Tsipras mantém o referendo e pede votação maciça no não
‘O Governo grego continua na mesa de negociação’, disse o primeiro-ministro grego

“O referendo de domingo na Grécia não tem nada a ver com o euro ou com a Europa; aqueles que nos acusam de ter uma agenda secreta [a favor da saída do euro] mentem”. Taxativo, firme e sem fazer concessões, o primeiro-ministro grego Alexis Tsipras dirigiu-se na tarde desta quarta-feira ao país apenas uma hora antes do início da reunião do Eurogrupo [instância que reúne ministros de Finanças e outras autoridades da zona do euro], e depois de um dia cheio de rumores e informações contraditórias, para confirmar que o referendo segue adiante, como porta para uma nova rodada de negociações mais vantajosa para a Grécia.
“Queremos um acordo com os parceiros, mas um acordo com perspectiva de futuro, uma solução viável. Após o anúncio do referendo, recebemos melhores propostas, especialmente no que diz respeito à reestruturação da dívida, e o Governo grego continua na mesa de negociação. Um veredito popular é muito mais poderoso do que a vontade de um Governo, de modo que um grande não no referendo de domingo será um passo decisivo para um melhor acordo. Porque o ‘não’ não significa uma ruptura com a Europa, mas um retorno à Europa dos valores”, disse ele, repetindo os mesmos argumentos usados na segunda-feira, na primeira entrevista depois do anúncio do referendo, um dia que muitos esperavam uma rendição.
Com sua referência aos esboços do acordo, Tsipras aludiu a um em particular, que na manhã de quarta-feira parecia quase definitivo, a contraproposta que Atenas enviou na terça-feira aos responsáveis pelas três instituições credoras, na qual o Governo insistia em três condições irrenunciáveis –mas não particularmente dispendiosas– para firmar a paz com os parceiros: um desconto especial de 30% do IVA para as ilhas, o adiamento do aumento da idade de aposentadoria e uma prorrogação para eliminar o EKAS, o fundo social de pensões compensatórias para os gregos com pensões mais baixas.
O chefe do Governo se referiu às dificuldades que o país enfrenta, com um corralito [retenção de depósitos bancários] desde segunda-feira e um máximo de 60 euros por cliente e por conta por dia disponível nos caixas eletrônicos. “Estou perfeitamente consciente das dificuldades. Nos obrigaram a fechar os bancos em resposta ao anúncio do referendo, em um clima de grande asfixia econômica, mas o controle de capitais é temporário e não haverá perda de salários e pensões; também estão garantidos os depósitos das pessoas que não retiraram seu dinheiro”.
Horas depois de o Conselho da Europa ter se pronunciado sobre as dúvidas levantadas pelo referendo grego — pouco tempo para ser organizado e um enfoque defasado, o da proposta dos parceiros, para não mencionar a formulação da pergunta —, Tsipras se atreveu a replicar fazendo uma revisão dos últimos referendos realizados na Europa. “Outros países europeus fizeram referendos sobre temas relacionados com a Europa e, entretanto, parece que a Grécia não pode fazê-lo”. “Viremos a página, defendendo a democracia e nossa convicção sobre um melhor acordo. Por nossos filhos, pelas gerações futuras, ele não é o nosso dever diante da história “, concluiu o chefe do Executivo grego num tom firme e enérgico que não mostrava qualquer indício de dúvida sobre a possibilidade de ter abortado a crise com o que todos consideravam a iminente assinatura de um acordo.
Diante da segurança do discurso do primeiro-ministro, as críticas da oposição aumentaram de volume, à medida que se aproxima o referendo. "O governo está mentindo e levando o país à bancarrota; então você tem que votar sim, sim para o euro, a Europa e para o futuro ", disse o líder conservador Andonis Samarás.
"O governo está mentindo ou desconhece a realidade. No referendo de domingo se decide a via europeia do país; por razões legais e econômicas, um não, no melhor dos casos, significa deixar o euro, e na pior das hipóteses, deixar a União Europeia", sustentava Pavlos Elefzeriadis, professor de Direito Comunitário na Universidade de Oxford e chefe da política europeia do liberal To Potami, que faz campanha para o sim. No extremo oposto, um grupo de funcionários do Ministério das Finanças estenderam, sem permissão, uma grande faixa das janelas do edifício, com o slogan "Não à chantagem". O tamanho da faixa só não era comparável ao desafio que a Grécia enfrenta nos dias de hoje.
Varoufakis explica os motivos do "não" do Governo grego
O ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, publicou na tarde de quarta-feira em seu blog um texto curto que explica os motivos do Governo a que pertence para se opor à proposta europeia no referendo de domingo. Reproduzimos abaixo, traduzido do inglês, o artigo do ministro das Finanças grego:
Por que recomendamos votar “não” em seis pontos
- As negociações estão paralisadas porque os credores da Grécia se recusaram a reduzir nossa impagável dívida pública e insistiram que deveria ser paga pelos cidadãos mais fracos da nossa sociedade, seus filhos e netos.
- O FMI, o Executivo dos Estados Unidos, muitos Governos de todo o mundo e a maioria dos economistas independentes acreditam –como nós– que a dívida deve ser reestruturada.
- Em novembro de 2012 o Eurogrupo admitiu que a dívida deveria ser reestruturada, mas se recusou a fazer essa reestruturação.
- Desde o anúncio do referendo, as instituições europeias deram sinais de que estão preparadas para debater uma reestruturação da dívida. Esses sinais mostram que a Europa também votaria "não" à sua própria oferta final.
- A Grécia permanecerá no euro. Os depósitos bancários em bancos gregos estão a salvo. Os credores optaram pela estratégia da chantagem com base no fechamento dos bancos. O impasse atual nas negociações se deve à vontade dos credores, não é uma escolha dos credores ou responde à vontade da Grécia de sair do euro (Grexit) e impor uma desvalorização. O lugar da Grécia na zona do euro e na UE não é negociável.
- O futuro exige uma Grécia orgulhosa na zona do euro e no coração da Europa. Esse futuro necessita que a Grécia diga um sonoro "não" no domingo, que permaneçamos na zona do euro e que, com o poder que nos for concedido por esse sonoro "não", renegociemos a dívida pública grega e a distribuição das responsabilidades.