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Editoriais
São da responsabilidade do editor e transmitem a visão do diário sobre assuntos atuais – tanto nacionais como internacionais

Vence Erdogan

A vitória apertada deveria impedir o avanço do presidente pelo caminho autoritário

Apoiadores do “sim” à reforma constitucional pelas ruas de Istambul
Apoiadores do “sim” à reforma constitucional pelas ruas de IstambulLefteris Pitarakis (AP)

A vitória do “sim” no referendo realizado na Turquia é uma má notícia. Realizado à sombra do estado de exceção, da falta de pluralismo na informação e de um clima geral de intimidação da oposição, o atual presidente, Recep Tayyip Erdogan, no poder desde 2003, logrou que o eleitorado turco valide uma reforma constitucional concebida à medida para ele, com o objetivo de dotá-lo de poderes tão amplos quanto preocupantes.

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Depois de ter expurgado o Exército, a polícia, a administração e o sistema educativo – estima-se que mais de 100.000 funcionários foram demitidos e 50.000 pessoas presas – Erdogan domina todos os recursos do poder na Turquia. Com a entrada em vigor das 18 emendas submetidas para aprovação, Erdogan poderá governar por decreto passando por cima do Parlamento, que pode dissolver quando julgar necessário, nomear a maioria dos juízes do Tribunal Constitucional e permanecer no poder até 2029.

Está em suas mãos agora decidir por qual caminho quer levar a Turquia. O primeiro, o desejável, seria o da reconciliação nacional. Consciente da pequena maioria que o apoiou em sua aventura plebiscitária e autoritária, deveria estender a mão à oposição democrática e curda, e também, à União Europeia, com quem a Turquia compartilha interesses econômicos e de segurança tão inextricáveis que tornam imprescindível o entendimento entre os dois lados.

O segundo caminho, perigoso e preocupante, procuraria, considerando que os resultados do referendo não foram tão contundentes como esperava, aproveitar os poderes obtidos para terminar de liquidar qualquer indício de oposição, seja democrática, gulenista ou curda, assim como terminar de marginalizar os meios de comunicação independentes.

Com esta reforma constitucional, a Turquia se coloca às portas do clube das chamadas “democracias não liberais”, isto é, sistemas políticos no qual as votações são regulares, mas onde não há separação de poderes, reais possibilidades de alternância no poder nem liberdade de informação, além de restrições às liberdades individuais. Cruzar esse limiar não só colocaria a Turquia em rota de colisão com a União Europeia, especialmente se a pena de morte for restaurada, como prometeu Erdogan durante sua campanha, mas abriria uma era de polarização e confronto dentro da Turquia. Não confiamos muito nisso, mas esperamos que Erdogan administre com cautela sua vitória, para benefício de todos os turcos.

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