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A vida dos sírios entre o Estado Islâmico e as bombas da guerra civil

Habitantes de Raqqa (Síria) sofrem o controle jihadista e os ataques para combatê-los

Natalia Sancha
Miliciano com uma bandeira do EI em Raqqa (Síria).
Miliciano com uma bandeira do EI em Raqqa (Síria).REUTERS

“Os controles do Estado Islâmico impedem que qualquer um saia da cidade”, diz via Skype Abu Ahmed, coordenador do grupo Raqqa Está Sendo Silenciosamente Massacrada (Raqqa SL). Na quarta-feira passada, depois da intensificação dos bombardeios como represália pelos atentados de Paris, o EI fechou todas as LAN houses. Os quase 500.000 moradores que permanecem nessa cidade síria estão desconectados do resto do mundo.

Em terra, vivem submetidos às leis do Califado. Do ar, caem as bombas da aviação russa, síria, norte-americana e francesa. Seus habitantes mal dispõem de alguns minutos por dia para tranquilizar seus familiares que, de fora, aguardam notícias. “Agora só espero uma mensagem por noite”, confirma Anuar, um economista refugiado na Turquia. “Os jihadistas vivem no meio da população local, por isso são civis que morrem pelas bombas”, lamenta Mahmoud, médico de Raqqa que hoje vive como refugiado na Noruega.

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Em junho de 2014, ninguém imaginava que o líder do EI, Abubaker al Bagdadi, escolheria Raqqa como capital do seu peculiar reino do terror. “Deixamos de ser um borrão no mapa e viramos a Nova York síria”, ironiza o jovem médico sobre a maciça chegada de combatentes estrangeiros.

“O EI foi regulando todos os âmbitos da vida social e privada até controlar absolutamente tudo”, relata Abu Ahmed. Primeiro, os milicianos fecharam as lojas que vendiam álcool ou tabaco. Depois, estabeleceram a reza obrigatória, e depois a vestimenta oficial: véu para as mulheres, barba para os homens. “A hisbah (polícia islâmica) se encarrega nas ruas de que suas leis sejam cumpridas, e criaram as jansa, um corpo específico para controlar as mulheres", conta Mahmoud.

O EI implanta sua sociedade sonhada através de tribunais islâmicos que impõem suas leis com chibatadas, decapitações ou lapidações de homossexuais e adúlteras. Encruzilhadas de tráfego outrora movimentadas se transformaram em abatedouros para castigos exemplares.

Essa realidade está presente também em Deir Zor, 140 quilômetros a sudeste de Raqqa. Apenas três bairros e o aeroporto militar continuar nas mãos do regime de Bashar al Assad. Enquanto milhares de jovens fogem em direção à Europa para evitar o serviço militar na zona leal ao ditador, outros tentam escapar das decapitações do EI. “Fugir do califado é caro. Até 200 euros [800 reais] por pessoa, por isso os mais pobres não têm escapatória”, diz por telefone o mecânico Bilal, moradores de Deir Zor refugiado na Turquia.

Milhares de jihadistas estrangeiros fazem o caminho na direção do califado. E entre os moradores que restam nem todos discordam da sua nova vida. “Vive-se melhor nas zonas do EI do que nos bairros controlados por Assad, onde se morre de fome”, defende Bilal, que fugiu dos bombardeios.

O EI também controla as futuras gerações. Em Tabqa, 55 quilômetros ao oeste de Raqqa, o grupo criou o primeiro acampamento de treinamento jihadista para meninos de 10 anos. Segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos, 1.100 menores de 16 anos já foram recrutados. Alguns são treinados para operações suicidas. “Pagam entre 235 e 328 euros [930 a 1.300 reais] por filho por mês”, afirma a Raqqa SL, acrescentando que algumas famílias se viram obrigadas a entregar a um filho para poder alimentar os outros.

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