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O 5G será 10 vezes mais rápido, mas ameaça a previsão do tempo

Nova geração da telefonia celular tem efeitos colaterais, como interferir nos satélites de observação. Também aumenta o consumo de energia e as emissões de poluentes e reduz banda para TV digital

Raúl Limón
Vapor de água em camadas altas registrado pelo satélite GOES.
Vapor de água em camadas altas registrado pelo satélite GOES.NASA/NOAA GOES Proyecto Dennis Chesters
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O 5G, que começou a ser implantado nos Estados Unidos e na Coreia do Sul, mas no Brasil não deve chegar antes de 2022, promete um mundo novo: melhores conexões, com transferência de dados 10 vezes mais rápidas que as atuais, e resposta em questão de milissegundos entre a ordem e sua execução. Não é uma melhora só para os usos pessoais: a robotização, as cidades inteligentes, a internet das coisas, a condução autônoma de veículos e as cirurgias remotas dependem da sua implantação. As aplicações são enormes. Mas, como em todos os avanços, sempre há vítimas colaterais. Uma pesquisa publicada pela Nature alerta para a influência dessa tecnologia sobre os satélites que monitoram o clima. Além disso, o consumo elétrico e as decorrentes emissões poluentes crescerão.

O tempo

Os satélites que monitoram a concentração de vapor de água na atmosfera terrestre são cruciais para elaborar as previsões meteorológicas, e eles serão afetados pelas interferências causadas por aparelhos que operem com 5G. Os Estados Unidos começaram a atribuir a esse sistema as faixas entre os 24,25 e os 25,25 gigaherz. Os dispositivos que utilizarem a banda mais próxima dos 23,8 gigaherz, a mesma usada pelos medidores de vapor, causarão interferências que impedirão a detecção das concentrações e a elaboração confiável de prognósticos meteorológicos, aponta a pesquisa publicada na Nature.

A Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês) e a NASA pediram à Comissão Federal de Comunicações (FCC) que colabore para evitar o problema, que não afetará só os EUA, mas todas as agências meteorológicas que se alimentam desses dados. O Centro Europeu para Previsões Meteorológicas de Médio Prazo, com sede no Reino Unido, se alinhou aos seus colegas norte-americanos na reivindicação de acordos que preservem as frequências de seus equipamentos.

Mapa do vapor de água detectado pelo satélite GOES.
Mapa do vapor de água detectado pelo satélite GOES.NOAA GOES

O diretor do Observatório 5G da Espanha, Federico Ruiz, explica que as interferências podem ocorrer nos satélites ou radares com frequências incluídas na banda a ser utilizada pela nova geração de telefonia, mas garante que isso é apenas questão de reordenação. “É como urbanizar de novo um território que já está cheio de casas. Se for preciso fazer uma rua, pode ser que afete o jardim de uma delas”, compara.

Para resolver conflitos como este, os reguladores mundiais se reunirão em outubro em Sharm el Sheikh (Egito) a fim de definir as frequências em que as companhias devem operar e os níveis aceitáveis de interferências.

Consumo elétrico e poluição

“Baixar uma série equivale ao consumo de uma antiga lâmpada de 60 watts acesa durante 20 horas”, alerta Ramón Rodríguez, diretor associado de Sustentabilidade e Energia na Arup Espanha, uma empresa de engenharia e consultoria de abrangência mundial que trabalha em projetos de sustentabilidade. Este maior consumo decorrente do enorme uso previsto das redes e subsequente aumento das emissões de poluentes é outro dos efeitos colaterais da nova telefonia.

Os técnicos da Arup explicam que os centros de processamento de dados consomem uma média de 200 terawatts-hora (TWh) por ano, o equivalente ao consumo de um país como a Espanha. Esta demanda representa 1% do total de eletricidade do mundo e gera 0,3% das emissões globais de carbono. Se forem contabilizados também todos os aparelhos e redes vinculados a esses centros de processamento, toda esta tecnologia necessita entre 5% e 9% do consumo mundial de eletricidade e eleva a 2% sua participação na poluição mundial, similar à gerada pelo transporte aéreo.

“Não é preciso ser alarmista, e sim olhar isso em perspectiva e remediar”, afirma Rodríguez. Segundo ele, há mecanismos para tornar os centros de dados mais eficientes, uma medida que, além disso, representa um retorno imediato no investimento. “Pode-se conseguir uma economia de 28% a 32% no consumo por gigabyte, e o correspondente em emissões poluentes”, assegura.

Uma instalação de vários computadores para garimpar a criptodivisa Ethereum.
Uma instalação de vários computadores para garimpar a criptodivisa Ethereum.Pixabay

Este especialista cita exemplos como a melhora dos equipamentos de refrigeração dos complexos de dados e dos pontos intermediários para reduzir o consumo e aumentar a energia frigorífica gerada, ou melhorar a localização deles para situá-los nos espaços mais frios, ou redistribuir a carga dos servidores para ter um funcionando a 90%, em vez de três a 30%, ou chegar a acordos com companhias fornecedoras para assegurar a maior percentagem de energia renovável. E estas medidas, que já estão sendo aplicadas por grandes companhias, podem ser implementadas, acrescenta, sem reduzir as garantias de fornecimento, prioridade de qualquer empresa tecnológica frente a outras medidas.

Televisão

A Televisão Digital Terrestre (TDT) na Espanha também será afetada, já que deve deixar livre a banda dos 700 megaherz, importante para garantir a cobertura do 5G nas zonas mais isoladas. Os condomínios terão que readaptar as antenas, e os usuários precisarão resintonizar seus televisores.

Além disso, conforme já advertiu a Comissão Nacional dos Mercados e da Concorrência (CNMC), deixar esta banda para o 5G representará a perda de 30% do espectro usado pelos serviços do TDT.

Outros efeitos

A implantação da nova tecnologia também terá outros efeitos. O 5G exigirá aparelhos que sejam capazes de aproveitar o potencial desta tecnologia, por isso gerará um novo fluxo de equipamentos obsoletos que passarão à cadeia de resíduos.

Também o desenvolvimento destes novos dispositivos implica o aumento da produção dos materiais necessários, alguns deles com um grande impacto ambiental.

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