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Justiça analisa digitais em passagem de ligação de apartamento de Nisman

Investigadores descobriram pegadas em trecho que comunica local do crime e outra casa

Francisco Peregil
O secretário de Segurança argentino, Sergio Berni, chega ao andar do promotor Alberto Nisman.
O secretário de Segurança argentino, Sergio Berni, chega ao andar do promotor Alberto Nisman.C. F. (AFP)

A investigação sobre a morte do promotor Alberto Nisman, achado no banheiro de sua casa com um tiro na cabeça, quatro dias depois de denunciar a presidenta da Argentina, continua em várias frentes. Os investigadores descobriram pegadas e uma impressão digital em uma passagem pela qual o apartamento de Nisman se comunica com outra moradia, habitada por um estrangeiro, segundo informou a agência Dyn. Como na passagem há aparelhos de ar-condicionado, os investigadores estão tentando averiguar se as digitais pertencem a algum técnico de manutenção ou outra pessoa.

Por outro lado, o chaveiro chamado pela mãe de Nisman e seus guarda-costas para entrar no domicílio do promotor informou a um grupo de jornalistas, depois de prestar depoimento na Justiça, que foi muito fácil para ele abrir a porta de serviço: “A [porta] de serviço não estava trancada. Simplesmente empurrei a chave e entrei em dois minutos”.

- Mas só um chaveiro poderia abri-la?, perguntou um jornalista.

- Não, qualquer um.

-Ou seja, uma pessoa pode ter saído por essa porta e a fechado por fora, simplesmente assim?

- Isso imaginam vocês.

A planta do apartamento (em espanhol)
A planta do apartamento (em espanhol)

Enquanto isso, a investigação prossegue. A promotora Viviana Fein fará com que seja disparada novamente a pistola Bersa calibre 22, da qual saiu a bala que matou Nisman. Desse modo, a arma será analisada após outro disparo para se comprovar se deixa resíduos de pólvora na pele de quem atira.

Mas esse não é o único mistério que paira sobre a pistola. Alberto Nisman pediu a arma no sábado a um empregado externo da promotoria, Diego Lagomarsino, que se apresentou voluntariamente para depor perante Viviana Fein. Lagomarsino, técnico em informática e eletrônica, declarou que Nisman a havia pedido para se defender no caso de lhe acontecer alguma coisa. A questão é que Nisman tinha duas armas registradas em seu nome. Por que pediu uma emprestada?

Outra pergunta suscitada nas últimas horas guarda relação com o secretário de Segurança, Sergio Berni, homem de estreita confiança da presidenta. Berni reconheceu que chegou ao apartamento do promotor Alberto Nisman antes do juiz e da promotora encarregados da investigação da morte dele. “Cheguei dois minutos antes do juiz, e uma hora depois chegou a promotora”, afirmou Berni em declarações à rede TN. “Não entrei no banheiro e não deixei que ninguém entrasse”, se defendeu o membro do Governo de Cristina Fernández de Kirchner, que, na sua chegada encontrou a mãe de Nisman, “alguém que parecia ser sua tia” e os guarda-costas do promotor.

A promotora Viviana Fein não viu nenhum elemento estranho nesse fato e não tomou o depoimento dele. No entanto, a deputada oposicionista Patricia Bullrich, chefe da Comissão de Legislação Criminal, anunciou que convocará o secretário de Segurança para que explique por que chegou ao lugar antes dos investigadores da Justiça. Berni declarou que a discussão sobre sua presença é política, e não judicial. “São questões que tentaram levantar distintos atores políticos para pôr mais incerteza às que nós argentinos temos sobre a morte do senhor promotor. E ficou mais do que claro com o que disse a promotora”, afirmou.

O secretário de Segurança argentino, número dois da ministra de Segurança do Executivo de Cristina, María Cecilia Rodríguez, falou na entrevista à rede TN sobre os primeiros momentos no lugar dos fatos. A mãe de Nisman “supunha que seu filho estivesse morto”, afirmou Berni, que contou que os guarda-costas tentaram abrir a porta do banheiro, onde se encontrava o promotor, mas não puderam porque o corpo dele a bloqueava. “Se é um parente meu, eu fico louco. Imagine, eu ponho a porta abaixo”, acrescentou o alto funcionário, que defendeu sua presença no apartamento para “garantir que tudo se fizesse com a maior transparência”.

"A preocupação da mãe era que se preservasse tudo, e assim dispus com a custódia de Nisman. Pedi à promotora e ao juiz que a mãe estivesse presente, já que ela temia que subtraíssem informações importantes”, detalhou o secretário de Segurança.

Os jornais argentinos publicam, por outro lado, a revelação da agência DyN sobre a terceira entrada ao apartamento de Nisman (além da porta principal e uma porta de serviço). Trata-se, segundo informação citada por Clarín e La Nación, de uma passagem que conecta o apartamento do promotor com outro “habitado por um cidadão estrangeiro, que não é de origem iraniana, nesta passagem estão os equipamentos de ar condicionado”.

“O corredor é como um desfiladeiro estreito; os equipamentos de ar condicionado estão encostados em uma grande parede e há, no lado oposto, um tipo de barra de proteção, por onde se deslocam – por exemplo – os técnicos que são chamados para consertar os equipamentos de refrigeração”, informa La Nación. Nesta passagem, os investigadores detectaram uma pegada de aparência recente no chão, e sobre a “barra de proteção”, uma impressão digital. Os dois rastros foram enviados para análise, com o objetivo de determinar se têm alguma relação com a morte do promotor. A passagem está situada no décimo terceiro andar do edifício, onde encontra-se o apartamento de Nisman.

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À medida que passam as horas, aumentam as dúvidas sobre a morte de Alberto Nisman, que faleceu de um tiro na têmpora, embora os primeiros relatórios conhecidos dos legistas revelam que “não houve intervenção de terceiros”, segundo informou Viviana Fein, a promotora a cargo da investigação. Quer dizer, os primeiros exames apontam para suicídio, que teria acontecido entre as duas e as três da tarde do domingo (três e quatro no horário de Brasília). A causa, no entanto, está catalogada como “morte duvidosa”, e estão investigando se houve alguma indução ou instigação ao suicídio através de ameaças.

Os testes da perícia ainda não estão concluídos. Ontem ficou conhecido que na mão direita do promotor, com a qual ele supostamente atirou em si mesmo, não foram encontrados vestígios de pólvora, motivo usado pelos analistas mais críticos com o Governo de Cristina Fernández para defender que não se tratou de um suicídio. No entanto, a promotora encarregada de investigar sua morte, Viviana Fein, explicou que o fato de que não se encontrou pólvora não significa que não tenha sido ele que disparou. “Por ser uma arma de calibre 22, não uma arma de guerra, normalmente o teste eletrônico não dá resultados positivos. Isso não elimina a possibilidade de que ele tenha disparado”, indicou em uma entrevista por rádio.

Nisman enviou sua última mensagem por WhatsApp no sábado às seis da tarde. Era uma foto de sua mesa enviada a Waldo Wolff, vice-presidente da Delegação de Associações Israelitas Argentinas (DAIA). Era possível ver uma mesa repleta de documentos e 15 marca-textos amarelos. Estava trabalhando na denúncia que ia apresentar no Congresso na segunda-feira.

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