O lado oculto de 12 grandes ícones de Hollywood
Mostraram-se belos e poderosos na tela, mas escondiam vidas amargas fora dela
O ator John Cusack assim definiu Hollywood no The Guardian: “Um puteiro onde as pessoas enlouquecem”. A vida de seus astros daria para melodramas trágicos, comédias de humor negro e thrillers macabros tão delirantes que nenhum roteirista se atreveria a escrevê-los. Alguns atores chegaram a Hollywood fugindo de infâncias truculentas; outros vinham de lares felizes, mas a indústria, a ambição e o vício os corromperam. Mas nenhum deles teve vidas tranquilas ou completamente felizes, com uma exceção: Paul Newman. Teria sido ótimo para estas 12 estrelas da era de ouro de Hollywood se Newman tivesse lhes dado alguns conselhos.
Errol Flynn: seus desmandos eram todos acobertados
Entrou para a história como... Errol Flynn (Austrália, 1909-Canadá, 1959) foi o primeiro aventureiro do cinema (Capitão Blood, As Aventuras de Robin Hood, O Gosto Amargo da Glória...) e um galã hedonista que passava as noites em festas onde dezenas de mulheres o assediavam. Sua imagem pública ficou resumida àquela lenda urbana de que era capaz de tocar piano com seu pênis: virilidade, descaramento e rumores.
Seu lado oculto. Flynn percebeu que não precisa refletir sobre seus atos, porque o estúdio se encarregaria de ocultá-los: quando deu um soco na sua mulher, a Warner afirmou que eles tinham sofrido um acidente de carro para evitar atropelar um gatinho. Quando duas adolescentes o acusaram de estupro, o advogado de Flynn baseou sua defesa em três premissas: “O que esperavam ao deitar numa cama com Flynn rondando por aí?”, “Mesmo que não quisessem, era impossível que não tenham gostado”, e “É tudo mentira, estão inventando”. O júri inocentou o ator, que continuou sendo a maior estrela de Hollywood até que o vício em heroína o consumiu, e ele morreu aos 50 anos.
Cary Grant: traumatizado pelo fantasma da mãe
Entrou para a história como... O único homem que é preciso observar para ser elegante, seja fazendo piadas, namorando Katharine Hepburn ou fugindo de um avião. George Clooney forjou uma carreira inteira à base de imitá-lo.
Seu lado oculto. Cary Grant (Inglaterra, 1904-EUA, 1986) jamais superou o trauma de ser abandonado aos 11 anos por sua mãe, que desapareceu sem dar explicações. Quando aos 31 descobriu que continuava viva em um manicômio, onde seu marido a internara para poder formar uma nova família, embarcou em mais de 100 sessões com LSD para tentar administrar sua dor. Segundo Grant, este tratamento o ajudou a compreender que sabotava suas relações para tentar “matar a mãe”, e por isso se casou cinco vezes. A última união lhe deu uma filha, Jennifer, e o ator se aposentou do cinema aos 62 anos para se dedicar a cuidar dela. Foi a etapa mais feliz de sua vida.
Ingrid Bergman: o Vaticano contra ela
Entrou para a história como... Uma das atrizes mais admiradas, respeitadas e lucrativas da Hollywood clássica. Quando protagonizou Por Quem os Sinos Dobram, os conventos viram aumentar o número de candidatas a noviças.
Seu lado oculto. O primeiro marido de Ingrid Bergman (Estocolmo, 1915-Londres, 1982), Petter Lindström, acusou-a de ser alcoólatra, promíscua e obcecada com sua carreira. A fuga de Bergman para a Itália para iniciar um romance com o cineasta Roberto Rossellini escandalizou o Vaticano, o Senado norte-americano e a imprensa: tinha abandonado sua filha (a quem veria só uma vez durante os oito anos seguintes), seu país e sua indústria por um romance. Quando retornou arrependida, após se divorciar de Rossellini, Hollywood a celebrou como a uma filha pródiga, dando-lhe o segundo de seus três Oscars, por Anastasia.
Kirk Douglas: o persistente rumor
Entrou para a história como... Primeiro ator de caráter a conseguir ser uma estrela comercial, o único que apoiou o roteirista Dalton Trumbo quando o senador McCarthy o colocou na lista negra por afinidades comunistas e, aos 102 anos, a última lenda da Hollywood clássica que permanece viva, junto a Olivia de Havilland.
Seu lado oculto. Kirk Douglas (Nova York, 1916) há quase cinco décadas arrasta o rumor de que trancou a jovem Natalie Wood em um quarto de hotel durante um casting, agrediu-a, humilhou-a e a estuprou várias vezes. Quando Wood chegou em casa, sua mãe a repreendeu “por ter irritado” o famoso ator e a levou discretamente para o hospital. Os estúdios ocultaram o caso, mas Wood nunca se recuperou emocional nem psicologicamente do ataque cometido por “um poderoso ator” que, segundo diversas reportagens, como a publicada no site Gawker, “todo mundo sabe que se trata de Kirk Douglas”.
Doris Day: fugiu com seus cães, e só eles lhe importavam
Entrou para a história como... O emblema do que uma mulher norte-americana dos anos cinquenta deveria ser (decente, encantadora e submissa) em dúzias de ingênuas comédias românticas. Ainda ostenta o recorde de ser a estrela de maior sucesso nas bilheterias por quatro anos consecutivos.
Seu lado oculto. Doris Day (Ohio, 1922-Califórnia, 2019) odiava ser atriz, porque só queria ser um dona de casa perfeita, como as que interpretava em seus filmes. Aos 16 anos se casou com um trombonista que a maltratava diariamente (ela gabava-se dos hematomas, afirmando que eram resultado do ardor sexual dele) e com quem teve um filho. Aos 24, tentou abandonar sua carreira para se dedicar ao segundo marido, e aos 27 seu terceiro marido/empresário a transformou em um ícone do otimismo do pós-guerra para em seguida torrar todo o seu dinheiro. Sua vida privada (era bebedora e promíscua) jamais veio a público, mas a insatisfação de Day a levou a passar seus últimos anos reclusa com seus cães, em quem confiava mais do que em qualquer pessoa. Morreu em 2019, aos 97 anos.
Judy Garland: a estrela que não queria viver
Entrou para a história como... Judy Garland (Minnesota, 1922-Londres, 1969) foi o símbolo definitivo de tudo o que havia de belo e horripilante em Hollywood. Aos 17 anos, protagonizou O Mágico de Oz, inscreveu Over The Rainbow no imaginário coletivo como a canção que sempre existiu e acabou rodando Nasce uma Estrela na qualidade de glória do passado. E tinha só 32 anos.
Seu lado oculto. A Metro-Goldwyn-Meyer lhe impôs uma dieta, a partir dos 13 anos, à base de sopa, alface e 80 cigarros por dia. Davam-lhe anfetaminas para trabalhar e barbitúricos para dormir. Quando começou a se desenvolver fisicamente, os executivos se referiam a ela na sua frente como “uma porca com trancinhas”, “uma pequena corcunda” ou “um monstro que dança”. Aos 25 anos, tentou o suicídio numa clínica psiquiátrica, foi viciada em soníferos, em álcool e em morfina e, depois de sua segunda tentativa de suicídio, cortando a garganta, a própria Metro-Goldwyn-Meyer que a havia viciado em todas essas substâncias a demitiu. Morreu aos 47, de overdose de medicamentos. Nessa época atuava em Londres a 100 libras por noite, uma decadência que retrata Judy, a volta ao cinema de Renée Zellweger, que estreia em 5 de dezembro.
Anthony Perkins: viveu no armário e morreu de AIDS
Entrou para a história como... Norman Bates, o psicopata no qual se inspirariam muitos dos assassinos de cinema que vieram depois. Anthony Perkins (Nova York, 1932-Los Angeles, 1992) entrou no motel de Psicose como um ator de prestígio e um cantor de sucesso, e saiu profundamente marcado pelo personagem: estava condenado a que todos só vissem nele Norman Bates. O ator exigia por contrato que durante as filmagens ninguém lhe mencionasse Psicose.
Seu lado oculto. Perkins se parecia mais com Norman Bates do que gostaria. O desmesurado afeto por sua mãe, com “certas conotações sexuais”, segundo o próprio confessou, o levou a sentir ciúmes de seu próprio pai quando criança e a desejar sua morte. Na época do falecimento deste, quando Anthony tinha só cinco anos, o menino ficou traumatizado e convencido de que era o culpado. Alfred Hitchcock (diretor de Psicose) sabia perfeitamente o que estava fazendo quando lhe deu o papel de Norman Bates. Perkins passou a vida toda dentro do armário e se submeteu a terapias de eletrochoque para "curar" sua homossexualidade, deitou-se pela primeira vez com uma mulher aos 39 anos e acabou se casando com sua melhor amiga do colégio. Depois de sua morte por AIDS, em 1992 (aos 60 anos), seus dois filhos publicaram um comunicado do ator em que ele dizia como essa doença, supostamente um castigo de Deus, o tinha feito conhecer o amor, a generosidade e a humanidade ao final de sua vida.
Rita Hayworth: seu calvário começou ao ser abusada pelo pai
Entrou para a história como... Gilda (sua personagem no filme homônimo de 1946), o mito erótico oficial dos anos quarenta, a tal ponto que seu rosto estava estampado nas bombas que o Exército norte-americano lançava. “Os homens vão para a cama com Gilda, mas acordam comigo”, lamentou no final da vida.
Seu lado oculto. Rita Hayworth (Nova York, 1918-1987) vivia aterrorizada pela atenção midiática, por seu complexo de inferioridade e pela certeza de que os homens só estavam interessados em seu corpo. Seu pai (um bailarino sevilhano chamado Eduardo Cansino) a levou em turnê aos 12 anos, apresentando-a como sua esposa e obrigando-a a manter relações sexuais com ele. Casou-se cinco vezes, fracassando em seu sonho de construir um lar tradicional longe de Hollywood e consumida pela ansiedade, pelos ataques de pânico e pelo alcoolismo. Quando viajou a Madri, já doente de Alzheimer sem diagnosticar, José María Íñigo optou por abreviar a entrevista ao sentir pena do estado mental da atriz. Hayworth dizia que só foi feliz durante seu conturbado casamento com Orson Welles, o único homem na indústria que a valorizou como atriz. Como resultado do que disse Hayworth, Welles afirmou: “Se aquilo foi felicidade para ela, não quero nem imaginar como foi o resto de sua vida”.
Gene Tierney: "a mulher mais bela do mundo" que acabou num manicômio
Entrou para a história como... Uma mulher tão bonita que a maquiagem atrapalhava sua beleza, e acabou rodando com a cara lavada. Todos os personagens de Laura (filme que protagonizou em 1944) estavam obcecados por ela, e isso que durante meio filme só aparecia em um quadro pendurado na parede; quando afinal irrompia na história, conseguia que o público compreendesse essa fascinação coletiva por ela. Apelidaram-na de a mulher mais bela do mundo.
Seu lado oculto. Gene Tierney (Nova York, 1920-Texas, 1991) não se deixou dominar pelo sistema de estúdios de Hollywood: para seu primeiro filme recebeu cinco vezes mais que o resto das atrizes estreantes e exigiu que, se a Fox não lhe desse trabalho em três dias, seu contrato seria rescindido. Durante uma visita aos soldados na Segunda Guerra Mundial, algum marine doente de rubéola violou a quarentena e se aproximou para cumprimentar Tierney, sua atriz favorita. Como resultado, Gene deu à luz a uma menina com deficiência mental que passou a vida toda numa instituição, sem amadurecer além dos dois anos. Afogada pela culpa, Tierney passou longas temporadas em clínicas psiquiátricas, por algo que só hoje se identifica como depressão clínica. Recebeu terapias de eletrochoque , sofreu paranoias e alucinações por toda a sua vida e tentou suicidar-se duas vezes. Foi a primeira ganhadora do prêmio Donostia do Festival de San Sebastián de 1986, cinco anos antes de sua morte.
Steve McQueen: definia-se como um "porco machista"
Entrou para a história como... O ícone que serve de ponte entre John Wayne e Tom Cruise: nele confluíam, de forma natural, a virilidade rude do pós-guerra e a masculinidade sofisticada dos yuppies. Bullitt, Os Implacáveis e Crown, o Magnífico fizeram dele o sujeito mais cool de toda Hollywood.
Seu lado oculto. Steve McQueen (Indiana, 1930-Cidade do México, 1980) reconhecia ser “um porco machista”. Batia na primeira esposa, Neile Adams (a quem chegou a mirar com uma pistola em um ataque de ciúmes), e proibiu a segunda, Ali McGraw, de trabalhar durante os cinco anos que estiveram juntos, para que se dedicasse a lhe servir carne com batatas todas as noites às 18h em ponto e o deixasse jantar vendo a televisão em silêncio. Gostava de beber, dirigir rápido e se drogar (cocaína, peyote, LSD e nitrito de amila para suas maratonas sexuais), mas odiava compartilhar filme com outros atores: exigiu que Paul Newman tivesse exatamente o mesmo número de palavras que ele em Inferno na Torre, e que a última frase do filme fosse dele. Essa insegurança paranoica vinha pelo abandono de sua mãe, uma prostituta adolescente que o acolheu de novo anos depois. Mas as surras de seu padrasto levaram McQueen a dormir na rua aos nove anos. “Do único que Steve McQueen sempre esteve seguro”, dizia seu amigo Robert Vaugh, “é de seu atrativo para as mulheres”.
Lana Turner: o obscuro assassinato de seu namorado mafioso
Entrou para a história como... A femme fatale de O Destino Bate à Sua Porte, a sofredora de Imitação da Vida e uma das celebridades favoritas da imprensa graças à sua sempre agitada vida sentimental. “Eu queria ter um marido e sete filhos”, brincou certa vez, “mas acabei tendo uma filha e sete maridos”.
Seu lado oculto. Seu namorado, o mafioso Johnny Stompanato, foi assassinado por Cheryl Crane, a filha de Lana Turner (Idaho, 1921- Los Angeles, 1995). Como tinha 14 anos, a menina não teve que depor e foi absolvida por homicídio em legítima defesa. Entretanto, vários biógrafos de Lana Turner afirmam que foi a atriz quem apunhalou seu namorado em um ataque de ciúmes após encontrá-la na cama com sua filha. Essa teoria explicaria que a cena do crime não tivesse restos de sangue nem rastros, porque, supostamente, foi reordenada pelo advogado da atriz antes de chamar a polícia.
Joan Crawford: acabou enclausurada e sozinha
Entrou para a história como... Como uma das estrelas mais populares, glamourosas e magnéticas dos anos trinta e quarenta. O legado artístico de Joan Crawford (Texas, 1904-Nova York, 1977), entretanto, ficou frequentemente eclipsado por seu caráter e pelos abusos que perpetrou contra seus filhos.
Seu lado oculto. Crawford considerava que as relações sexuais que manteve com seu padrasto aos 11 anos eram afetuosas e consensuais, e não um estupro, e sempre se mostrou grata a Hollywood por ter lhe dado tudo o que tinha. Por pertencer à primeira geração de estrelas, Crawford não podia imaginar que, depois dos 50 anos, Hollywood a relegaria a uma carreira de terror de série B e a viver enclausurada durante os últimos anos de vida. Sua filha Christina, raivosa por não ter recebido nada na herança, vingou-se publicando um livro que mostrava Joan Crawford como uma desequilibrada violenta e uma paródia grotesca das divas de Hollywood. O filme Mamãezinha Querida turvou para sempre a lembrança de Crawford para o público. Pelo menos Joan não viveu para sofrer essa ridicularização.
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