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Coluna
Artigos de opinião escritos ao estilo de seu autor. Estes textos se devem basear em fatos verificados e devem ser respeitosos para com as pessoas, embora suas ações se possam criticar. Todos os artigos de opinião escritos por indivíduos exteriores à equipe do EL PAÍS devem apresentar, junto com o nome do autor (independentemente do seu maior ou menor reconhecimento), um rodapé indicando o seu cargo, título académico, filiação política (caso exista) e ocupação principal, ou a ocupação relacionada com o tópico em questão

Que a política não envenene o Brasil na alegria da Copa

Sou testemunha, desde que cheguei a este país, que se há algo capaz de congregar todos os brasileiros, de todas as classes sociais, econômicas e intelectuais, é o futebol

Juan Arias
Torcedores brasileiros na Copa das Confederações, em 2013
Torcedores brasileiros na Copa das Confederações, em 2013K. PFAFFENBACH (REUTERS)
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É sabido que o futebol, como a religião, no Brasil e no mundo, na democracia e na ditadura, é usado pelos políticos como trampolim para seus cálculos de poder. Nunca vou esquecer aquela vez que ainda em vida do ditador espanhol Franco a seleção da Rússia jogou em 21 de junho de 1964 em Madri contra a Espanha. O caudilho e seu regime, campeões do anticomunismo, tinham lançado uma campanha para apresentar os jogadores russos como pouco menos do que monstros. Franco quis assistir à partida. Lembro de um grupo de senhoras bem curiosas por ver os jogadores soviéticos que exclamavam decepcionadas: “Mas são homens normais e bonitos!”. A tensão no estádio era grande. A Espanha franquista tinha de ganhar da Rússia comunista. Quando chegou o gol de Marcelino aos 35 minutos do segundo tempo, que daria a vitória à Espanha, houve alguns segundos de silêncio e, em seguida, o estádio, de pé, gritou: “Franco! Franco! Franco!”. O Caudilho tinha vencido a Rússia.

“Que o Brasil perca a Copa, que a greve dos caminhoneiros não pare e que o país exploda de uma vez”, ouvi um jovem brasileiro desiludido, funcionário dos Correios, dizer esta manhã. A política também acabará envenenando o Mundial de futebol? Li que existe um movimento para boicotá-lo. Imagino que se trate de quem deseja manter vivo o mau-humor de uma sociedade descontente com seus governantes. É o demônio do derrotismo que aparece justamente no momento em que este país precisa de algo que o unifique e o entusiasme, que o faça acreditar que até as piores derrotas podem ser superadas.

Como jornalista fui testemunha em minhas viagens pelo mundo da simpatia que sempre despertou nos cinco continentes o futebol brasileiro, metáfora de beleza e fantasia. E sou testemunha, desde que cheguei a este país, que se há algo capaz de congregar todos os brasileiros, de todas as classes sociais, econômicas e intelectuais, é o futebol. O clássico e popular grito: “Brasil! Brasil!”, lançado diante do gol ressoa desde a Bolsa de Valores de São Paulo até a última das favelas. E com ritual idêntico. Do sério presidente de empresa ao último peão, do analfabeto ao catedrático, diante do gol, pulam da cadeira, erguem os braços e acabam abraçando o primeiro que cruzarem a seu lado.

No Brasil, a Copa costuma coincidir com as eleições presidenciais e sempre se discutiu se uma vitória ou uma derrota da seleção nacional as influencia positiva ou negativamente. Não sei se há estatísticas sobre isso. No entanto, este ano o resultado da Copa poderá condicionar o ânimo dos eleitores. Poucas vezes, de fato, os brasileiros chegaram tão perto das eleições com tanta apatia, incerteza e irritação. A conquista do hexacampeonato poderia ajudar a recuperar parte dessa confiança que foi por água abaixo pela desilusão com os políticos e governantes?

Desde 1930, quando se realizou a primeira Copa do Mundo, no Uruguai, somente oito países ganharam a competição e apenas o Brasil o venceu cinco vezes. E este ano, segundo um estudo da Fundação Getúlio Vargas que envolveu um milhão de simulações, o favorito volta a ser o Brasil, com a Espanha, França e Alemanha. Meus amigos brasileiros já começaram a me perguntar se ficarei feliz se o Brasil conquistar o hexa ou prefiro que perca, seguindo a onda de descontentamento que açoita o país. Não. Eu aposto na vitória do Brasil precisamente para ir contra o derrotismo, um luxo que talvez se possam permitir aqueles a quem não falta nada ou os que apostam em manter o país dividido e irritado. O hexa seria a melhor metáfora de que o Brasil pode sair da crise política e de confiança em suas instituições usando a fórmula do treinador, Tite, uma mescla de seriedade, confiança, esforço e imaginação, talvez o que está faltando à política.

Torço para que o Brasil traga da Rússia seu sexto troféu mundial como presságio de que nas urnas saberá marcar também o melhor gol de sua democracia. Um gol contra a impunidade e a corrupção e em favor de uma época de prosperidade econômica e de tranquilidade social. Um gol capaz de devolver às pessoas a alegria que lhe roubaram. E que o triunfo na Copa e o resultado das urnas possam ser celebrados em um clima menos hostil, voltando a se olhar nos olhos em paz, sem ódios.

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