Cinema espanhol viaja para São Paulo em busca de dinheiro
Capital cultural do Brasil homenageou a Espanha em sua 38ª Mostra Internacional de Cinema, uma oportunidade para produzir filmes que não saem do papel por lá
As diretrizes do Ministério da Cultura e Relações Exteriores em matéria cultural foram claras em 2013: “O Brasil é prioritário”. Um ano depois daquela advertência, São Paulo apresenta uma avalanche de ofertas culturais com sotaque espanhol, entre elas a 38ª Mostra Internacional de Cinema, que teve a Espanha como país convidado, Pedro Almodóvar como homenageado do ano, e os cenários mexicanos de Luis Buñuel como protagonistas de uma exposição fotográfica.
A Mostra Internacional de Cinema, além de ser uma vitrine privilegiada para exibir o cinema espanhol em um mercado crescente de mais de 27 milhões de espectadores, é a fórmula na qual a Espanha apostou para que seus produtores consigam levar adiante seus projetos. “Na Espanha, a ajuda para o cinema ficou muito centrada nas subvenções. Com cada vez menos orçamentos, nosso modelo sofre e é preciso revisá-lo, e a coprodução nos permite outra via de financiamento. O Brasil é prioritário pois investe em cinema como marca do país”, afirma Lorena González Olivares, diretora geral do Instituto da Cinematografia e das Artes Audiovisuais (ICAA).
Apesar do Brasil acumular dois trimestres com a economia em queda, o ambiente da delegação espanhola na sua visita a São Paulo era de entusiasmo. A indústria do cinema brasileiro, apoiada no mecenato com deduções fiscais para o patrocínio privado e com um aumento de quase 30% dos ingressos vendidos no último ano, está em um doce momento e a Espanha quer participar. “Os chamados BRICS são países prioritários para nós e o Brasil ainda mais, pelas enormes deduções fiscais oferecidas em produções cinematográficas”, afirma um representante da equipe de agentes culturais, diplomatas, produtores e diretores espanhóis que viajou para São Paulo para inaugurar o evento, encerrado no 29 de outubro.
Carles Pastor é um dos produtores que aterrissou na capital econômica e cultural do Brasil em busca de recursos para financiar Destino Perdido, um thriller sobre farmacêuticas dirigido por seu pai e que pretende filmar entre Espanha, Colômbia e Brasil. “O cinema depende das coproduções. É preciso um mercado maior para fazer com que os filmes sejam rentáveis, ainda mais no caso dos profissionais independentes”, disse o produtor, atuante na área desde 1998. “O Brasil é uma oportunidade porque é emergente e está investindo em cinema”. Pastor precisa de uma cifra com cinco zeros para que seu projeto saia do papel.
Entre os membros da delegação, havia também dois agentes de vendas com a missão de vender os direitos de filmes espanhóis para sua distribuição no país.
“No âmbito cinematográfico, o Brasil é um lugar de oportunidades para nós. Para mim essa mostra é uma vitrine importantíssima”, explica Lois Patiño, cujo primeiro longa-metragem Costa da Morte será apresentado em São Paulo depois de ter passado por 60 países. Patiño já conquistou o título de “jovem promessa” do cinema espanhol, ainda que tenha chegado em um momento no qual fazer um filme na Espanha “é um verdadeiro ato de heroísmo”, como disse o presidente da Academia Espanhola de Cinema, Enrique González Macho, nos Prêmios Goya. “Agora que o investimento na Espanha caiu muito, vemos o México, Colômbia e Brasil como exemplos em suas políticas audiovisuais. Aqui entendem a cultura como um valor, algo que se perdeu na Espanha”.
Desembarco cultural espanhol
Mesmo que a Espanha seja, há anos, um dos principais investidores do Brasil, seu interesse econômico não esteve acompanhado de um esforço cultural à altura. Esse ano, entretanto, existem ofertas espanhola de sobra em museus, cinemas e exposições.
Dos cinco curadores da Bienal de São Paulo, dois são espanhóis e facilitaram a presença de cinco artistas do país no evento artístico mais importante da cidade. A 38ª Mostra Internacional de Cinema apresentou 331 títulos, dos quais 42 são espanhóis. Entre eles, Hermosa juventud, de Jaime Rosales, que recebeu menção especial no último Festival de Cannes; Vivir és fácil con los ojos cerrados, de David Trueba, vencedor de seis Goya; e Las Brujas de Zugarramurdi, de Álex de la Iglesia. Pedro Almodóvar é o homenageado da mostra e uma exposição fotográfica sobre os cenários mexicanos dos filmes de Luis Buñuel pode ser visitada até o final do ano.
Após passar pelo Rio de Janeiro, uma antologia de Dalí chegou com pompa ao Instituto Tomie Ohtake e devolveu aos paulistanos seu gosto pelas filas dos museus (uma semana depois de sua inauguração já dá a volta no quarteirão). “A América Latina nos interessava muito, e sobretudo o Brasil porque não havíamos organizado nada até agora, Dalí era muito pouco conhecido. O instituto estava muito interessado na arte espanhola e nós queríamos voltar a levar Dalí para a região. Até agora, passou somente pelo Chile”, detalha Montse Aguer, curadora da exposição que precisou de cinco anos para ser organizada.
“O Brasil é um centro de atenção, tem uma boa infraestrutura cultural, gestores muito bons e estamos contentes de que nossa produção já esteja circulando por lá”, afirma Teresa Lizaranzu, presidenta de Ação Cultural e Diretora Geral de políticas e indústrias culturais do Ministério da Cultura. O desembarque espanhol, até os Jogos Olímpicos de 2016, deverá contar, entre outras, com uma exposição de Miró e uma Bienal espanhola de Arquitetura e Urbanismo.
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