Como usar conhecimentos científicos para fugir da dieta
Álcool não engorda, gorduras não são tão ruins e emagrecer é impossível são algumas das justificativas
Quando se faz dieta, como quando se tenta parar de fumar ou começar a correr quatro vezes por semana, surge em nossa consciência de maneira automática uma voz que tenta boicotar os bons propósitos. Os argumentos do diabinho variam em termos de eloquência, mas se estamos dispostos a nos deixar vencer pelo cansaço, a ciência, caso se coloque o foco sobre os estudos adequados, pode oferecer argumentos que tornem a derrota mais digna.
Esta técnica, que entre os cientistas é conhecida como “cherry picking”, algo como puxar a brasa para a sua sardinha, é utilizada com certa frequência para justificar as conclusões mais convenientes. Muito difícil de evitar no trabalho dos pesquisadores, essa postura é a que podemos usar para justificar que, no fundo, cair em tentação não é tão grave. Aqui vão alguns exemplos.
É possível que o álcool não engorde
O álcool faz mal para a saúde, praticamente em qualquer quantidade. O consenso científico é quase total sobre esse ponto, mas o mesmo não acontece com seus efeitos sobre o peso. Com frequência, o álcool é uma das substâncias eliminadas nas dietas que não têm a saúde como objetivo prioritário. A razão, principalmente, é que contém muitas calorias (7,1 kcal por grama). No entanto, sabe-se que o organismo não consome nem assimila as calorias como se fosse um forno industrial, então a lógica mais simples nem sempre funciona quando se quer entender a relação entre calorias e engordar.
A longo prazo, o peso depende quase tanto da genética como da estatura
Foi isso o que observou um grupo de pesquisadoras da Universidade de Navarra em uma revisão de 31 publicações científicas entre 1984 e 2010 sobre a relação entre álcool e aumento de peso. Esse trabalho não observou que as descobertas desses estudos mostravam uma tendência clara, apesar de contemplarem a possibilidade de que as pessoas que bebem grandes quantidades de álcool tenham mais risco de ganhar peso do que aqueles que o consomem de forma moderada. No outro extremo, afirmam que tomar pequenas quantidades de álcool, especialmente vinho, pode até proteger contra o aumento de peso.
A gordura não é tão ruim
Durante décadas, as gorduras saturadas, que encontramos na carne dos animais ou nos produtos lácteos, foram o grande inimigo de toda dieta saudável. Esses alimentos estavam relacionados às doenças cardiovasculares ou a diabetes e, devido a seu elevado teor calórico, ao aumento de peso. A redução no consumo dessas gorduras era compensada com carboidratos como massas, ou com produtos sem gordura que, por sua vez, incorporavam uma grande quantidade de açúcar, como alguns iogurtes desnatados. O resultado é que os problemas cardíacos ou de obesidade pioraram em vez de melhorar.
As dietas baixas em carboidrato são melhores do que as que reduzem gorduras
Essa mudança tendência nos trabalhos científicos passou de demonizar a gordura a colocar o açúcar e alguns carboidratos como culpados de todos os males. Em uma outra demonstração de que o cálculo de calorias não é tão fácil quanto parece, alguns estudos tentaram comparar dietas com a mesma quantidade de calorias, mas com um conteúdo baixo em gorduras ou em carboidratos. Resultados como o publicado em 2014 por pesquisadores da Universidade de Tulane em Annals of Internal Medicine sugerem que a dieta baixa em carboidratos é melhor do que a baixa em gorduras para reduzir a obesidade ou o risco de enfermidades como o diabetes.
Em uma linha similar, no dia 26 de abril passado, Juan Revenga contou na seção El Comidista como mudou a percepção sobre o leite integral e o desnatado. Os estudos mais recentes mostram que, se compararmos pessoas que tomam leite com gordura e sem ela, no primeiro grupo o risco de sofrer de sobrepeso ou obesidade é 8% menor.
Mudar de peso é quase impossível
A melhor desculpa para quem quer furar a dieta é que não é simples mudar nosso peso natural. Jeffrey Friedman, o biólogo que descobriu a leptina, a molécula que regula a saciedade, explicou na seção Materia: “Nosso peso é regulado por genes, da mesma forma que a estatura. Você não pediria a alguém que mede 1,90 m que medisse 1,80 m, porque as pessoas são como são. Há genes que tornam algumas pessoas mais pesadas e outras mais leves. Quando há traços regulados por genes é porque há uma pressão evolutiva sobre essa característica. Antes que houvesse civilização, para sobreviver era preciso oscilar entre dois riscos. De um lado, estava o perigo de morrer de fome, porque a disponibilidade de comida era escassa. Nesse contexto, estar magro demais podia ser ruim, porque você não tinha energia suficiente armazenada para sobreviver, mas estar obeso também seria ruim, porque não poderia caçar bem nem escapar dos predadores. Nosso sistema biológico evoluiu para nos mantermos entre esses dois pontos”.
Estudos com gêmeos criados juntos ou separados ao nascer concluíram que em torno de 70% das variações de peso entre pessoas dependem dos genes, em torno de 80% atribuídos às variações de estatura. Essa ideia, pouco intuitiva, funciona quando se pensa em perder peso, mas também quando se quer acumular quilos.
Em 1967, o pesquisador Ethan Sims conduziu uma experiência extrema em uma prisão no Estado de Vermont, nos EUA. Ali, ofereceu aos reclusos reduções de pena se conseguissem ganhar 25% de peso. Muitos voluntários não conseguiram o objetivo apesar de terem ingerido 10.000 calorias diárias, quatro vezes mais do que a média norte-americana. Além disso, uma vez que tinham ganhado peso, era muito complicado mantê-lo.
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