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Vacinados que se infectam transmitem menos o coronavírus às suas famílias

Um estudo com centenas de milhares de britânicos demonstra que a imunização funciona como o melhor corta-fogo para impedir a propagação da pandemia

50 milhões de vacinas já foram administradas no Reino Unido, a maioria em uma única dose. Na imagem, vacinação na abadia de Westminster.
50 milhões de vacinas já foram administradas no Reino Unido, a maioria em uma única dose. Na imagem, vacinação na abadia de Westminster.DPA vía Europa Press (Europa Press)

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As vacinas contra o coronavírus protegem não só o vacinado, mas também o resto da família. É a principal conclusão de um estudo baseado em um maciço cruzamento de dados de lares britânicos. O trabalho mostra que os poucos que se infectaram depois de terem sido vacinados reduziam pela metade a probabilidade de propagar a covid-19 em sua casa. A investigação, que usou estatísticas de mais de 300.000 unidades familiares e quase 1,5 milhão de pessoas, é a maior demonstração de que a vacina é o melhor corta-fogo contra a propagação da covid-19.

Aproveitando que o Reino Unido está muito adiantado com a vacinação (34 milhões já com a primeira dose, ou 53% de seus quase 67 milhões de habitantes), pesquisadores da Agência de Saúde Pública do Reino Unido (PHE, na sigla em inglês) cruzaram a informação de três bases de dados. Por um lado, as dos positivos confirmados por um exame PCR entre janeiro e março. Pelo outro, a de vacinados com os fármacos da Pfizer-BioNTech ou AstraZeneca-Oxford. E, por último, agruparam todos os que viviam sob o mesmo teto usando seu número de filiação à saúde pública e o UPRN, um registro que identifica cada lar existente no Reino Unido.

Os cientistas do PHE queriam ver o resultado da vacinação dentro dos lares, já que as moradias são, provavelmente, o lugar onde há maior risco de contágio, porque são espaços fechados onde se convive proximamente durante muito tempo e sem máscara. A eficácia das vacinas está mais do que demonstrada, mas o que interessava era comprovar se, além de proteger o vacinado, também protegia quem o cerca. Para isso, usaram uma amostra com 365.447 positivos considerados “caso índice”, ou seja, o primeiro caso produzido em cada casa entre janeiro e março. Estes conviviam com outro milhão de pessoas. Viram que, nos 14 dias seguintes ao exame positivo, haviam ocorrido outras 102.662 infecções nessas moradias, os chamados casos secundários. É impossível saber se cada um deles se contagiou do primeiro, mas, dadas as limitações à mobilidade e o avanço da vacinação, é o mais provável. Isso gera um índice de contágio dentro do lar de aproximadamente um terço.

O que aconteceu com os vacinados?

Daqueles 365.447 lares com um caso índice, 24.217 deram positivo poucos dias depois de serem vacinados. A cifra baixa para apenas 4.107 infectados, ou 1,12% do total, quando se conta a partir de 21 dias depois da vacina, o tempo estimado para desenvolver a imunidade. É preciso levar em conta que o Reino Unido só está administrando uma dose, o que poderia reduzir a proteção. Por outro lado, nenhum dos casos necessitou de hospitalização. Assim, tudo indica que as vacinas protegem quem a recebe.

O próximo passo dos pesquisadores foi ver se também protegiam seu círculo familiar. Para isso, compararam os lares com um primeiro caso vacinado, mas infectado, com aqueles onde havia um contagiado, mas ninguém havia se vacinado. Nas casas sem vacinados, houve 10,1% de conviventes que se contagiaram nos 14 dias seguintes ao caso índice (96.898 de um total de 960.765 contatos). Mas, nas moradias onde o caso índice já tinha sido imunizado, os segundos casos se reduziram para 6,06% (567 novos positivos de 9.363 contatos). Ou seja, as vacinas reduzem em mais de 40% a probabilidade de que a covid-19 se propague dentro de casa. A percentagem subia para 49% se a vacina fosse a da AstraZeneca e Oxford.

A médica Mary Ramsay, responsável por imunização do PHE, disse em nota sobre estes resultados que “as vacinas não só reduzem a gravidade da doença e evitam centenas de mortes por dia como também, agora, vemos que têm um impacto adicional reduzindo o risco de passar a covid-19 para os outros”.

Esse impacto na propagação do coronavírus se confirma com outro dado revelado no estudo: quanto mais tempo transcorria entre o momento da vacinação e do contágio do caso índice (o primeiro da cadeia), menor era a probabilidade de contagiar um familiar. Só com menos de 10 dias de intervalo a chance de transmitir a covid-19 dentro de casa se equiparava à de quem não havia sido vacinado.

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África González Fernández, catedrática de Imunologia da Universidade de Vigo, destaca que o estudo foi feito com a maioria das pessoas vacinadas apenas com uma dose. “É previsível que com duas doses a diminuição da transmissão do vírus seja ainda maior, e também que haja um menor número de pessoas infectadas de forma secundária”, diz González. É uma possibilidade já apontada pelos autores do trabalho, que recordam que no Reino Unido apenas 7% dos vacinados receberam as duas injeções recomendadas para os imunizantes que estão sendo usados.

Até agora, pouco se sabia sobre como as vacinas afetam a transmissão da covid-19. Os ensaios clínicos, por seu desenho, mediam apenas a eficácia nos vacinados, e não se estes deixavam de ser contagiosos. Há algumas pesquisas em ambientes hospitalares, uma na Escócia e outra em Israel, que mostravam uma redução significativa dos contágios secundários depois da vacinação. Mas nenhuma em um ambiente como o lar, e menos ainda com tantas casas analisadas.

Para Àngela Domínguez, coordenadora do grupo de trabalho sobre vacinação da Sociedade Espanhola de Epidemiologia (SEE), “o lar, pela profundidade e frequência das relações de convivência, é um entorno onde os contágios são muito habituais”. “Por outros estudos, sabemos que a carga viral dos vacinados é mais baixa que a dos não vacinados, o que condiciona a possibilidade de contagiar”, acrescenta Domínguez.

Peter English, ex-diretor do comitê de saúde pública da Associação Médica Britânica, destaca a relevância destes resultados. “Somam-se aos nossos argumentos para esperar que as vacinas realmente contribuam para a imunidade coletiva. Acumulavam-se as evidências de que a vacinação evitaria que as pessoas se infectassem (e, se não estiverem infectadas, não podem transmitir a infecção)”, afirma. E acrescenta: “Este estudo mostra que inclusive se as pessoas vacinadas se infectarem é muito menos provável que sejam contagiosas e transmitam a infecção a outras pessoas”.

*O estudo, sem revisão por pares, pode ser lido aqui (PDF)

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