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Por que a trombose após as vacinas da AstraZeneca e Janssen afeta mais as mulheres

Vários fatores podem explicar por que a maioria dos coágulos sanguíneos ocorre entre mulheres com menos de 60 anos

Enfermeira prepara uma dose da vacina AstraZeneca em Nápoles (Itália), nesta terça-feira.
Enfermeira prepara uma dose da vacina AstraZeneca em Nápoles (Itália), nesta terça-feira.CIRO FUSCO (EFE)

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Autoridades dos EUA recomendam interrupção da aplicação da vacina Janssen contra a covid-19 após casos de trombose

A incidência de coágulos sanguíneos no cérebro e outros órgãos após a administração das vacinas da AstraZeneca e da Janssen parece ser muito maior entre mulheres com idade inferior a 60 anos. Atualmente os especialistas não sabem exatamente por que isto acontece, embora haja vários fatores que poderiam explicar parte do fenômeno.

São mulheres todas as seis pacientes que tiveram trombose após receber a vacina da Janssen nos EUA. Depois de conhecer esses casos, as autoridades farmacológicas dos EUA recomendaram interromper a vacinação com esta injeção. A empresa Johnson & Johnson, que fabrica a vacina, suspendeu sua distribuição na Europa.

Com a vacina da AstraZeneca, até 4 de março a Agência Europeia do Medicamento (EMA) havia detectado 222 casos de trombose entre 35 milhões de vacinados, mais ou menos um caso a cada 175.000 imunizados, uma incidência muito baixa. Também neste caso, a maioria dos afetados é de mulheres relativamente jovens. Na Espanha estão sendo estudados 12 casos entre mais de 2,5 milhões de vacinados com a AstraZeneca, segundo dados da sexta-feira passada. Some-se a eles o de um homem da região de Castela-La Mancha cuja morte após se vacinar está sendo investigada.

Duas equipes médicas da Alemanha e da Áustria acabam de esclarecer como ocorrem os coágulos nos vacinados com a AstraZeneca. Em todos os casos, se trata de uma reação em que o sistema imunológico se volta contra o próprio paciente e gera anticorpos que se unem seletivamente a uma proteína existente na superfície das plaquetas. Estas células sanguíneas são as responsáveis pela coagulação do sangue. Quando os anticorpos se unem a essa proteína, conhecida como fator plaquetário 4, as plaquetas se ativam e começam a se aglutinar, produzindo coágulos. Dos 11 pacientes analisados na Alemanha e Áustria, nove eram mulheres. A maioria apresentava coágulos em vasos sanguíneos do cérebro ou abdome. Tanto na Alemanha como na Áustria, os dois primeiros casos foram registrados em duas profissionais sanitárias, de 49 e de 37 anos, respectivamente.

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Tromboses desse tipo se caracterizam por uma redução brusca das plaquetas. O que se observou depois da vacinação se parece muito com uma reação também pouco frequente, já vista entre pacientes tratados com heparina, um anticoagulante.

Por enquanto não se sabe o que causa a reação autoimune depois da vacinação. Especula-se que tenha a ver com o veículo usado nas vacinas da AstraZeneca e Janssen: dois tipos de adenovírus. A primeira emprega um adenovírus desativado do chimpanzé, e a segunda um humano, também desabilitado.

Há pelo menos outras duas vacinas aprovadas que também usam adenovírus: a russa Sputnik e a chinesa CanSino. Por enquanto não há relatos de que causem trombose, mas se trata também de duas injeções de países sem transparência sobre os dados de vacinação. “Hoje em dia não temos acesso à informação sobre efeitos adversos destas duas vacinas”, explica Federico Martinón-Torres, chefe de pediatria do Hospital Clínico Universitário de Santiago de Compostela (Espanha) e membro do comitê assessor de vacinas da Organização Mundial da Saúde.

Ainda não se sabe por que a trombose afeta mais as mulheres jovens, mas há fatores que podem ajudar a explicar. Em primeiro lugar, as mulheres sofrem mais doenças autoimunes que os homens, e, quanto mais jovens, mais ativos são seus sistemas imunológicos e mais suscetíveis podem ser a uma complicação como esta, explica Rodrigo Rial, porta-voz da Sociedade Espanhola de Cirurgia Vascular. Este médico acrescenta outro fator de risco que só afeta algumas mulheres jovens: a pílula anticoncepcional aumenta ligeiramente o risco de trombose. Embora baixo, o risco associado à pílula é muitíssimo maior que o da vacinação. Aproximadamente uma em cada 1.000 mulheres que tomam o anticoncepcional sofrem um coágulo deste tipo, enquanto o risco entre vacinados é de um entre 175.000, segundo os últimos dados da Agência Europeia do Medicamento.

Em condições normais, a trombose de seios cerebrais, o tipo mais comum observado nos vacinados com a AstraZeneca e Janssen, é muito mais frequente em mulheres de aproximadamente 30 anos, entre as quais são registrados três de cada quatro casos, explica Martinón-Torres.

A estes fatores se soma o viés de quem está recebendo a vacina da AstraZeneca, em geral gente com menos de 60 anos, por isso é possível que estejam sendo observados mais casos entre mulheres.

Um dos problemas é que não há nenhum marcador conhecido que possa advertir sobre quem sofrerá este efeito adverso muito raro. O que existe é um tratamento possível, já usado para os pacientes que reagem mal à heparina: deixar de oferecer esse anticoagulante e administrar gamaglobulinas, um tipo de proteína sanguínea.

Todos os especialistas consultados concordam que a aparição muito pouco frequente destes coágulos não deveria afetar o processo de vacinação. Os riscos de sofrer essas complicações são muito menores que os benefícios de se vacinar, observam eles.

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