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Editoriais
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Britânicos e europeus

Saída do Reino Unido da UE seria fatal para a economia e prejudicaria a dinâmica de toda a União Europeia

O cantor Bob Geldof, defensor da permanência do Reino Unido na UE.
O cantor Bob Geldof, defensor da permanência do Reino Unido na UE.NIKLAS HALLE'N (AFP)

Não devemos minimizar os efeitos de uma eventual saída do Reino Unido da União Europeia (UE). Nem olhar os britânicos por cima do ombro, apesar de serem responsáveis pela sua própria bagunça. E bastante corresponsáveis de que a UE não tenha atrativos imprescindíveis nesta conjuntura crítica, como o pilar social que tanto obstruíram. Seria estúpido marcar gols contra.

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Não devemos minimizar o desafio do referendo do dia 23. Ao contrário do que alguns acreditam, o impacto econômico da separação não seria estático, mas poderia ser exponencial. É verdade que a economia britânica é pequena em relação ao conjunto da comunidade: a sexta parte. E que em uma saída seria a que, como o lado mais fraco, sofreria mais problemas, já que a UE é o destino de quase a metade de suas exportações, contra 10% no sentido inverso.

Mas uma ruptura consolidaria as tendências emergentes ao recuo endogâmico e protecionista – como já surgem em alguns movimentos que se opõem à TTIP, o tratado em negociação com o EUA. Desviaria a atenção da política econômica: em vez de se concentrar em integrar melhor a zona do euro obrigaria a se dedicar a como salvar o máximo possível na nova negociação comercial (e global) minimalista com Londres separada. E sublinharia uma percepção global bastante negativa da Europa: poderia subir para a categoria de empecilho, um lugar que ninguém quer estar.

Já temos fortes indícios para apoiar essas conclusões. Diante da tendência crescente para a separação encontrada nas pesquisas – que são apenas isso, pesquisas – a libra despencou, as Bolsas desabaram e os bancos centrais anunciaram que estão prontos para fornecer todo colchão monetário que for preciso.

A preocupação econômica parece ter aumentado. Organismos internacionais e economistas, em insólita unanimidade, estão alertando do desastre. E o pânico está instalado no próprio Governo britânico, cujo chanceler do Exchequer (Tesouro) alertou para a necessidade de aumentar os impostos e praticar cortes severos se o voto pela saída vencer. Se tudo isso acontecer quando a partida ainda não tiver sido resolvida, não é preciso muito esforço para imaginar o que aconteceria se o resultado fosse negativo.

Além disso, cada vez fica mais evidente que os efeitos negativos de uma saída do Reino Unido ultrapassariam a economia. Afetariam a política, prejudicando a percepção, a dinâmica e a própria estabilidade da UE como projeto político-econômico; entre outros motivos, pela possibilidade de um efeito contágio – e até castelo de cartas – em outros Estados-membros reticentes.

O impacto poderia se tornar brutal. Especialmente porque o problema britânico não é algo existencial solitário. Ele se junta a outros de alcance enorme: a crise na gestão migratória; a digestão difícil da Grande Recessão, e o auge dos populismos, ou seja, os nacionalismos muitas vezes extremistas, xenófobos, que passaram do euroceticismo à eurofobia.

Assim, o levante dos separatistas não é um alívio nada sensato, muito pelo contrário. Devemos transmitir esta mensagem aos cidadãos britânicos, confiar em sua racionalidade e se preparar também para o cenário mais ingrato.

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