PT celebra eleição fraudulenta de Ortega na Nicarágua, mas volta atrás e tira nota do ar
Partido apoia pleito sem opositores ou observadores internacionais, constrangendo o ex-presidente Lula no momento em que articula volta ao Palácio do Planalto
Uma “grande manifestação popular e democrática”, é como os dirigentes do PT definiram as eleições que confirmaram a permanência de Daniel Ortega no poder da Nicarágua. O pleito fraudulento, que já tinha um vencedor definido antes mesmo do início das votações, ocorreu no último domingo, quando os rivais de Ortega estavam todos presos ou exilados. Ainda assim, o partido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se apresenta como pleiteante à presidência em 2022, encarou o resultado como “o apoio da população a um projeto político que tem como principal objetivo a construção de um país socialmente justo e igualitário”. A nota, publicada no site da legenda na segunda-feira, foi amplamente criticada, tanto por opositores quanto por apoiadores do partido. Nesta quarta-feira, não estava mais no ar.
Enquanto o PT celebrava as eleições fraudulentas na Nicarágua, quatro ex-presidentes, incluindo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), assinavam uma carta exigindo que a região ignore o resultado do pleito. Diante das críticas, a presidenta nacional da legenda, a deputada Gleisi Hoffmann, usou sua conta no Twitter para colocar panos quentes, afirmando que a nota não havia sido submetida à direção partidária. “Posição do PT em relação qualquer país é de defesa da autodeterminação dos povos, contra interferência externa e respeito à democracia, por parte de governo e oposição”, escreveu ela. Depois, a legenda publicou uma nova nota no site do partido, dizendo que Gleisi “esclarece posição do PT sobre eleição na Nicarágua” e incluindo seu tuíte.
Em um momento em que Lula se apresenta como presidenciável e anuncia uma agenda de encontros internacionais com lideranças europeias, o gesto do PT vai na contramão dessas costuras democráticas. Em agosto, Lula aconselhou Ortega a “não abrir mão da democracia”. “Se eu pudesse dar um conselho ao Daniel Ortega, daria a ele e a qualquer outro presidente. Não abra mão da democracia. Não deixe de defender a liberdade de imprensa, de comunicação, de expressão, porque isso é o que favorece a democracia”, disse o petista em uma entrevista ao Canal Onze, do México.
Mas as eleições deste domingo na Nicarágua ocorreram em um contexto antidemocrático, a despeito dos conselhos de Lula —que não tocou mais no assunto. Ortega, que tem o apoio de somente 19% da população, segundo pesquisas sérias, teve 75% de apoio no pleito, de acordo com os resultados iniciais oficiais, que projetaram também uma participação de 65% da população. Os números foram considerados uma farsa pela oposição e pela comunidade internacional. A organização Urnas Abiertas informou que, de acordo com seus 1.450 observadores em todo o país, a abstenção foi em média de 81,5%.
Esta não é a primeira vez que o PT sofre críticas por apoiar uma eleição questionada. No fim do ano passado, o partido lançou uma nota saudando as eleições legislativas que ocorreram na Venezuela quase sem nenhuma oposição, sem o reconhecimento dos Estados Unidos e da Europa e com grande abstenção. “As eleições são a resposta democrática a esta política de bloqueio, que visa a atingir o governo constitucional do país, mas tem como grande vítima o povo venezuelano, gravemente prejudicado no acesso a alimentos, medicamentos e outros direitos”, afirmava a nota.
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