_
_
_
_
_
Análise
Exposição educativa de ideias, suposições ou hipóteses, baseada em fatos comprovados (que não precisam ser estritamente atualidades) referidos no texto. Se excluem os juízos de valor e o texto se aproxima a um artigo de opinião, sem julgar ou fazer previsões, simplesmente formulando hipóteses, dando explicações justificadas e reunindo vários dados

Lula já ganhou

As candidatas Dilma Rousseff e Marina Silva se valem de seu mito de origem para conquistar votos

Juan Arias

Duas mulheres, as principais candidatas às eleições presidenciais, Dilma Rousseff e Marina Silva, disputam entre si o mito do ex-presidente Lula. Ambas foram ministras em seus mandatos e militaram no PT, o partido fundado pelo ex-sindicalista. Dilma Rousseff continua nele ainda, mesmo tendo chegado depois de sua fundação. Marina Silva saiu depois de ter trabalhado com ele por 26 anos.

As duas mulheres, formadas em Universidade —Rousseff, economista, e Silva, historiadora—, disputam entre si as graças de seu antigo chefe, um torneiro mecânico sem estudo.

Em 2010, Lula escolheu Rousseff, então ministra da Casa Civil, como sua sucessora. E já naquelas eleições Rousseff enfrentou a ambientalista Silva. Ambas tinham já duelado no Governo Lula. Ele diz que ambas são mulheres e líderes políticas nascidas sob suas asas. Por isso, ainda que se enfrentem nestas eleições e apesar de Lula estar ajudando sua escolhida, ele diz que não atacará a adversária, considerada por alguns um Lula de saias.

As duas, Dilma e Marina, se valem de seu mito original. A presidenta se apresenta aos eleitores mostrando as conquistas não só de seu Governo como também as dos Governos Lula, como se fossem suas. Sabe que sem ele perderia identidade e votos.

Marina usa a bandeira do lulismo quase para indicar que ela tem maior legitimidade dentro do PT, do qual participa praticamente desde criança. Ela seria herdeira daquele partido que, segundo Lula confessou, deverá ser refundado, porque se transformou em um partido a mais, enquanto tinha nascido para ser "diferente". Deveria ter sido o partido que trazia a essência da ética à política. Marina se sente herdeira do PT das origens?

E Dilma, que entrou já tarde no PT, vinda dos seguidores de Brizola, será que pode dizer que não compactuou com as práticas posteriores do partido que, segundo Lula, devem ser revistas para voltar à sua pureza original? Será por isso que, em um certo PT, alguns torcem o nariz para Dilma ainda hoje?

A verdade é que as duas políticas necessitam curiosamente do mito de Lula para melhor se vender ao eleitorado. E estão fazendo isso. Marina se ampara em Lula para rebater Dilma quando é atacada por ela. Às acusações de querer entregar o Brasil aos banqueiros, a ecologista recorda Dilma que os bancos nunca ganharam tanto como nos Governos de Lula, algo que ele mesmo afirmou mais de uma vez. E acusou sua concorrente de usar contra ela a arma do medo, como tinha feito em 2002 com Lula que, por sua vez, já disse que não pensa em atacar sua ex-ministra do Meio Ambiente. Lula considera que sua biografia inclusive se parece mais à de Marina do que à de Dilma. Os dois foram mordidos pela pobreza em sua infância, enquanto a Presidenta desfrutou do conforto de uma família bem situada. As duas mulheres se rifam a Lula, a seu carisma e a sua força eleitoral, enquanto o ex-metalúrgico já confessou querer voltar a entrar na disputa em 2018: "Terei então 72 anos e não vou permitir que voltem ao poder os que nunca fizeram nada por este país em 500 anos", disse referindo-se sobretudo a seus eternos adversários do PSDB.

De alguma forma, o vencedor já é Lula. As duas mulheres que, se não houver surpresas, vão disputar voto a voto o Planalto, são mulheres suas, alimentadas em seu seio. Ganhe quem ganhar, ele terá triunfado. Se for Dilma, porque foi sua escolhida; se for Marina, porque poderia ter sido também ela a preferida. Ambas, realmente, levam nas veias o DNA do PT.

Lula não é um político de derrotas e é capaz, como ele mesmo já destacou, de "metamorfosear-se" para cair em pé diante de qualquer acontecimento.

Explica-se assim a perplexidade de muitos especialistas políticos que não entendem porque o ex-presidente não se dedica mais de corpo e alma à campanha de sua escolhida, Rousseff, ao mesmo tempo em que também não está disposto a fazer guerra contra Marina, que pode dar um susto em Dilma.

Explica-se. Quem quer que vença, mesmo que seja Marina, ele não perde. Qualquer uma delas permanecerá apenas quatro anos no poder. Dilma por exigências legais, e Marina porque deseja mudar a lei. Assim, ambas preparam o caminho para sua possível volta.

Se Marina já informou que gostaria, em caso de vitória, de contar com Lula em seu Governo, por que não pensar que em um hipotético novo Governo de Lula, Dilma e Marina poderiam voltar a ser suas ministras?

Afinal, a política está precisando de um pouco de suspense de novela.

E se, ao contrário, tudo isso fosse mais realidade do que ficção?

Nada, na política, acaba sendo mais inverossímil, inesperado, incrível e até absurdo do que a realidade dos fatos.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_