_
_
_
_

A pequena Palestina uruguaia

Na fronteira com o Brasil, Chuy tornou-se um refúgio para comerciantes palestinos A localidade poderia ser o destino para os seis presos de Guantánamo que chegarão ao Uruguai

A avenida principal, que separa Uruguay de Brasil
A avenida principal, que separa Uruguay de BrasilM. M.

Na fronteira do Uruguai com o Brasil existe uma pequena cidade chamada Chuy que abriga uma comunidade de imigrantes palestinos. Este grupo, estimado em 500 pessoas – o número exato é difícil de calcular – vive do comércio e conta com instalações próprias, como um clube social e uma mesquita. O presidente uruguaio, José Mujica, dará refúgio a seis detentos de Guantánamo – quatro sírios, um palestino e um jordaniano – após um acordo com o seu homólogo norte-americano, Barack Obama, e eles podem ir morar em Chuy. Não se sabe a data exata da transferência.

A pequena cidade está situada a 340 quilômetros de Montevidéu, no departamento litorâneo de Rocha. A localidade consiste basicamente de uma avenida poeirenta repleta de lojas duty-free. Um dos lados da avenida pertence ao Uruguai, o outro, ao Brasil. Assim, para cruzar a fronteira, basta percorrer os escassos 12 metros que separam uma calçada da outra.

No lado uruguaio vivem cerca de 14.000 pessoas, e na área brasileira, cerca de 6.200. É deste lado da rua que fica a maioria dos comércios palestinos, grandes lojas abarrotadas com as mais variadas mercadorias. Os proprietários sentam-se na calçada para discutir o assunto do momento. Conversam em árabe, mas também falam uma mistura de espanhol e português, e bebem mate, a bebida típica do Uruguai.

Fahed Ahmad é dono de um enorme bazar de roupas e sapatos. Nasceu na Cisjordânia, mas passou 25 anos em Chuy. “Eu não tenho passaporte, não posso voltar”, é a primeira coisa que diz quando fala sobre suas origens. Ele e seus filhos têm nacionalidade brasileira, e sua vida ficou instalada para sempre numa fronteira.

Outros habitantes da área vivem em situação semelhante. É o caso de Esmat Omar, que se diz “nascido e criado em Jerusalém”, mas com passaportes brasileiro e jordaniano. Sua família é dona do Supermercado Londres e da loja de lingerie Freetime. Muitos desconfiam da imprensa e evitar falar do conflito em Gaza ou da chegada dos prisioneiros de Guantánamo ao Uruguai.

A viagem dos seis de Guantánamo para o lado uruguaio da chamada “fronteira seca” com o Brasil é uma possibilidade. Roberto Mantiel, funcionário do Ministério da Integração Social do Uruguai, acha que “seria um dos lugares onde se sentiriam mais cômodos”, e acrescenta que, caso fossem consultados, “optariam por isso”. Segundo testemunhas presentes em uma reunião entre representantes palestinos e o ministro das Relações Exteriores uruguaio, Luis Almagro, os comerciantes palestinos ofereceram ajuda e empregos aos egressos da base norte-americana.

Há alguns meses, chegou uma família que fugia do conflito na Líbia, não se sabe muito bem por que meios. O Governo uruguaio deu apoio até que o pai conseguiu um emprego em uma das lojas em Chuy. A ONG Serviço Ecumênico para a Dignidade Humana, que trabalha com a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) em Chuy, tem lidado com vários casos como este. A organização se recusa a fazer qualquer comentário sobre a situação na fronteira ou sobre a chegada de outros refugiados, incluindo os de Guantánamo. “Não podemos dizer nada, é proibido pela lei uruguaia, que exige sigilo”, responde pelo telefone uma pessoa da ONG.

Ninguém sabe ao certo como a comunidade palestina Chuy foi fundada, mas alguns evocam a chegada do primeiro imigrante em 1955. O boca a boca fez o resto. Jamil Klait, estudante universitário de 23 anos, é filho de um libanês e uma uruguaia e pertence à terceira geração de imigrantes em Chuy. Cumprimenta em árabe os conhecidos que encontra na rua, mas não é totalmente fluente no idioma. “A solidariedade é a marca de Chuy”, diz ele, ali há “muito intercâmbio cultural, uma verdadeira mistura”. O enriquecimento social é uma realidade graças aos acordos de fronteira entre o Brasil e o Uruguai, que estabeleceram uma espécie de salvo-conduto para se locomover e trabalhar livremente dentro de um raio de cerca de 20 quilômetros.

Mustafá Salim tem uma banca de óculos de sol e mora há 30 anos no Chuy. Nascido em Haifa (Israel), tem duas filhas advogadas no Uruguai e acredita que nunca mais voltará ao seu lugar de origem, mas admite sentir saudades de casa. Aplaude a decisão do presidente uruguaio, José Mujica, de trazer os presos de Guantánamo, mas se pergunta: “Por que não voltam a seu próprio país?”.

O Governo uruguaio deixou claro que, uma vez em seu território, os presos de Guantánamo terão status de refugiados – ou seja, poderão mover-se livremente –. O presidente José Mujica, que foi preso político por 15 anos durante a ditadura uruguaia, afirmou que o principal motivo para colaborar com a administração Obama é humanitário. Ainda há 149 prisioneiros em Guantánamo, 78 dos quais são considerados não perigosos e aguardam transferência para outros países.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_