‘Dream team’ de Temer, equipe de Meirelles tem primeira derrota na Câmara
Renegociação de dívidas é desfigurada após pressão de trabalhadores e de deputados
Chamada de dream team da gestão interina de Michel Temer (PMDB), a equipe econômica do Governo federal teve sua primeira derrota na madrugada desta quarta-feira na Câmara dos Deputados. O projeto de renegociação de dívida, considerado prioritário dentro do pacote de ajuste fiscal elaborado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi completamente desfigurado e deixou de contar com uma série de medidas que ele considerava fundamentais.
Os deputados não resistiram às pressões de sindicatos e associações de servidores públicos e de parte dos governadores que entendiam que as contrapartidas colocadas no projeto de lei complementar 257/2016 eram difíceis de serem cumpridas. Os pontos mais polêmicos eram: 1) os que alteravam a lei de responsabilidade fiscal (este poderia resultar em demissão em massa no Judiciário); 2) o que impedia a concessão de reajuste salarial a servidores por até dois anos e; 3) o que proibia as unidades da federação a realizarem concursos públicos. Todas essas medidas deixaram de existir após longas negociações entre deputados da base e o Palácio do Planalto. Um dos argumentos dos deputados era de que essas medidas ferem a autonomia dos Estados.
Henrique Meirelles, no entanto, era contrário a essas mudanças, mas foi obrigado a acatá-las. As tratativas foram feitas diretamente com o presidente Temer e com o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. Se o projeto fosse mantido dessa maneira, ele corria sério risco de não ser aprovado, segundo quatro deputados da base governista relataram ao EL PAÍS. “Ninguém aqui é louco de votar contra trabalhador do jeito que queriam que fizéssemos”, afirmou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
Uma das poucas contrapartidas que os Estados terão de cumprir para terem suas dívidas junto à União renegociadas pelo período de 20 anos é a de impedir que seus gastos previstos no orçamento não supere a inflação dos últimos 12 meses. E foi esse o argumento usado pelo ministro da Fazenda para amenizar seu revés. “O importante é que o teto foi aprovado. Essa sim é a contrapartida. Isso é o fundamental”, disse após uma reunião com empresários e parlamentares, em Brasília.
Aliado de primeira hora do Governo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, seguiu na mesma linha. “O importante foi superar as dúvidas e pressões e garantir o que há de mais importante nessa matéria, que é a garantia do congelamento de gasto global dos Estados pela inflação”.
Apesar dos discursos, economistas avaliaram que o Governo teve de ceder bem mais dos esperava nesse momento. “O processo político ainda está conturbado, enquanto o impeachment da Dilma [Rousseff, presidente afastada] não terminar de ser votado, o governo ainda fica refém para não desagradar tanto os políticos. Além disso, tem o peso político das eleições municipais deste ano também”, avaliou o professor do IBMEC e estrategista da JK Capital, José Kobori.
Na análise dele, a manutenção dos gastos iguais à inflação não significa nenhuma economia. “Os políticos vivem em outra realidade. Nenhuma empresa pode gastar mais se não tem resultado positivo. O Estado só poderia aumentar gastos se evoluísse sua receita, caso contrário, pode-se aumentar o déficit, que já é alto”, afirma Kobori.
Especialista em contas públicas, Felipe Salto lamentou a redução das contrapartidas. “Nada mais justo do que exigir mudanças estruturais que aperfeiçoem o equilíbrio fiscal. Na ausência do limite para o gasto do pessoal, quem vai pagar a conta desse ajuste são os investimentos. Os governos vão continuar sujeitos a pressão das burocracias locais”.
Salto afirmou ainda que, nos próximos meses, o Governo terá de mostrar um projeto firme que traga mudanças efetivas pois corre risco de perder apoios. “Temer tem o dream team, mas a gordura da credibilidade dessa equipe está sendo queimada e não vai demorar muito para o mercado colocar o Governo na parede”, analisou.
O próximo teste de fogo de Temer na área econômica é a PEC do Teto de Gastos. Para não se arriscar tanto, a votação só ocorrerá depois das eleições municipais de outubro. Temer já poderá, então, se expor a enfrentar rompantes de impopularidade (partindo de números frágeis uma vez que apenas 14% aprovam o Governo) sem se preocupar com a saúde eleitoral dos deputados aliados e dele próprio, que, ao que tudo indica, já terá deixado para trás o impeachnent.
Com informações de Heloísa Mendonça.
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