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O chavismo descabeça a ala oposicionista que lidera os protestos

O oficialismo solicita ao Parlamento que casse o foro privilegiado da deputada opositora María Corina Machado

A deputada opositora María Corina Machado.
A deputada opositora María Corina Machado.C. G. Rawlins (REUTERS)

Com o líder opositor Leopoldo López detido há um mês na prisão militar de Ramo Verde, nos subúrbios de Caracas, a liderança moral do movimento oposicionista que promove protestos para exigir a substituição do Governo do presidente Nicolás Maduro concentrou-se na deputada independente María Corina Machado e no prefeito metropolitano de Caracas, Antonio Ledezma.

Mas na terça-feira o chavismo impôs um golpe baixo à cúpula da ala mais radical da oposição, ao solicitar ao Ministério Público que inicie um julgamento preliminar de mérito – pré-requisito para a suspensão da imunidade parlamentar dos deputados – contra Machado, sob a acusação de promover a desordem nas principais cidades da Venezuela, em incidentes que causaram cerca de 30 mortes em pouco mais de um mês de conflito. Ledezma, o mais experiente dos três políticos, fica assim em posição solitária num momento em que o movimento de protesto começa a esmorecer em Caracas, por causa da forte repressão da Segurança do Estado.

O presidente da Assembleia Nacional e número dois do chavismo, Diosdado Cabello, prometeu que as leis venezuelanas alcançarão a parlamentar, ex-pré-candidata a presidente e deputada mais votada na eleição de setembro de 2010. “Ela acredita que, por ser dos Senhores do Vale [expressão popular venezuelana que alude à aristocracia tradicional], nunca irão se meter com ela”, acrescentou, numa frase que vaticina que a sorte de Machado já está lançada. Os poderes públicos venezuelanos respondem com convicção aos ditames do palácio presidencial de Miraflores.

Em 2013, a maioria chavista revogou a imunidade parlamentar dos deputados Richard Mardo e María Mercedes Aranguren, apontados como responsáveis por supostos atos de corrupção. Com a punição a Aranguren, a bancada governista obteve em novembro o voto que faltava para aprovar poderes especiais ao presidente Maduro, permitindo-o governar por decreto. A iminente saída de Machado da Assembleia dará ainda mais poderes ao Governo. O suplente Ricardo Sánchez, embora continue sendo um deputado da oposição, não está no radar da Mesa da Unidade Democrática, a coalizão que reúne os mais importantes partidos de oposição presentes no Parlamento. Sánchez é contra o plano promovido por Machado, Ledezma e López, e tem uma relação fluente com o chavismo. Basta uma prova: Cabello revelou que, na “Comissão da Verdade” criada na Assembleia para investigar os protestos ocorridos desde 12 de fevereiro na Venezuela, foi reservada uma quota de quatro vagas para deputados oposicionistas que desejarem participar. Antecipou que Sánchez será um deles.

Ao saber da notícia, Machado concedeu uma entrevista coletiva acompanhada de seus colegas do “Agitação Parlamentar”, um bloco de 25 deputados que, sem romper com a Mesa da Unidade, ganhou visibilidade nos últimos meses graças a sua oposição muito mais frontal ao Governo. A deputada reconheceu que a decisão visa a desmoralizar os venezuelanos que apoiaram os protestos nas ruas. “Não os deixaremos sós. Eu estarei nesta luta até vencer. Este movimento é integrado por milhões de venezuelanos, e agora somos invencíveis”, adicionou.

A medida é parte de uma ofensiva para restaurar a ordem pública nas principais cidades. Isso já ocorreu em Caracas, mas a paralisação parcial das atividades se mantém em San Cristóbal e Mérida, cidades encravadas na cordilheira andina, que são os principais focos de protesto. Paralelamente, o chavismo busca aumentar o custo político da oposição por sua ausência nas negociações de paz convocadas pelo Governo há algumas semanas.

O ex-candidato presidencial Henrique Capriles se aproximou do Governo para dialogar, com a condição de que seja em um debate televisionado. A fratura da oposição sobre a conveniência de aceitar ou não a oferta do Governo é cada vez mais evidente. Há muitas dúvidas sobre o alcance e a eficácia dos compromissos que poderiam ser assumidos. Maduro e sua equipe não parecem dispostos a ceder nas reivindicações para que o país regresse à normalidade.

A libertação de Leopoldo López e de Iván Simonovis, o preso mais emblemático da era chavista, e o fim da presença de cubanos dentro do Exército são desejos que dificilmente seriam concedidos. Nesses troféus reside possivelmente o laço mais forte que une o legado do falecido comandante Hugo Chávez aos seus herdeiros.

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