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O fim simbólico dos Kirchner

Decisão de retirar retratos da Casa Rosada é parte de um processo de ‘deskirchnerização’

Galeria na Casa Rosada com Néstor Kirchner, Chávez, Che Guevara e Allende.
Galeria na Casa Rosada com Néstor Kirchner, Chávez, Che Guevara e Allende.R. Ceppi
Carlos E. Cué

Entrar na Casa Rosada durante o Governo de Cristina Fernández de Kirchner era uma experiência e tanto. A ex-presidenta organizava grandes comícios nos pátios deste edifício histórico, sede do Governo argentino, com milhares de militantes que literalmente tomavam o palácio. Havia jovens, bebês e mães amamentando nos corredores, crianças brincando de correr e lanchando.

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Ao seu redor estava a Galeria dos Patriotas Latino-Americanos, com 40 retratos de personalidades como Che Guevara, Hugo Chávez, Juan Domingo e Evita Perón, Salvador Allende, Augusto Sandino, Tupac Amaru e, em lugar destacado, Néstor Kirchner, falecido marido da ex-presidenta. Tudo era pensado para dar a ideia de que o povo kirchnerista havia tomado o poder. Os militantes se foram, mas os quadros ficaram. E agora o Governo do liberal Mauricio Macri precisa encará-los todos os dias.

A decisão de retirá-los já foi tomada, segundo fontes do Executivo, num processo de deskirchnerização dos símbolos que incluirá também o dinheiro. Os Kirchner haviam colocado na nota de 100 pesos, a mais usada, a efígie de Evita Perón, que Macri substituirá por uma taruca, um cervo andino ameaçado de extinção. Em outras notas, de 200, 500 e 1.000 pesos, haverá baleias, uma onça e um joão-de-barro, pássaro nativo.

Macri ainda não anunciou quando vai retirar os retratos de Kirchner e Chávez da Casa Rosada. A informação oficial é de que o Governo está fazendo um inventário de todas as obras que há no edifício. A realidade é que o Executivo busca a hora e a maneira adequadas para não causar muito ruído. Mas a convivência do Che e de Chávez com Macri não durará muito.

Néstor Kirchner ficará com um busto no salão dedicado aos ex-presidentes, onde também aparecerá em algum momento a figura de Cristina, mas outros quadros sairão.

A convivência do Che e de Chávez com Macri não durará muito

Há outras imagens chamativas. Macri dá suas entrevistas coletivas ao lado de um desenho em homenagem a Rodolfo Walsh, jornalista e militante do grupo esquerdista Montoneros assassinado pela ditadura em 1977 – outro personagem muito distante de tudo o que o novo presidente representa.

A Casa Rosada não é o único lugar onde isso acontece. Entrar em qualquer ministério argentino significa cruzar com fotos e retratos dedicados a Perón, Evita e os Kirchner. A maioria permanece ali, mas os macristas dão como certo que sairão.

A Argentina é o país dos símbolos. Apaixonados por sua própria história, seus cidadãos vivem com entusiasmo cada polêmica sobre o passado. Macri rompeu esquemas ao inaugurar uma estátua de Perón em plena campanha. Procurava o voto peronista e a superação de preconceitos.

Outra cena marcou o mandato do Néstor Kirchner: a retirada do quadro do ex-ditador Jorge Rafael Videla do Colégio Militar, numa cerimônia comandada pelo então presidente em 2004. Ficou na memória nacional a sua voz firme ao ordenar com um “proceda” ao chefe do Exército que retirasse a imagem.

Mas a Argentina também é um lugar de confronto para quase tudo. Quando os Kirchner lançaram a nota de 100 pesos dedicada a Evita, em 2012, ano do 60º. aniversário da sua morte, muitos comerciantes antiperonistas não quiseram aceitá-la. O Banco Central ameaçou multá-los.

A guinada política atual não altera essa paixão dos argentinos por se dividirem. Nesta semana, o próprio Macri precisou pedir no Twitter aos seus seguidores que não boicotassem a estreia da nova série televisiva La Leona. Os antikirchneristas se mobilizaram contra ela porque é protagonizada por Pablo Echarri e Nancy Duplaa, dois dos atores que mais apoiaram a ex-presidenta.

A mais recente guerra diz respeito ao gabinete que será ocupado no Congresso pelo deputado Máximo Kirchner, filho de Néstor e Cristina. Na Argentina se briga por cada metro, cada símbolo, numa espécie de empate eterno que só as eleições alteram ligeiramente.

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