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O desafio migratório de Obama

Presidente dos EUA reitera sua intenção de publicar um decreto contra as deportações

Silvia Ayuso
Manifestação em Miami contra as deportações de imigrantes sem documentos.
Manifestação em Miami contra as deportações de imigrantes sem documentos.JOE RAEDLE (AFP)

“Go big”. A mensagem dos ativistas hispânicos a Barack Obama depois das eleições legislativas é bastante clara: como o Congresso não permitiu – nem agora que passa para mãos republicanas parece que vai fazer – o avanço de uma reforma migratória integral, o presidente dos Estados Unidos não só deve cumprir de uma vez sua promessa de atuar por sua conta para pelo menos diminuir as deportações de imigrantes sem documentos. Além disso, deve “ser ousado”.

“Se o presidente atuar com audácia, unindo a políticas pró-imigrantes em nível estadual e local, a maioria das pessoas sem documentos poderá levar uma vida razoavelmente normal, sem medo da deportação, e tudo isso sem necessidade da atuação do Congresso”, raciocina America's Voice, um dos grupos mais ativos no movimento migratório.

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Frustrado pela negativa da Câmara de Deputados dominada pela oposição republicana de votar a reforma migratória que já foi aprovada pelo Senado em 2013, Obama anunciou publicamente em junho que atuaria por sua conta, mediante ações executivas ou decretos, antes do final do verão para diminuir as deportações de imigrantes sem documentos, que em seu mandato alcançou cifras recorde.

Chegou, no entanto, setembro e, com a ameaça de perder o Senado nas eleições legislativas desta terça-feira, o presidente decidiu adiar qualquer medida até o final dos comícios. A nova data fixada: antes de acabar o ano. Em sua primeira aparição depois das eleições, na quarta-feira, o presidente voltou a reiterar que agir é um “compromisso” iniludível e que fará isto ainda em 2014. E só faltam dois meses para acabar o ano.

O mandatário, no entanto, continua sem revelar quais passos pensa dar, e não esclarece sequer o que recomendou seu secretário de Segurança Nacional, Jeh Johnson, que recebeu a ordem de revisar a política de deportações.

Analistas consideram que o mais provável é que girem ao redor da DACA, a bem-sucedida ação que ele ordenou em 2012 – pouco antes das eleições em que se reelegeu – e que beneficiou pouco mais de meio milhão de jovens sem documentos.

Em um artigo de opinião publicado no site da rede hispânica Univisión uns dias antes das eleições, os congressistas democratas Nancy Pelosi, Luis Gutiérrez e Zoe Lofgren defenderam a autoridade de Obama para agir, citando precedentes de presidentes anteriores, inclusive os republicanos Ronald Reagan e George Bush.

Os legisladores sustentavam também que o mandatário poderia deter as deportações de todas as pessoas que poderiam se beneficiar da proposta de reforma migratória aprovada pelo Senado. Quer dizer, até oito milhões. Claro que também apontaram alternativas mais modestas, como se concentrar em evitar a separação de famílias ou em dar garantias de não deportação aos trabalhadores do campo.

Depois da renovação de sua promessa de ação, há poucas dúvidas de que o presidente fará algo, desta vez. A dúvida é até onde ele vai se atrever a ir: se vai “ser ousado” para beneficiar até milhões de pessoas sem documentos, como pedem os ativistas e esses congressistas, ou se vai se limitar a fazer uma mudança cosmética para tentar se redimir frente a um eleitorado que pode ser chave nas eleições presidenciais de 2016, sem indignar muito alguns republicanos com os quais ainda terá que trabalhar durante os dois anos de mandato que ainda restam.

E estes já deixaram claro que vão considerar qualquer decreto como um afronta direta.

Em uma carta com data de 30 de outubro, os senadores republicanos John McCain, Marco Rubio e Lindsey Graham – três dos coautores da fracassada proposta de reforma migratória – advertiram a Obama que “uma ação unilateral do Executivo nesta matéria seria prejudicial para as tentativas de conseguir implementar as necessárias soluções políticas e legislativas, a longo prazo, para nosso falido sistema migratório”.

“Atuar usando uma ordem executiva em um tema desta magnitude constituiria a ação mais divisora que você poderia realizar e minaria todos os esforços de boa fé para agir neste tema tão importante”, insistiram.

O novo líder da maioria republicana no Senado, Mitch McConnell, disse de forma mais gráfica já na sua primeira entrevista coletiva desde a vitória conservadora nas eleições legislativas: Agir por sua conta em matéria migratória seria como “agitar uma capa vermelha na frente de um touro”, advertiu a um Obama que sabe que agora terá que negociar de forma mais dura com um Congresso em mãos opositoras.

Por enquanto, o presidente do Partido Republicano, Reince Priebus, já prometeu que vai brigar com unhas e dentes contra uma ação unilateral do Executivo.

“É inconstitucional, ilegal e não apoiamos. Faremos tudo que pudermos para assegurar que não haverá (uma ação executiva): vamos deixá-la sem fundos, iremos aos tribunais, emitiremos uma ordem restritiva. O que for necessário”, prometeu.

Uma ameaça que, segundo Marc Rosemblum, do Migration Policy Institute, deveria paradoxalmente convencer Obama a se atrever a tomar medidas mais amplas.

“O presidente não quer que seu legado em imigração seja o do deportador-chefe e isso sugere que poderia atuar de forma ousada”, raciocinou em uma recente palestra sobre o tema no think tank Diálogo Interamericano em Washington. Certo que isso poderia provocar “uma luta” política como a que já se desatou com sua reforma da saúde, “inclusive novas paralisações do governo”, reconheceu. “Mas por outro lado (os republicanos) vão ficar bravos de qualquer maneira, se o governo for ousado ou não, então por que se preocupar”.

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