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Viagra: o comprimido azul que revolucionou o sexo completa 20 anos

Nas primeiras duas semanas após o lançamento, mais de 150.000 receitas foram expedidas nos EUA. Agora, entretanto, o faturamento da Pfizer com o medicamento decaiu

Faz nesta terça-feira exatamente duas décadas que um pequeno comprimido azul em forma de losango obteve sinal verde para ser lançado no mercado nos Estados Unidos, desencadeando toda uma revolução na cultura popular moderna. O Viagra permitiu que milhões de homens impotentes pudessem ter uma vida sexual ativa. Mas, além disso, rompeu tabus inclusive em sociedades puritanas como a dos EUA, ao fazer com que o problema da disfunção erétil fosse tratado abertamente em público. Desde o lançamento, calcula-se que tenha sido receitado 65 milhões de vezes em todo o mundo. O laboratório Pfizer, dono da patente, chegou a não dar conta dos pedidos. Mas agora, 20 anos depois e com vários concorrentes no mercado, o negócio já não é mais o que era.

Médico mostra pílulas do medicamento Viagra, da Pfizer
Médico mostra pílulas do medicamento Viagra, da PfizerLIU JIN (AFP)
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Um produto farmacêutico tão incomum como o Viagra teve também uma campanha publicitária incomum em seu lançamento. Pelé e Bob Dole, ex-candidato do Partido Republicano à presidência dos EUA, foram os embaixadores globais do comprimido, com anúncios na televisão. “Dá um pouco de vergonha falar em disfunção erétil, mas isso é importante para milhões de homens e suas cônjuges”, dizia o político e veterano de guerra na primeira propaganda que apresentou o Viagra às massas, buscando superar seus receios.

Dole contava no anúncio que, ao receber um diagnóstico de câncer de próstata, temeu que a cirurgia e o tratamento pudessem causar impotência. “Coragem, algo de que um número infinito de norte-americanos compartilha”, dizia ele, referindo-se a pacientes com doenças graves. Anos depois, foi a vez de Pelé assumir o papel de garoto-propaganda: “Não sofra mais em silêncio. Fale com seu médico. Eu vou falar”.

Essa droga para a impotência, que começou a ser vendida nos EUA, após obter todas as autorizações, em 27 de março de 1998, foi descoberta por acaso por uma equipe de pesquisadores da Pfizer que buscavam um tratamento para acalmar a dor torácica provocada pela angina de peito. Ao fazer testes com voluntários, observaram que o medicamento dilatava os vasos sanguíneos do pênis, e que esse aumento da circulação provocava como efeito secundário a sua ereção.

Faturamento acima do esperado

A pílula azul recebeu o aval da agência de medicamentos dos EUA e rapidamente se tornou uma dos totens da indústria farmacêutica. A impotência afeta um terço dos homens com mais de 40 anos. As alternativas que havia naquele momento no mercado não eram muito práticas nem plenamente efetivas. O faturamento do laboratório disparou acompanhando o ritmo do interesse planetário.

Nas primeiras duas semanas, os médicos expediram mais de 150.000 receitas nos Estados Unidos. A pílula chegou à Europa seis meses depois. Esse hiato provocou, em pleno frenesi global, que o Viagra fosse encontrado no mercado negro a um preço cinco vezes superior ao que custava em qualquer farmácia norte-americana.

As vendas do Viagra rondavam os 2,1 bilhões de dólares em 2012. No ano passado foram de 1,2 bilhão, praticamente a metade

Nem a própria Pfizer havia antecipado esse fenômeno. Dos 100 milhões de dólares em faturamento que o laboratório esperava obter no primeiro ano, passou a superar um bilhão em questão de poucos meses. Estima-se que ao longo destes 20 anos o Viagra tenha sido receitado mais de 65 milhões de vezes no mundo todo – isso levando em conta apenas o consumo legal.

Ajuda da Internet

O impacto do Viagra na impotência se compara à mudança propiciada pelos antibióticos para combater as infecções e aos tratamentos que reduzem o colesterol no sangue. Mas sobretudo foi também o tratamento perfeito para anunciar seus méritos aos consumidores, porque é um medicamento voltado diretamente para o estilo de vida dos pacientes.

O sucesso inicial do Viagra também foi possível graças à Internet. Os dois fenômenos cresceram, de fato, paralelamente, ao mesmo tempo em que os sites de pornografia on-line estouravam. A mulher, enquanto isso, ficou à margem das campanhas publicitárias até três anos atrás, quando a Pfizer as colocou falando diretamente para a câmera, pedindo aos homens que fossem ao médico.

Mas esse sucesso também causou uma dupla vulnerabilidade ao fabricante. As cópias piratas inundaram os portais ilegais na Internet. A pílula azul foi uma mina de ouro também para os contrabandistas, a tal ponto que 80% dos comprimidos encontrados na rede são ilegais e muito perigosos. Algumas usam tinta de impressora para obter sua cor peculiar.

Preço subiu junto com o sucesso

O Viagra tem como principais rivais no mercado norte-americano o Levitra e o Cialis. As primeiras versões genéricas chegaram à Europa em junho de 2013, e aos EUA no final do ano passado. A Pfizer há anos, de fato, tenta se preparar para os efeitos da perda da patente. As vendas da Viagra rondavam 2,1 bilhões de dólares em 2012 (cerca de sete bilhões de reais, pelo câmbio atual). No ano passado, caiu para 1,2 bilhão, praticamente a metade.

A pastilha azul, de fato, é vista também como um exemplo de até onde pode chegar a cobiça dos grandes laboratórios. Basta observar o preço. Cada comprimido valia 15 dólares quando começou a ser vendido. Depois foi aumentando até chegar a 50 dólares, sem um motivo que justificasse o novo valor. A versão genérica custa um dólar, e a Pfizer vai experimentar vendê-la no Reino Unido sem receita.

Apesar da sua popularidade, o Viagra continua sendo um remédio mal compreendido. Não é um afrodisíaco, e a ereção que ocorre 27 minutos após ingeri-lo não vai alterar a perda de apetite sexual do casal. O tratamento, além disso, é muitas vezes usado para coisas que não estão indicadas na receita médica, como potencializar o rendimento no ato sexual e no esporte.

Existe também uma versão para mulheres com redução da libido, chamada Addyi, apresentada na mídia como “o Viagra feminino”. A agência do medicamento dos EUA a autorizou em 2015. A pílula rosa, entretanto, não gerou entusiasmo, e sua eficácia é questionável, para não falar da longa lista de contraindicações desse tipo de antidepressivo.

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