MBA ao alcance do mouse: uma história de empreendedorismo
Empreendedor criou site de cursos online gratuitos para democratizar acesso à educação
Ao completar 10 anos em um cargo de diretoria de uma grande multinacional, o executivo Carlos Souza, engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), resolveu tirar um ano sabático para refletir sobre a carreira e o que considerava ser o seu papel no mundo. "Eu queria exercer um trabalho de impacto social, que contribuísse para melhorar a vida das pessoas. Um trabalho do qual eu me orgulhasse", conta. Em 2011, saiu pelo Vale do Silício atrás de inspiração. Filho de professores, pensou em desenvolver algum negócio voltado para a educação, segmento-chave para a promoção do crescimento e desenvolvimento de um país.
"Lá fora descobri um movimento forte de empreendedores que buscavam resolver problemas sociais e ambientais por meio de negócios compartilhados. Esta é uma tendência para o capitalismo, na minha opinião, uma solução necessária para garantir a sustentabilidade de qualquer economia", conta. Souza começou a frequentar eventos de startups e a procurar investidores interessados em bancar a sua ideia: um site que reunisse cursos online de universidades renomadas, que pudesse ser acessado gratuitamente por qualquer pessoa interessada em aprender. "Nos Estados Unidos, desde os anos 2000, diversas universidades de peso, como o MIT e Harvard, colocam gratuitamente na internet módulos de cursos de graduação, que são bastante acessados para não alunos no mundo todo. Pensei que poderia fazer algo semelhante no Brasil", explica.
Souza resolveu largar de vez o emprego e começar a investir na própria empresa, batizada de Veduca. A plataforma reúne cursos de universidades internacionais e até de instituições brasileiras, como USP e Unicamp. Todos os módulos são gratuitos e, para acessá-los, basta fazer um cadastro no site. Um modelo de negócios semelhante é o Coursera, site americano lançado alguns anos antes, que dispões de aulas gratuitas online, em parceria com universidades dos Estados Unidos. Mais recentemente, o Coursera começou a legendar os módulos em outros idiomas, inclusive em português, para que pudessem ser acessados por internautas de outros países.
"No Brasil temos cerca de 7 milhões de estudantes universitários, menos de 20% dos alunos que cursam o ensino médio. Ocupamos posições deploráveis em qualquer ranking global que analisa qualidade de ensino. O Brasil carece de educação de qualidade e há poucas universidades nacionais bem posicionadas nos rankings mundiais. O objetivo do Veduca é, portanto, facilitar o acesso das pessoas às melhores salas de aula, que são escassas no país", afirma Souza.
A plataforma começou a operar em 2012, com um capital inicial de 100 mil reais que Souza conseguiu levantar com outros três sócios. Para integrar esse dinheiro, o empreendedor vendeu alguns bens, inclusive o único carro que tinha. Souza recorreu a diversas fontes de recursos para conseguir capital suficiente para o primeiro ano de operação da nova empresa e nem se lembra de quantos pitches (apresentações do projeto para investidores potenciais) chegou a fazer, mas não conseguiu levantar nenhum centavo com essa estratégia.
"Aprendi que a melhor maneira de fazer um investidor acreditar no seu projeto é investindo, primeiro, dinheiro do próprio bolso. Afinal, se nem você coloca dinheiro na empresa, como espera que outra pessoa o faça?", indaga. A empreitada deu certo e, em poucos meses, começaram a aparecer os primeiros interessados. O primeiro aporte veio dos fundos de investimento 500 startups, do Vale do Silício, e da subsidiária brasileira do Mountain Partners Group, no valor total de 1,5 milhão de reais. Depois vieram outros fundos, nacionais e internacionais, elevando o valor dos investimentos para 8 milhões de reais em menos de dois anos de existência do Veduca.
Com o primeiro investimento, em 2012, o Veduca foi para uma sala maior, um sobrado em Pinheiros, na capital paulista, e começou a contratar os primeiros funcionários, que hoje passam de 20. Na ocasião, o site já tinha mais de um milhão de pessoas cadastradas e 11 milhões de acessos.
O site oferece módulos de graça, em parceria com universidades - e até empresas como o Google - e não abre espaço para propagandas em sua página. Com esse modelo de negócios, pautado no compartilhamento de conteúdo, como é possível ganhar dinheiro? A princípio, de fato, não era. A receita do Veduca começou a ser gerada na segunda etapa do projeto. Com a popularidade da plataforma, Souza conseguiu firmar parcerias com instituições no lançamento de MBAs certificados. Para adquirir o certificado, que é reconhecido pelo Ministério da Educação (MEC), o estudante deve pagar.
O primeiro MBA surgiu no final de 2013, com conteúdo de professores da USP e da Ufscar. Depois, veio um MBA em parceria com a BMF&Bovespa. Outra fonte de receita da empresa está na parceria com órgãos públicos. O Governo do Estado de Minas, por exemplo, contratou o Veduca para a oferta de um MBA para seus funcionários públicos.
"Antes desse modelo de não tínhamos fonte de receita. Entretanto, os investidores se interessaram pelo nosso projeto porque esse potencial gerador já existia desde o começo e estava traçado no nosso plano de negócios", explica Souza.
O fim de um ciclo
Souza não revela o faturamento do Veduca, mas está deixando o seu "primeiro filho" este ano, com a certeza de que ele já atingiu a fase adulta e um nível de maturidade suficiente para trilhar o próprio caminho sem o "pai". O empreendedor vendeu parte de suas ações neste segundo semestre e deixou a presidência da companhia, mantendo vínculos apenas como sócio. Isso porque resolveu aceitar a oportunidade de fazer um novo empreendimento crescer. O projeto, cujo nome não pode revelar, também é da área de tecnologia para a educação. "Um pai cria um filho para o mundo", brinca. "Foram quatro anos de trabalho ininterruptos em um projeto do qual tenho todos os motivos para me orgulhar. Encerro um ciclo para continuar perseguindo o caminho que acredito", complementa.
O executivo explica que a empresa que deverá assumir - que já tem dez anos de existência e recebeu recentemente capital de investidores - complementa, de certa forma, a "missão" do Veduca. O novo projeto é uma empresa de testes online, adaptados de acordo com o nível de proficiência do aluno. "É uma companhia de educação sob demanda, personalizada para cada aluno. Os clientes são entes governamentais, associações profissionais e empresas privadas", conta. Um exemplo onde essa tecnologia pode ser inserida é na sala de aula de escolas públicas que trabalham com a inclusão de alunos com necessidades especiais.
Souza destaca que recebeu o convite para participar da empresa pelo fundo de investimentos que aportou o capital. "Foi o meu trabalho no campo da tecnologia para a educação que chamou a atenção do investidor. Porque eu acreditei no meu negócio e consegui erguê-lo do zero, sinto que posso contribuir para fazer o novo projeto crescer também. Empreender se torna um vício", brinca.
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