Seis pessoas são torturadas por dia no Brasil
Relatório da HRW condena a letalidade policial e diz que é necessário criar novas medidas para combater os abusos crônicos
O relatório anual da ONG Human Rights Watch (HRW) revelou que diariamente seis pessoas são vítimas de tortura no Brasil. A maioria delas, 84%, estão em penitenciárias, delegacias e unidades de internação de jovens. Os dados divulgados como um capítulo do relatório mundial da entidade, são baseadas nas denúncias recebidas pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos. De janeiro de 2012 a junho de 2014 foram relatados 5.431 casos de tortura.
Para a HRW, uma das razões para isso ocorrer é a falta de punição dos agressores. "Mais do que uma herança da ditadura militar a tortura é uma herança da impunidade. O agente sabe que não será punido, por isso tortura", afirmou a diretora da HRW no Brasil, Maria Laura Canineu.
Outro motivo que, conforme a ONG, estimula a tortura é a superlotação carcerária, impulsionada pelo encarceramento massivo. Com mais de meio milhão de presos, o Brasil está com 37% a mais de detentos do que comporta. O fato de presos provisórios (que ainda não foram julgados) dividirem espaço com condenados também influenciaria na falta de controle dos presídios e, consequentemente nos seguidos casos de tortura registrados.
“A ausência do Estado, a falta segurança e a ociosidade nos presídios favorecem a criação de organizações criminosas e só piora a situação desses espaços”, analisou Canineu.
No relatório do ano passado, a HRW já havia citado essa preocupação com a superlotação dos presídios. De lá para cá, poucos avanços foram notados. Segundo a organização, o projeto de lei 554/11 que prevê mudanças na audiência dos presos seria uma das saídas para reduzir a lotação dos presídios e evitar a ocorrência da tortura. Conforme essa proposta legislativa, todo suspeito que for detido tem que ser ouvido por um juiz em um prazo razoável, que seria de 24 horas. Atualmente, não há essa delimitação de tempo, a HRW encontrou casos excepcionais em que um homem detido por receptação de produtos roubados demorou três meses para se encontrar com um magistrado. Nesse tempo, dividiu uma cela com bandidos condenados e membros de facções criminosas.
Na visão de Canineu, o que faltam são mudanças estruturais, na qual os presos sejam respeitados e tenham condições de retornar em segurança para a sociedade após cumprirem suas penas.
Violência policial
Outra crítica no relatório da HRW é o alto índice da letalidade policial. Em dois dos principais Estados brasileiros a ONG registrou preocupantes aumentos de mortes ocasionadas por policiais. No Rio de Janeiro, o aumento foi de 40% e em São Paulo, de 97%, nos três primeiros trimestres de 2014 em comparação com o mesmo período do ano passado. “Tanto o Rio quanto São Paulo tomaram medidas importantes para reduzir essas mortes. Mas elas estão longe de serem necessárias”, disse Canineu.
No Rio, o Governo implantou o pagamento de prêmios para o cumprimentos de metas. Em São Paulo, os policiais foram proibidos de socorrer vítimas de supostas trocas de tiros. Neste caso, o objetivo era evitar que os suspeitos baleados fossem torturados ou assassinados no caminho para o hospital.
A mesma violência se replica na repressão aos protestos sociais. De acordo com a ONG, um exemplo disso é na prisão ou na agressão contra jornalistas. Um levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo concluiu que 178 jornalistas que cobriam as manifestações de 2013 e 2014 foram presos ou feridos. Houve ainda um caso de homicídio, o do cinegrafista Santiago Andrade, morto no Rio após ser atingido por um rojão.
Mais cobranças
No relatório divulgado nesta quinta-feira, a HRW cobrou ainda que as autoridades atuem no combate à violência sofrida por homossexuais, que registraram mais de 1.500 casos de agressões em 2013, e no direito reprodutivo, autorizando a realização de abortos legais.
A HRW também disse que de 2014 foi histórico para o Brasil pois foi o ano em que a Comissão Nacional da Verdade publicou seu relatório apontando parte dos culpados pelos abusos cometidos durante a ditadura militar (1961-1985). Por outro lado, a entidade cobrou que Governo puna os militares e colaboradores responsáveis pelos crimes mesmo diante de uma lei da anistia. “No nosso entendimento, não é necessário haver uma revogação em si da lei da anistia para se punir quem agiu no regime militar. O Chile puniu seus agressores, mesmo com uma lei da anistia. Entendemos que a anistia não é aplicável para crimes contra a humanidade”, ponderou a diretora.
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