A amarga espera de um brasileiro para morrer fuzilado fora do seu país
Preso com cocaína em 2004, Rodrigo Gularte deve ser executado nas próximas horas, depois de dez anos no corredor da morte
O Brasil não tem pena de morte, mas deve assistir, nas próximas horas ou dias, à segunda execução de um cidadão no exterior. Rodrigo Muxfeldt Gularte foi informado pelas autoridades da Indonésia no último sábado (dia 24) de que sua execução poderia ocorrer dentro de 72 horas. Nas próximas horas, ele será um dos nove réus — sendo oito estrangeiros — que serão executados.
O brasileiro ainda acreditava em sua soltura. Recebeu a notícia com descrença, dizendo que sua a decisão do Governo da Indonésia era uma “mentira” e que teria sua sentença revertida. No corredor da morte, o paranaense de 42 anos havia recusado os três últimos pedidos a que tinha direito nos dias que antecedem sua condenação. Mas, segundo o jornal Folha de São Paulo, Gularte pediu para sua família nesta segunda-feira que fosse enterrado no Brasil —o plano inicial era que fosse cremado na Indonésia e que suas cinzas logo fossem levadas para Curitiba, cidade natal do condenado.
Preso em 2004 aos 32 anos ao tentar entrar na Indonésia com seis quilos de cocaína em pranchas de surfe, Gularte foi condenado à morte em 2005. Recentemente, porém, foi diagnosticado com esquizofrenia e, às vésperas de sua execução, falava frases desconexas e parecia estar “delirando”. Em mais uma demonstração de negação da realidade, teria relatado ter ouvido funcionários da prisão onde está preso conversando entre si sobre a possibilidade de a pena capital deixar de ser aplicada no país, segundo um funcionário consular brasileiro ouvido pelo EL PAÍS.O fato, porém, é que o pelotão de fuzilamento responsável pela execução dos nove condenados por tráfico de drogas já está "pronto", segundo informaram as autoridades locais. Na prisão de segurança máxima de Cilacap, o brasileiro e os australianos Andrew Chan e Myuran Sukumaran, o ganês Martin Anderson, a filipina Mary Jane Veloso (única mulher do grupo) e os nigerianos Myuran Sukumaran, Raheem Agbaje Salami, Okwudili Oyatanze e Silvester Obiekwe Nwaolise esperam sua iminente morte. Segundo o jornal The Jakarta Post, eles devem ser mortos em grupos separados pelo pelotão.
Apenas uma pessoa teve seu nome retirado da lista na última hora: o francês Serge Atlaoui, que continua preso e ainda aguarda um desfecho para sua história. Segundo a imprensa francesa, a pressão do presidente François Hollande foi fundamental para que Atlaoui ganhasse mais tempo. A Indonésia negou todos os pedidos de clemência das famílias e dos países. "Estamos esperando um milagre", disse a irmã da mulher filipina que aguarda execução. Nesta terça, o presidente das Filipinas, Benigno Aquino, solicitou novamente que a Indonésia reconsidere a decisão, argumentando que a Mary Jane Veloso teria sido usado como "mula" e poderia colaborar com as investigações, ajudando a desmontar a rede de tráfico. O presidente da Indonésia, Joko Widodo, chegou a se reunir com as autoridades locais para discutir o caso, mas a Promotoria insiste na execução, informou a Reuters.
Já no caso do Brasil, a pressão da presidenta Dilma Rousseff e a forte crise diplomática provocada entre os dois países desde o fuzilamento do brasileiro Marco Archer, em janeiro, não foram suficientes para a clemência. Assim como fez a defesa do paranaense, o Governo brasileiro usou o quadro de paranoia para tentar mudar a decisão da corte indonésia. Em nota entregue às autoridades locais no domingo, o Itamaraty pedia a internação imediata de Gularte em um hospital psiquiátrico local, e classificava a recusa das autoridades em reconhecer o apelo como um desrespeito ao "bom senso e de normas básicas de proteção aos direitos humanos”, segundo trecho do documento publicado pela Folha de S.Paulo.
"Quando a Promotoria nos der a ordem, estamos prontos", disse o chefe da polícia local, Ulung Sampurna Jaya. O Ministério Público destacou que não irá divulgar o horário exato das execuções, para não "pressionar" os agentes responsáveis pelas execuções. Mais de 1.400 agentes trabalham na segurança do local, onde familiares aguardavam notícias dos detentos.
Família em desespero
Nesta segunda-feira, a defesa fez uma última tentativa de reverter a decisão. Além dos advogados da família e de um representante da embaixada do Brasil na Indonésia, uma prima dele, Angelita Muxfeldt, acompanha o processo no país. Em entrevista ao site G1, outra prima do brasileiro, Lisiane Gularte de Carvalho, disse que a família “lutaria até o fim” e explicou porque a mãe dele, Clarice Gularte, 70 aos, não iria ao país para a execução.
“Ela não tem nenhuma condição para isso. Está em casa, cercada de familiares, e medicada. Aliás, a família nem quer que ela vá", disse. “Nós estamos todos devastados."
Nos meses que antecederam a confirmação do fuzilamento, a família de Gularte fez inúmeros apelos para tentar reverter a sentença. Descrito pelos familiares como educado e gentil, o brasileiro teria desenvolvido um grave quadro depressão e delírio na prisão. Ele é solteiro e não tem filhos.
Clarice viu o filho pela última vez em fevereiro deste ano, quando viajou à Indonésia. Em entrevista à BBC Brasil na ocasião, ela contou que ele teve uma infância “feliz e normal”, mas que se envolveu com drogas na juventude. Desde que foi informada da prisão, Clarice enviou cartas pedindo ajuda tanto da presidenta Dilma quanto do Papa Francisco. Também apelou à Organização das Nações Unidas, que enviou uma carta à Indonésia pedindo o fim da pena de morte, também sem sucesso.
“Os meus últimos anos têm sido difíceis. Eu tento me segurar [chora], porque tenho outros filhos, netos. Não é fácil. Eu tento levar minha vida. Tenho esperança que ele volte... é o que me mantém”, disse Clarisse em 2012, em depoimento à Folha de S.Paulo. Se mantida a decisão, Rodrigo Muxfeldt Gularte será o segundo brasileiro executado na Indonésia: em janeiro, o país ignorou os apelos do Brasil e fuzilou Marco Archer, também condenado por tráfico de drogas.
Com informações das Agências.
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