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Cristina Kirchner teme uma explosão social na Argentina

A presidenta diz que não se surpreenderá se ocorrerem saques durante sua viagem para o Vaticano e para Nova York

Alejandro Rebossio
Saques cometidos na Argentina em dezembro de 2012.
Saques cometidos na Argentina em dezembro de 2012.REUTERS

Na memória de todos os argentinos, dezembro de 2001 ficará para sempre como o mês em que a economia, a política e a situação social do país entraram em colapso. Época de saques e panelaços. Já em dezembros anteriores àquele, os piqueteiros (grevistas que protestavam contra o desemprego superior a 20% com bloqueios a estradas) costumavam ir aos supermercados pedir comida para festejar o Natal, mas o de 2001 acabou em confusão porque a crise era total e alguns opositores do então Governo de Fernando de la Rúa estavam por trás dos movimentos. Nos dezembros mais recentes, de 2012 e 2013, anos de crescimento baixo e inflação em torno de 25%, sem comparação com o desastre de 2001, alguns saques voltaram a ocorrer. Não é à toa, portanto, que agora que a economia se contraiu por alguns meses e a inflação subiu ainda mais, a presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, tenha começado a alertar, nas últimas semanas, de que algo poderá acontecer em dezembro.

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Mas no último sábado, a chefe de Estado antecipou seu mau agouro. Enquanto seu filho Máximo Kirchner debutava, aos 37 anos, como orador em um ato político em um estádio de Buenos Aires, ela, na Quinta dos Olivos (residência presidencial) avisava pelo Twitter que não estranharia se seus opositores organizarem uma “explosão” social nos próximos dias. Na quinta-feira, ela viaja para visitar novamente o papa Francisco e depois segue para Nova York para o discurso anual diante da Assembleia Geral da ONU.

A situação econômica da Argentina não é das melhores, ainda que não possa ser comparada com a de 2001 nem com a recessão sofrida por causa da crise mundial de 2008 e 2009. Apesar disso, o país enfrenta desde julho passado uma crise de dívida, e a inflação está subindo para os 40% ao ano, segundo o índice das províncias citadas pelo centro de pesquisa da ala kirchnerista da Central de Trabalhadores da Argentina (CTA), em seu mais recente relatório – o maior índice registrado durante Governo de Cristina Kirchner. Na última quinta-feira, cerca de 4.000 moradores de bairros mais pobres cruzaram Buenos Aires de ponta a ponta para marchar contra a “fome”, mas o panorama, apesar de estar piorando, está longe de se parecer com o que ocorria antes dos 11 anos de kirchnerismo. A taxa de desemprego é de 7,5%, e, até 2013, antes da crise de 2014, a pobreza atingia 25% da população. No entanto, em agosto passado, três das cinco centrais sindicais, identificadas com a oposição, organizaram a terceira greve geral contra Kirchner em sua gestão – a segunda neste ano.

Depois daquela paralisação, a presidenta previu que em dezembro alguns opositores iriam querer “criar um clima para tentar mostrar que as coisas estão horríveis”. Ou seja, novos saques. Os de 2013 foram facilitados pela greve dos policiais provinciais, muitos dos quais incentivaram a confusão.

O Governo e a oposição da Argentina especulam sobre saques como os de dezembro de 2012 e 2013

Às previsões da líder argentina se somou, na semana passada, um comentário polêmico do chefe de uma das principais centrais operárias da oposição, Luis Barrionuevo, cujos seguidores já protagonizaram diversas confusões. “A presidenta disse (em 2012) que se a inflação chegasse a 25%, a Argentina iria explodir. Ela disse isso e vamos chegar a 40% de inflação. Quem anunciou o que vem por aí foi a própria presidenta”, soltou Barrionuevo na televisão. O chefe de Gabinete, Jorge Capitanich, o acusou pelo suposto crime de incentivar saques, e, na última sexta-feira, por causa dessas declarações, um juiz deu ordens para que Barrionuevo preste depoimento como testemunha em um processo sobre os distúrbios de 2013, nesta quinta-feira.

No sábado, Kirchner publicou uma enxurrada de mensagens no Twitter: “Ontem estava pensando que não me espantaria se eles resolverem armar uma espécie de prévia do espetáculo de dezembro durante os dias em que viajarei a Roma a convite do papa Francisco ou durante a semana em que estarei na ONU”. A presidenta aproveitou para confirmar que se reunirá com o magnata norte-americano de origem húngara George Soros, que é credor de títulos públicos da Argentina e que processou o de pagamento desses bônus, The Bank of New York Mellon, e não Buenos Aires, pela não recuperação desses títulos. O banco resistiu à movimentação do dinheiro por causa do bloqueio judicial dos Estados Unidos.

A líder peronista também criticou declarações dadas no próprio sábado ao jornal La Nación por seu correligionário mas opositor Eduardo Duhalde, que presidiu a Argentina depois da crise de dezembro de 2001, entre 2002 e 2003. “Os estopins ocorrem sempre em dezembro porque muita gente tem só o mínimo para comemorar”, afirmou Duhalde. “Plop!”, comentou Kirchner, que costuma utilizar expressões coloquiais em seus discursos, nesse caso para indicar que caía de costas diante do comentário de Duhalde. “Sempre há organizadores”, continuou o ex-presidente. “Chocolate por la noticia”, zombou a atual chefe de Estado, em uma expressão típica argentina que ironiza uma informação que já é conhecida por todos. Ela também citou outro artigo posterior no qual Barrionuevo antecipava que, nesta semana, se reunirá com o chefe de outra central sindical de oposição, Hugo Moyano, para avaliar se organizam uma nova greve, a terceira do ano.

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