas do setor de energia no mundo. No Brasil, a Petrobras perdeu 91,1 bilhões de reais em valor de mercado, a maior queda desde 1986, segundo dados da Economática. As ações da petroleira recuaram quase 30%, cotadas a 16,05 reais. A forte queda na cotação do petróleo ocorreu após a Arábia Saudita ter sinalizado que elevará a produção para ganhar participação no mercado e que cortará seus preços oficiais de venda como resposta à recusa da Rússia de conter a produção por causa da queda da demanda provocada pelo vírus chinês. O movimento deve afetar o preço da gasolina, o lucro da Petrobras, a produção do etanol e a arrecadação, segundo especialistas. Ainda é cedo para estimar quanto tempo essa disputa irá se prolongar e quais serão todos os efeitos e estragos gerados pela nova guerra de preços. Para os próximos dias, a certeza é de forte especulação.

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O derretimento dos papéis da Petrobras aconteceu no mesmo dia em que foi necessário acionar o circuit breaker no Brasil, um mecanismo de segurança utilizado para interromper todas as operações da Bolsa. As negociações ficaram paralisadas por 30 minutos, mas não foi suficiente para acalmar os ânimos. A Bolsa despencou 12,17%, a 86.067 pontos no fechamento, a maior queda percentual diária do século. O dólar, que começou a semana em disparada acentuada contra o real, chegando a superar 4,79 reais, fechou o dia cotado 4,72 reais.

A decisão da Arábia Saudita pode afetar a geração de caixa da Petrobras, assim como seu plano de desinvestimentos e de quitação da dívida, que foi puxada para cima pela alta do dólar. A expectativa é que, com a queda do preço do petróleo, a companhia perca receitas. “O preço acima de 50 dólares estava ajudando na lucratividade e a abater a dívida”, explica Walter De Vitto, da consultoria Tendências. No ano passado, a Petrobras ganhou mais de 40 bilhões de reais, o que representou o maior lucro anual de sua história. A tendência é que agora haja menos interesse de investidores na exploração de petróleo. Há pelo menos três leilões de petróleo previstos para este ano.

Impacto no bolso dos brasileiros

No lado dos consumidores, a notícia é positiva. Com a queda do petróleo, a estatal deve promover uma redução no preço da gasolina, já que desde 2016 a companhia adotou uma política de paridade internacional para definir o preço da gasolina que vende à distribuidora. Caso os valores dos combustíveis sejam reduzidos mesmo nas bombas, a queda pode gerar outros efeitos negativos para a economia brasileira. Um dos impactos será na arrecadação dos Estados e municípios, que ganham receitas cobrando ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) nas bombas dos postos. Com o preço mais baixo, os impostos arrecadados também diminuem. Com o petróleo mais barato, União, Estados e municípios também vão arrecadar um valor menor de royalties. “Esse movimento agrava ainda mais o déficit de Estados como o do Rio de Janeiro, que criou há muito tempo uma ‘petrodependência’ irresponsável”, explica Ildo Sauer, vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da USP (IEE) e ex-diretor de Energia e Gás da Petrobras.

Até o próprio Orçamento federal deste ano é colocado em xeque com a mudança do valor do Brent do petróleo, já que ela afeta diretamente as receitas da União geradas pelos royalties. Ao ser enviado ao Congresso, a equipe econômica considerou o preço médio do barril de petróleo a 58,96 dólares. Uma realidade distante da cotação desta segunda-feira, de 31 dólares.

O presidente Jair Bolsonaro descartou nesta segunda-feira elevar a Cide, a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico que incide sobre os combustíveis, para aumentar a arrecadação federal aproveitando a queda abrupta na cotação do petróleo no mercado internacional. Ele disse que a tendência é que os preços dos combustíveis caiam nas refinarias. Bolsonaro também reiterou que a Petrobras vai manter sua política de preços sem interferências políticas. “Não existe possibilidade do Governo aumentar a Cide para manter os preços dos combustíveis”, disse Bolsonaro em publicação no Twitter.

A queda do petróleo prejudica também a exploração do pré-sal, já que, com a queda no valor do Brent, os investimentos para captar o óleo em águas profundas pode não dar o retorno financeiro suficiente aos investidores.

Sauer ressalta que o mercado de etanol também deve sofrer, já que o produto não deve conseguir concorrer com uma gasolina mais barata. Usinas devem reduzir a produção, o que pode aprofundar a crise no setor. “O preço mais barato do petróleo é tudo que as economias importadoras querem ter, porque barateia várias cadeias de produção. Hoje vemos as bolsas caindo por causa da epidemia do coronavírus e por todas as petroleiras que sairão perdendo”, diz.

A guerra de preços ganhou novas dimensões na noite de sábado, quando a petrolífera estatal saudita, Saudi Aramco, anunciou aumento da produção e redução de preços no barril, após a Rússia vetar um acordo da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+). O objetivo da medida seria forçar os russos a retomarem as negociações sobre cortes na produção, para fazer frente ao freio da demanda global diante da disseminação do coronavírus. A Rússia, por sua vez, afirmou nesta segunda-feira que tem condições de sustentar preços mais baixos por 10 anos. “Nos próximos dias haverá muita especulação. A principal questão é: isso é uma jogada da Arábia Saudita que ela irá bancar? Ou será uma ameaça apenas para ver se a Rússia voltará atrás?”, questiona De Vitto, da consultoria Tendências.

Em relatório divulgado nesta segunda, a Agência Internacional de Petróleo (AIE) estimou que o consumo de petróleo pode cair até 730 mil barris por dia este ano, o maior recuo desde 2009, quando os efeitos da crise financeira de 2008 ainda eram sentidos.


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