Parlamento grego aprova o resgate apesar de cisão no Syriza
Metade da direção do Syriza, o partido do Governo, rejeita o acordo firmado por Tsipras
O primeiro-ministro Alexis Tsipras comprovou nesta quarta-feira o alto preço a pagar para manter a Grécia atrelada ao euro. No entanto, conseguiu aprovar o acordo para negociar um novo resgate, por 229 votos a favor, graças à maioria de seu partido, o Syriza, a seu aliado de Governo e a três partidos da oposição, e 64 contra, sendo 32 de suas próprias fileiras (incluindo o de Yanis Varoufakis) e seis abstenções, também do Syriza. Com esse racha, o Governo fica em uma posição muito frágil. Tsipras voltou a defender um acordo “ruim”, mas inevitável.
Enquanto os cidadãos faziam as contas para saber o que significará o aumento imediato do IVA – no mínimo, um aumento de 720 euros ao ano por família – , uma das leis que o Parlamento grego aprovou já na madrugada de quarta-feira para franquear o terceiro resgate, o primeiro-ministro Alexis Tsipras fazia outros cálculos: quantas baixas iria lhe custar a aprovação de um acordo em que não acredita, mas que se viu obrigado a aceitar, e se, apesar do respaldo da oposição, sairia ileso, com seu partido mais ou menos inteiro, da sessão plenária mais decisiva em décadas. Finalmente, 38 de seus 149 deputados se mostraram contra o acordo (32 nãos e seis abstenções). Um deputado do Syriza não foi à votação.
As renúncias de altos funcionários – dois diretores do Ministério de Finanças, entre eles a vice-ministra Nadia Valavani, renunciaram “por ser impossível discordar de uma medida do Governo e pretender continuar nele” – e nas fileiras de seu grupo parlamentar faziam pressagiar já durante a jornada um severo golpe para Tsipras, e uma cisão talvez irreparável no Syriza, apesar das declarações de Panayotis Lafazanis, ministro da Reconstrução Produtiva, Energia e Meio ambiente e líder da Plataforma de Esquerda, o bastião radical do Syriza, de que ele e seus deputados votariam contra as medidas, mas continuariam apoiando o Governo. O próprio Lafazanis votou contra o acordo.
Horas depois de Tsipras admitir em uma entrevista na televisão que não existem alternativas a esse “acordo ruim” ou uma saída desordenada do euro, e em meio a um ambiente tumultuado por várias greves e manifestações – que terminaram em incidentes entre manifestantes e polícia – , os comitês parlamentares correspondentes deram luz verde ao texto, que foi levado à sessão plenária, onde em um acalorado debate foram aprovadas as medidas exigidas pelos parceiros para negociar um novo resgate graças ao apoio dos três partidos da oposição pró-europeia (conservadores, socialistas e liberais). Estes, porém, não pouparam críticas ao Governo durante a sessão. Panos Kamenos, líder do partido que forma a coalizão com Tsipras, pediu apoio ao Executivo: “Se o Governo cair, não haverá esperança para a Grécia, não haverá esperança para a Europa”.
Um programa em duas partes
O pacote legal cuja aprovação a zona do euro impôs como condição para a Grécia negociar o terceiro resgate chega nesta quarta-feira ao Parlamento de Atenas dividido em dois artigos.
O primeiro é a ratificação do texto aprovado na segunda-feira na cúpula de Bruxelas, em que se estabelecem as condições para iniciar as negociações.
O segundo inclui mudanças e aumentos no regime do IVA, novas medidas tributárias, o fortalecimento do tratamento penal da evasão fiscal, a reforma nas pensões e na Previdência Social, a garantia da independência do instituto de estatísticas grego, assim como a criação de uma autoridade encarregada de prevenir desvios nas metas fiscais definidas.
O Eurogrupo analisará na quinta-feira se foram cumpridos os requisitos pactuados com a Grécia na segunda-feira.
O aviso mais sério ao primeiro-ministro não veio de seu grupo parlamentar, mas do comitê central do Syriza, que na manhã de quarta-feira rechaçou o acordo por maioria absoluta (109 votos em 201, entre eles quatro membros do Governo) e pediu sem êxito a Tsipras que o retirasse. A declaração rebelde acusa Bruxelas de “atentar diretamente contra qualquer noção de democracia”.
Christos Kasimis, assessor do ministro Lafazanis e dirigente da Plataforma de Esquerda, explicava com outras palavras durante a conturbada manifestação contra o acordo em frente ao Parlamento: “Não é só a Plataforma que está contra, mas muitíssimos outros no Syriza. Esse memorando é três vezes pior que o primeiro, não podemos aceitá-lo porque, além do mais, vai contra a vontade do povo. Por isso a única alternativa é uma saída do euro. Tsipras lutou muito, sabemos, mas foi derrotado”, afirmou.
Tsipras reconheceu diante de seu grupo parlamentar que tinha esgotado até a última possibilidade de solução. “Negociamos da melhor forma que pudemos (…). Mas estou aberto a qualquer alternativa realista que possa ter me escapado”, disse, insistindo que seus deputados mantenham a união. “Ou estamos todos juntos esta noite ou amanhã será difícil continuar sendo primeiro-ministro”, acrescentou, segundo veículos de imprensa locais.
Já durante o debate parlamentar, Tsipras ressaltou que só havia três opções na cúpula europeia: o pacto alcançado, uma quebra desordenada, ou o plano de desligamento temporário do euro proposto pelo ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble. “Não vou dourar isso, nem vender como uma história de êxito, mas também não vou fazer a nossos oponentes políticos o favor de ser um breve parêntese no tempo”, disse o primeiro-ministro, que prometeu que seu Governo fará “o impossível para pôr as coisas em ordem” no país.
Muitos na facção majoritária de Tsipras consideram inevitável não a ruptura do partido, mas a convocação quase imediata de eleições. “Este Governo não tinha opções, porque não foi um processo de negociações, mas sim de humilhação”, explica o historiador e eleitor Angelos Vlacos. “A decisão de Tsipras foi dramática, e fará o partido amadurecer de forma dolorosa. Com sua responsabilidade, ganhou preponderância moral, mas para mim está claro que haverá eleições em alguns meses. O Syriza não vai ser o mesmo partido depois de hoje, mas se a convicção e a responsabilidade de Tsipras convencerem os cidadãos, o partido poderá desligar-se de seus elementos mais radicais e ideológicos – que talvez criem um partido próprio – , e arrastar muita gente que acredita, como boa parte da oposição, que Tsipras hoje é o único capaz de levar isso adiante”.
Presidenta do Parlamento pede “repúdio à chantagem”
Polêmica e excessivamente detalhista nas formas e nos procedimentos, a presidenta do Parlamento grego, Zoi Konstandopoulou, representante da ala radical do Syriza, defendeu nesta quarta-feira que os deputados repudiem a “chantagem” da União Europeia, poucas horas antes da votação do princípio de acordo que facilitará a negociação do terceiro resgate com os parceiros através do Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira. “Este Parlamento não deve assinar a chantagem dos credores”, disse Konstandopoulou, a quem muitos na Grécia –e no Syriza – criticam por causa dos seus lapsos chicaneiros e das garantias formais que sempre oferece ao grupo parlamentar dos neonazistas da Aurora Dourada (17 cadeiras).
Segundo Konstandopoulou, que desde o início foi contra um novo resgate que implicasse em mais medidas de austeridade, é um dever dos parlamentares gregos evitar que se materialize esse pacto “ignóbil” entre o Governo de Atenas e seus credores internacionais. A presidenta – a terceira autoridade do país depois do presidente da República e de Tsipras – atrasou a tramitação, pela via de urgência, das ações prioritárias demandadas pelos parceiros.
Na votação parlamentar que aprovou a realização do referendo, em 27 de junho, Konstandopoulou protagonizou um incidente com a bancada conservadora, que a criticou duramente por abandonar sua cadeira para tomar a palavra no púlpito como simples deputada do Syriza, depois do que pretendeu continuar presidindo a sessão. Os conservadores abandonaram o plenário como protesto, e o próprio Tsipras teve de lhe chamar a atenção. Konstandopoulou se desculpou.
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
¿Tienes una suscripción de empresa? Accede aquí para contratar más cuentas.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.