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Casamento igualitário conquista o conservador Sul dos Estados Unidos

A Suprema Corte impede o Alabama de proibir matrimônios entre pessoas do mesmo sexo

Yashinari Effinger e Adrian Thomas se casam nesta semana no Alabama.
Yashinari Effinger e Adrian Thomas se casam nesta semana no Alabama.Gary Cosby Jr. (AP)

Há três anos, em pleno debate sobre a legalização do casamento homossexual nos Estados Unidos, o reverendo Phil Snider se dirigiu à sua congregação no Missouri com um discurso a favor da discriminação sexual. Poucos minutos depois de começar, parou de falar. "Sinto muito, acredito que tomei emprestados os argumentos do século errado." Snider tinha convencido o público de que a discriminação era justificável trocando os termos "integração racial" por "direitos dos homossexuais" em um discurso que já tinha sido usado para defender a segregação contra as minorias raciais no sul.

Sua intervenção se transformou em um dos vídeos virais naquele momento. Snider havia demonstrado que os argumentos que falharam na defesa da segregação também são insuficientes para negar a igualdade aos homossexuais. Agora, assim como há meio século, a região que mais tempo oprimiu as minorias raciais foi a última a se juntar à batalha pelos direitos civis, a dos homossexuais.

A geração do milênio, a mais diferente das últimas décadas, mostra um apoio sem precedentes aos direitos da comunidade LGBT

Dezenas de casais do mesmo sexo esperavam na segunda-feira nos cartórios do Alabama para poder se casar. Queriam ser os primeiros, do primeiro Estado do Deep South a ter acesso a um direito que a maior parte do país já reconhece. Não faltou tensão. Um juiz do Alabama, Roy Moore, tinha estabelecido na noite anterior que não se assinaria nenhuma certidão de casamento até que a Suprema Corte se pronunciasse em Washington. Apenas algumas horas depois, a Suprema Corte negou a petição de Moore e declarou que o Alabama não tem competências para proibir o casamento igualitário.

Até agora, a comunidade homossexual do Alabama tinha visto como os avanços conquistados no resto do país não cruzavam suas fronteiras. O limite estava até agora no sul, mas a mudança chegou com a decisão dos juízes da Suprema Corte.

A onda de mudança que em apenas dois anos varreu a opinião pública norte-americana começa a conquistar o sul. A região mais conservadora do país é a que menos apoia as uniões entre pessoas do mesmo sexo: apenas 41%, frente a 61% que apoia na costa Leste, segundo dados recentes do Centro Pew. Sete de cada 10 americanos vivem em um dos 37 Estados onde o casamento homossexual está legalizado. Outra maioria, 72%, considera que o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo é já inevitável, segundo dados do Centro Pew.

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Mas sob a pele conservadora de Alabama, Georgia e Louisiana adivinham-se profundas transformações culturais e demográficas que colocaram os cidadãos a favor do casamento igualitário. Apesar de estar na retaguarda de uma das mudanças sociais mais importantes das últimas décadas, o ritmo foi o mesmo que no resto do país e na mesma direção. Desde 2003, o apoio no sul passou de 25% a 44%, similar ao salto de 21 pontos que deu a costa Leste (de 40% para 61%) no mesmo período.

O Alabama deve acatar agora a decisão do tribunal Supremo. Mas isso não significa que o alto tribunal tenha reconhecido o direito a se casar dos homossexuais; em junho terá de se pronunciar sobre isso e sua decisão afetará todo o país.

Shante Wolfe e Tori Sisson foram o primeiro casal a se casar no conservador estado do Alabama, no sul do EUA.
Shante Wolfe e Tori Sisson foram o primeiro casal a se casar no conservador estado do Alabama, no sul do EUA.Mickey Welsh (AP)

"As autoridades podem permitir a vigência dessas uniões ou ficar como estúpidos orgulhosos por tentar arrancar maridos e esposas de seus cônjuges", afirmou na segunda-feira a revista The Atlantic. "Ninguém conquistou os americanos rasgando suas certidões de casamento."

Nem sequer os do sul. O juiz Moore ignorou a nova demografia e a mudança de ideias na região, destino nos últimos 20 anos uma onda de trabalhadores, especialmente de minorias raciais, que retornam do norte. Eles se caracterizam, conforme escreve o demógrafo William Frey em sua radiografia da explosão demográfica que está definindo os novos EUA, tanto pela a idade como pelo "capital humano". Nos anos setenta e oitenta, os afro-americanos retornavam só um pouco melhor economicamente que seus novos vizinhos. Agora, segundo Frey, "são jovens e com um nível educativo muito alto".

A geração do milênio, a mais diferente das últimas décadas, mostra um apoio sem precedentes aos direitos da comunidade LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais). Segundo dados do Public Region Research Institute, 69% dos jovens entre 18 e 33 anos defende o casamento homossexual frente a 37% dos maiores de 68 anos, os baby boomers que lideraram a opinião pública até a última década.

O sul já não está isolado e acaba de se juntar às mudanças de uma sociedade que há apenas cinco anos não imaginava que em 2015 poderia estar às portas de legalizar o casamento homossexual.

Um juiz desafia o Supremo

C. F. PEREDA

A estratégia do juiz Roy Moore para parar os casamentos entre pessoas do mesmo sexo no Alabama é habitual: os magistrados podem pedir à Suprema Corte que bloqueie a execução de uma lei até que o tribunal decida se esta se ajusta à Constituição ou não. Nesse caso, o tribunal Supremo estudará em abril quatro casos que podem responder a pergunta-chave na penúltima batalha pelos direitos civis do país: os norte-americanos têm o direito de se casar com uma pessoa do mesmo sexo?

Dois dos nove juízes da Suprema Corte manifestaram nesta semana seu rechaço à decisão de não bloquear os casamentos entre pessoas do mesmo sexo no Alabama até que a corte resolva essa questão. Os conservadores Clarence Thomas e Antonin Scalia, em uma sentença redigida pelo primeiro, alertaram que a decisão da corte "pode ser interpretada como um sinal de que o tribunal já respondeu a pergunta", em referência aos casos que estudará em abril.

O tribunal Supremo declarou em 2013 que a lei federal que definia o matrimônio como a união entre um homem e uma mulher, assim como a lei da Califórnia que proibiu as uniões de casais do mesmo sexo, violavam a Constituição ao discriminar os homossexuais. Esses dois casos, considerados como os avanços mais importantes em matéria de igualdade de direitos da comunidade LGBT, não resolveram, entretanto, a questão de existir o direito ao casamento em nível federal. Para Thomas, uma maioria de juízes do Supremo adiantou a resposta.

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