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Tribuna
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Venezuela: não há solução sem Pequim

O Governo chinês se tornou mais pragmático nos últimos anos quando ditadores amigos começaram a desmoronar

Oliver Stuenkel
Manifestante nos protestos de 12 de junho em Caracas.
Manifestante nos protestos de 12 de junho em Caracas.Miguel Gutiérrez (EFE)
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Depois de anos de tentativas frustradas, fica evidente que atores regionais não têm a capacidade de ajudar a Venezuela a sair do fundo do poço. A crise política no país é mais profunda e complexa hoje do que em 2003, quando o grupo “Amigos da Venezuela”, composto por vários países latino-americanos, foi crucial para restabelecer o diálogo entre o governo e a oposição. Além disso, o vácuo de poder na América do Sul, acima de tudo devido à instabilidade política no Brasil, torna qualquer estratégia coordenada implausível.

Uma questão negligenciada nesse contexto é o papel fundamental da China, responsável por quase 40% do crescimento global em 2016. Há anos, Pequim se tornou o maior investidor e credor da Venezuela. É hoje um ator político que não se pode mais deixar fora da equação.

Em um momento em que o Caracas está cada vez mais isolada internacionalmente, investimentos chineses traduzem-se em uma enorme influência política e econômica. Desde que chegou ao poder, Maduro adotou uma série de manobras controversas para assinar acordos com a China sem a aprovação do Congresso, dificultando a análise de suas consequências para a economia. Ao longo dos últimos anos, a China emprestou mais de 60 bilhões de dólares à Venezuela. A maior parte dessa quantia está sendo paga em forma de petróleo. Os empréstimos não incluem condições políticas, mas há evidências de que preveem privilégios para empresas chinesas em setores-chave da economia venezuelana, como transporte, telecomunicações, energia, entre outros.

A oposição prometeu que, se chegar ao poder, revisará os termos dos empréstimos chineses. Isso tem gerado preocupações na China, pois o fim do chavismo forçaria Pequim a renegociar seus acordos, com possíveis perdas bilionárias. Pequim soube se aproveitar da busca desesperada da Venezuela por apoio financeiro, mas a população venezuelana desconhece em grande parte a crescente influência da China no país. Isso poderia mudar se a oposição assumisse o comando, expondo o verdadeiro preço do apoio financeiro chinês. Afinal, qualquer sucessor de Maduro precisará de bodes expiatórios externos na hora de implementar reformas dolorosas para colocar a economia nos eixos novamente.

Governos latino-americanos precisam deixar claro que acompanham de perto o papel de Pequim na Venezuela

Cabe destacar que os pagamentos em forma de petróleo da Venezuela para a China aumentaram nos últimos anos, embora a produção total do país tenha caído continuamente durante a última década devido à falta de investimentos e manutenção de instalações. Em 2016, reduziu-se para apenas 2,5 milhões de barris por dia — a menor quantidade em mais de duas décadas —, em comparação a 3,5 milhões diários em 1997.

É pouco provável que a China desempenhe um papel visível em qualquer esforço internacional para ajudar a Venezuela a superar suas divisões internas. Na maioria dos casos, como no Sudão, Zimbábue, Mianmar e Coreia do Norte, onde a China tem uma influência econômica extraordinária, Pequim resiste a pedidos internacionais para que pressione regimes autoritários. Ao mesmo tempo, o Governo chinês se tornou mais pragmático nos últimos anos quando ditadores amigos começaram a desmoronar. Em um movimento sem precedentes, diplomatas chineses se encontraram com rebeldes líbios durante a guerra civil em 2011 para discutir futuras relações econômicas — quando Muammar Gaddafi ainda estava no poder. Depois da reunião à época, o chanceler chinês, Yang Jiechi, apontou que a oposição "tem representado cada vez mais o povo líbio ".

Desde 2016, o governo chinês mantém um diálogo informal com a oposição em Caracas, sinal de que busca tomar providências para a possibilidade do colapso chavista. Porém, o fato de Pequim não ter feito comentários públicos sobre a oposição venezuelana — como no caso da Líbia — mostra que, por enquanto, aposta na permanência de Maduro no poder. Ao mesmo tempo, fontes chinesas admitem que Pequim está cada vez mais impaciente com os atrasos crescentes no envio do petróleo venezuelano. Atualmente, Caracas está com um atraso de mais de 3 milhões de barris.

No entanto, parece claro que a China só deixará Maduro entregue à própria sorte quando avaliar que o custo desses atrasos supera a perda de seu principal aliado na América do Sul. Antecipar corretamente o comportamento de Pequim — algo nada fácil, considerando que a Venezuela é um dos dez maiores fornecedores de petróleo da China — é indispensável para prever por quanto tempo mais Maduro ocupará o Palácio Miraflores.

Não há, portanto, como vislumbrar uma solução para a crise na Venezuela sem envolver a China — dificilmente como participante ativa nas negociações, mas talvez como importante interlocutora nos bastidores. Todos os países afetados — entre eles, o Brasil e a Colômbia, que recebem cada vez mais refugiados venezuelanos (quase um milhão no caso colombiano) — poderiam começar a discutir a questão em reuniões bilaterais com a China. Governos latino-americanos precisam deixar claro que acompanham de perto o papel de Pequim na Venezuela. O Brasil, por sua parte, poderia pedir ao Governo chinês que incluísse o tema na próxima cúpula do grupo BRICS, que ocorrerá na cidade chinesa de Xiamen em setembro deste ano.

Afinal, a presença da China na Venezuela revela uma tendência maior. O volume do comércio chinês com a América Latina se multiplicou por vinte nos últimos quinze anos. Empresas chinesas investirão 250 bilhões de dólares na região ao longo da próxima década. Portanto, para além da própria Venezuela, qualquer análise das dinâmicas políticas domésticas latino-americanas exigirá levar em consideração os interesses de Pequim.

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